No século XXI, a informação acerca da morte de uma figura pública chega a cada uma das nossas casas, por todo o mundo, em minutos ou até segundos. Desde as redes sociais aos meios televisivos, a proliferação de informação é célere e imensa.
Diego Maradona, célebre futebolista argentino, perdeu a vida na passada quarta-feira e, imediatamente, toda a comunidade se demonstrou em luto.
Este “luto coletivo” (collective grief), também designado por “luto público” (public grief), diz respeito ao processo de luto que é originado pela morte de uma figura pública, como é exemplo a Princesa Diana, ou pela morte de um número elevado de pessoas, como é representativo o 11 de Setembro.
No caso particular de uma figura pública, apesar de a esmagadora maioria das pessoas não conhecer pessoalmente Maradona, a população sentia uma admiração e conexão emocional com o atleta. E o que é um processo de luto se não a perda de uma conexão com o outro?
A ciência psicológica aponta que a vivência de uma experiência negativa comum por um conjunto de pessoas diferentes aproxima-as e, neste sentido, o suporte social que é providenciado ao outro durante um momento de tamanha fragilidade pode ser visto como o principal ritual deste processo de luto.
É sabido que os rituais do luto facilitam a sensação de conexão e proximidade emocional com a pessoa perdida, mas também com as pessoas que se encontram à nossa volta, também em luto.
Na atualidade, aquando de uma perda desta natureza, as redes sociais são a principal ferramenta facilitadora da prática dos rituais do luto, como por exemplo publicar fotografias ou textos a homenagear a pessoa perdida. Por sua vez, estes rituais facilitam a expressão das emoções, o providenciar e receber de apoio emocional, a redução dos sentimentos de tristeza e solidão e, paralelamente, contribuir para a sensação de pertença a uma comunidade. Em poucas palavras, a partilha social facilita a expressão e regulação das emoções, bem como o encontrar de estratégias e apoio para gerir experiências emocionais negativas.
Não obstante, também são praticados rituais no mundo offline, como são exemplo as vigílias à luz das velas, os ramos de flores, e as doações a instituições de caridade relacionadas com a figura. Nestes momentos, meros estranhos abraçam-se e partilham lágrimas e palavras de conforto. As imagens televisivas de manifestações públicas de despedida ao atleta são exemplificativas disso mesmo.
A pseudo-amizade
Apesar de todo o sentido de comunidade e partilha social inerente a estes rituais do luto, algumas pessoas continuam a ser invadidas pela questão: Mas porque são estas perdas tão difíceis quando o outro, objetivamente, é um mero estranho para nós?
Ora, nesta era digital em que vivemos, o contacto constante com os media tem vindo a facilitar que algumas pessoas sintam que conhecem melhor uma determinada figura do que alguns membros da sua família – o que tem sido chamado de relação parassocial.
Uma relação parassocial entende-se como uma pseudo-amizade com uma personagem de uma série, filme ou novela ou com uma figura pública, a qual se define por uma sensação de proximidade e familiaridade que se assemelha ao tipo de intimidade sentida nas relações sociais ditas tradicionais.
Quanto mais intensa a sensação de proximidade com o ídolo, quanto mais emoções o ídolo despertou na pessoa ao longo da vida, mais angustiante a experiência de perda e, na maioria das vezes, esta relação é intensificada com a morte, dado que a imagem desse ídolo passa a ser controlada pela própria pessoa e, desta forma, pode ser moldada em função do que a pessoa gostaria que o outro fosse.
A principal mensagem que nos providencia esta experiência de luto coletivo é o poder da comunidade em providenciar suporte social, a capacidade de nos unirmos num momento de sofrimento e tamanha fragilidade, sentir empatia pelo outro e ajudar a atenuar todo o mal-estar vivido. Mais uma vez, as redes sociais não só são facilitadoras deste processo, como apresentam um papel relevante nas práticas de homenagear e imortalizar as pessoas perdidas.
As explicações são de Sofia Gabriel e Mauro Paulino da MIND | Instituto de Psicologia Clínica e Forense.
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