
Fevereiro é o mês do amor. Mas não vai ser celebrado por todas as pessoas, em todas as casas ou por todas as famílias. Existem espaços vazios. Lares que se tornaram casas.
Se a perda de uma relação pode ser uma experiência traumática, sobretudo quando não é resultado de uma decisão unânime, a morte de um companheiro com o qual planeámos viver um amor para a vida toda pode ser uma das experiências mais violentas experienciadas pelo ser humano.
Aquando de uma perda por morte, a separação não é decisão de nenhum dos membros do casal, mas imposta pela própria vida, o que tende a desencadear níveis elevados de tristeza, raiva, frustração, injustiça e impotência.
Mas porque é que tinha de ser o meu Pedro?
Tantos casais com vidas terríveis, sem amor, casamentos de fachada.
Ele era o amor da minha vida. Nós éramos realmente felizes.
Nada faz sentido sem ele!
Frequentemente, neste processo de luto, a pessoa tende a sentir-se sozinha, abandonada ao contrário de um sentimento de “ser” e “fazer parte” de uma unidade que já não existe, a identidade “enquanto casal”. Quando o “sistema casal” se desfaz, a falta do outro desencadeia sensações de insegurança, incapacidade e desproteção, alimentando uma sensação de vazio e, não raras vezes, de desesperança em relação ao futuro.
Sim, existe uma parte de nós, da nossa identidade, que só existia na relação com o outro e, por isso, esta perda exige a (re)construção da identidade da pessoa em luto (“Quem era eu antes do meu casamento?”, “Quem é que eu quero ser agora, depois de tudo o que aprendi com o meu processo de luto?”).
Naturalmente que cada perda é única, mas existem fatores que parecem ser preditores do sofrimento neste processo de luto, assim como dos distintos desafios inerentes ao mesmo. A título de exemplo:
- as características da relação perdida (sendo que quanto maior a intimidade e proximidade emocional, maior o sofrimento);
- o papel da pessoa perdida (por exemplo, se era a principal fonte de suporte financeiro da casa, deixando um vazio emocional e fragilidade económicos, limitando o recurso a ajuda psicológica);
- a história da pessoa em luto (quantas perdas já carrega na sua mochila/bagagem emocional?);
- a fase do ciclo da vida em que esta morte acontece (numa fase precoce da relação versus a perda de um relacionamento que já dura “uma vida”).
Quando esta perda acontece numa fase precoce da vida, a perda primária (morte do companheiro) é acompanhada por inúmeras perdas secundárias, como:
- a perda do suporte emocional, funcional e/ou financeiro (particularmente em casais com filhos pequenos, em que as fragilidades financeiras revelam ser um fator de risco para o bem-estar e saúde mental familiar).
- a perda do parceiro sexual e do companheiro de rotinas do dia-a-dia.
- a perda da família sonhada e idealizada, com todos os sonhos e expectativas para o futuro construídos a dois (“o luto pelo futuro não vivido”).
- a perda da identidade familiar e da oportunidade de uma parentalidade conjunta (em alguns casais, a morte de um dos membros pode impedir o plano da parentalidade ou, para os casais com filhos, a morte rouba o plano da parentalidade conjunta e idealizada).
Nesta fase, pela idade jovem da pessoa em luto, tende a predominar uma pressão social para “seguir em frente”, predominando frases feitas como “ainda és jovem, podes casar novamente”, “a tua vida não acaba aqui, há mais homens”, o que pode potenciar o isolamento social e a perceção de baixo suporte emocional das pessoas mais próximas. Este isolamento social tende a ser um fator de risco para sintomas de depressão e, naturalmente, para agudizar os sintomas do luto mencionados anteriormente.
Os primeiros meses foram os mais difíceis, eu sentia tanta revolta.
Nada fazia sentido, pois todos os meus planos envolviam o Pedro.
A casa era nossa, o filho era nosso, os sonhos eram nossos.
Eu ainda tenho oportunidade de ver o meu filho crescer, mas queria fazê-lo ao lado do meu marido.
E quando a morte bate à porta de um casal que já partilhava toda uma vida em conjunto? O próximo texto será dedicado às especificidades deste processo de luto.
Com recurso a ajuda psicológica especializada no luto, encontra um espaço seguro e totalmente ausente de julgamento ou crítica, para libertar as suas emoções e identificar ferramentas para gerir as mesmas, desconstruir pensamentos negativos de culpa, explorar rituais do luto que permitam manter a pessoa perdida simbolicamente presente na sua vida, ajudar no processo de autoconhecimento e (re)construção da identidade, assim como na aceitação e integração da perda na sua biografia.
Peça ajuda! Não se encontra sozinho(a)!
As explicações são de Sofia Gabriel e de Mauro Paulino da Mind | Instituto de Psicologia Clínica e Forense.
Comentários