Já desde as civilizações da Babilónia, há cerca de 4 milhares de anos, que o período do Ano Novo é visto como uma época de reflexão e renovação, onde o ser humano podia identificar pontos altos e baixos do seu ano e estabelecer novos objetivos para o próximo.
Este é um fenómeno não apenas social, uma vez que há um encorajamento da sociedade ao estabelecimento de novos objetivos, mas também individual, que nasce de um desejo de crescimento pessoal, seja relativamente à nossa vida amorosa, profissional ou à nossa saúde.
Mesmo que o ano anterior tenha sido considerado negativo, a chegada do novo ano traz consigo uma vaga de positivismo e crença na mudança, quase como um “reset psicológico”, que nos faz acreditar que é possível mudar e melhorar.
Um conceito estudado na ciência psicológica é, precisamente, o “The Fresh Start Effect”, ou “O Efeito do Novo Começo”. Este sugere que, quando sentimos que um novo período temporal está a iniciar (como é o caso do Ano Novo), as pessoas são mais propensas a ter comportamentos que vão ao encontro dos seus objetivos e a ter mais motivação para os atingir.
Ainda assim, também já deve ter reparado que toda esta motivação parece dissipar-se com o tempo e mais um ano começa com objetivos por cumprir do ano passado.
Para melhor compreender o porquê de isto acontecer, seguem-se erros comuns no que diz respeito ao estabelecimento de resoluções de Ano Novo:
- Objetivos demasiado simples ou pouco desafiantes, ou, por outro lado, demasiado ambiciosos, como, por exemplo “Este ano vou ler uma página de um livro por dia” ou “Este ano vou correr 10km todos os dias”;
- Vários objetivos de uma vez (“Quero ter uma alimentação mais saudável, praticar mais exercício físico, começar um novo trabalho, fazer novos amigos, iniciar um novo hobbie”);
- Objetivos extremistas, tais como “Vou eliminar todas as redes sociais”;
- Não ter um plano de ação (“Vou fazer mas não sei como”);
- Não antecipar dificuldades.
O modelo SMART (Específico, Mensurável, Atingível, Relevante e Temporal - do inglês Specific, Measurable, Attainable, Relevant e Timely) é um bom guia para definir os seus objetivos. O modelo indica que estes devem ser:
- Específicos, ou seja, identificar algo concreto que quer mudar;
- Mensuráveis, no sentido de ter uma forma de monitorizar e registar o seu progresso;
- Alcançáveis, isto é, realistas;
- Relevantes, ou seja, que façam sentido para si e para a sua vida;
- Com limites temporais, como por exemplo, “até ao final do mês de janeiro quero conseguir fazer isto, em junho já quero conseguir fazer aquilo”.
Como a Teoria da Autodeterminação explica, os objetivos intrínsecos, isto é, que vêm de uma motivação interna (“Eu quero praticar atividade física e ter uma alimentação saudável porque identifico vantagens para a minha saúde física e psicológica”) são mais facilmente alcançáveis e duradouros do que os objetivos extrínsecos, que partem de uma perceção do que acreditamos que os outros acham ser melhor para nós (“A minha namorada acha que devo perder peso, por isso é melhor começar a exercitar-me e a comer melhor”).
Por fim, para conseguirmos atingir estes novos objetivos, temos de acreditar que o conseguimos fazer! Para tal, o estabelecimento de pequenos passos de cada vez, e a celebração de cada um deles, aumenta a motivação para atingir o objetivo final. A monitorização do progresso através de aplicações tecnológicas e o recurso a lembretes também podem facilitar a sua execução. Rodearmo-nos de pessoas que têm os mesmos objetivos que nós e que podem servir de modelo também pode auxiliar na manutenção do foco. Não menos importante é o cultivo de estados emocionais positivos, por exemplo, através da prática do mindfulness, da gratidão, da autocompaixão ou do estabelecimento de relações significativas. Estes estados promovem os comportamentos orientados para objetivos.
Dito isto, não se sinta pressionado a mudar de vida com o mudar do ano. Qualquer momento pode ser um bom momento para estabelecer novos objetivos, desde que façam sentido para si. De relembrar que o progresso não é linear: é importante adaptar-se aos desafios do dia a dia e refletir e aprender com as recaídas. Relembre-se do porquê de ter começado e volte ao plano estabelecido! E se necessário, estamos aqui.
Um artigo dos psicólogos Margarida Santiago Santos e Mauro Paulino, da MIND | Instituto de Psicologia Clínica e Forense.
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