A atual pandemia do COVID-19 que estamos a experienciar tem gerado uma enorme quantidade de notícias, recomendações e comentários que, a toda a hora e das mais diversas formas, nos entra “casa dentro”. O impacto dessa informação, dependendo da forma como é transmitida (e recebida), pode originar um aumento de sintomas ansiosos e depressivos, entre outros. É bom e saudável estar informado/a e atento/a, no entanto, é também absolutamente necessário ganhar consciência da forma como quer que essa informação lhe chegue, podendo para isso fazer algumas escolhas.

Este impacto está muito relacionado com o facto de a maioria das notícias de mass media ter um carácter e uma carga emocional pesada, que deixa as pessoas com emoções como insegurança, medo, impotência, tristeza ou pânico. Estas falam muitas vezes de fatalidades e/ou desgraças e isso tem um efeito directo em todos aqueles que as estão a receber.

O que diz a ciência sobre o consumo de notícias e as emoções?

Estudos recentes dão-nos alguns indicadores sobre este tema, como é a investigação de Jeffrey Gottfried, investigador do Pew Research Center, realizada entre outubro e novembro de 2019 onde 68% das pessoas inquiridas relatou sentir desgaste ou exaustão face às notícias a que estavam expostas. Um outro estudo, de 2015, conduzido pela equipa de investigação liderada por Moran Bodas concluiu que um consumo acentuado de notícias produzidas por mass media pode levar a intensos sentimentos de ansiedade.

Estes são apenas dois exemplos de muitos que podem ser encontrados na investigação ao longo do tempo e que reforçam a evidência de um fenómeno chamado “enviesamento negativo” do funcionamento humano: por motivos evolutivos, enquanto espécie, estamos “programados” para lembrarmos e evidenciarmos mais acontecimentos desagradáveis e até negativos do que agradáveis e positivos. Isso acontece porque, ao longo do nosso desenvolvimento, funcionar dessa forma nos foi útil e adaptativo no evitamento do perigo em questões de sobrevivência. Este mecanismo pode, se não estiver atento/a e consciente dele, sobrepor-se a todos os outros comportamentos que possa adoptar para proteger a sua saúde mental.

A forma como muitas notícias são produzidas, comunicadas e atualizadas pode também interferir neste impacto. O lado mais sensacionalista, que procura causar no telespectador/a ou leitor/a reações de interesse sobre uma dada notícia catastrófica e com atualizações, por exemplo de hora a hora, tem uma maior probabilidade de causar os sentimentos desagradáveis referidos anteriormente.

A juntar-se a tudo isto, a forma como as redes sociais funcionam, a quantidade de informação partilhada de fontes questionáveis e o nível de interacção online maior devido à quarentena que estamos a cumprir, aumenta muito a exposição a diversos conteúdos com potencial ansiogénico a nível psicológico e emocional.

O que podemos, então, fazer?

É importante sentir que existem escolhas que todos podemos fazer quanto a este tema, escolhas que dependem de si e do cuidado que quer ter com o seu estado emocional, numa altura em que o medo domina muita da comunicação que acontece, tanto nas notícias como nas relações. Eis algumas delas:

1. Esteja consciente das emoções ao ver as notícias

Perceber o impacto do que está a ver na forma como se sente é fundamental para perceber quando pode precisar de parar o visionamento de determinada notícia para poder acalmar-se se for necessário. Repare nos pensamentos, emoções e comportamentos que tem quando está em contacto com algumas notícias para que, caso seja necessário, possa colocar em prática algumas das sugestões apresentadas de seguida.

2. Utilize técnicas de regulação emocional ou relaxamento

Caso se sinta ansioso/a durante o visionamento de notícias, exercícios como a respiração diafragmática ou a meditação podem ajudar a acalmar a mente e a transformar as emoções.

3. Desligue as notificações automáticas

Se não quiser estar a ser informado/a de novos artigos a todo o momento e de forma imprevisível, é fundamental que adopte esta estratégia. Pode escolher as fontes oficiais que quer consultar, no caso, o site “Estamos ON” é uma das boas hipóteses, aconselhada pelas autoridades de saúde portuguesas, também como forma de combater fontes não confirmadas de informação que podem causar reacções de pânico.

4. Escolha o momento e a forma como é informado/a

Desta forma dá, a si mesmo/a, a oportunidade de escolher onde quer ir buscar a informação, em que quantidade a quer receber (pode fazer uma pausa no telejornal, por exemplo, se estiver a precisar) ou em que momento(s) do dia será mais fácil estar em contacto com isso (momentos com muito stress nas dinâmicas familiares de casa, por exemplo, podem ser uma má altura uma vez que já está a gerir as suas emoções no contacto com essa situação).

5. Quando se desligar da notícia, “desligue” a mente da notícia

Muitas vezes, a sua mente pode ficar a pensar na informação que acabou de ler ou ouvir. Escolha outras actividades para fazer que lhe dêem prazer para que se consiga distanciar emocionalmente do conteúdo (ouvir uma música de que goste especialmente ou fazer uma brincadeira com os seus filhos são alguns exemplos). É natural que a empatia o/a faça sentir emoções de compreensão face ao sofrimento dos outros, mas é fundamental que isso não lhe seja prejudicial.

6. Evite conversas desagradáveis sobre temas que o/a incomodam

É perfeitamente legítimo dizer a alguém que esteja em interacção consigo (pessoal ou virtualmente) que não quer continuar a falar sobre determinado tema se isso o/a está a incomodar. Se houver insistência, pode mesmo ser necessário retirar-se do espaço de comunicação para que se possa recompor do ponto de vista emocional e mais tarde, se for importante, retomar o assunto.

7. Promova vários momentos de lazer, bem-estar e saúde mental ao longo do dia

Se antigamente já era importante cuidar de si (para poder também estar bem o suficiente para cuidar de quem precisa de si), agora torna-se fundamental. Actividades como o exercício, a meditação, a leitura (não relacionada com o tema que o/a incomoda), ouvir música de que gosta e lhe dá prazer, pintar/desenhar, jogar jogos (online ou de tabuleiro, por exemplo) são alguns exemplos do que pode fazer para aumentar a sensação de bem-estar e auto-cuidado. Uma mente bem-disposta é um ótimo escudo contra as más notícias.

Ana Sousa - Psicóloga Clínica

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