Todos nós temos um lado sombra, o tal “lado lunar” da canção do Rui Veloso. Aquela parte de nós mais feia que não queremos que os outros vejam. Da qual temos medo, vergonha. As nossas inseguranças, os nossos pensamentos mais negativos, até sombrios, as emoções mais difíceis, desadequadas.

Regra geral, não queremos olhar para elas, não queremos olhar para este lado sombrio e reconhecê-lo. Preferimos deixá-lo oculto, reprimido, fechado lá na caverna da nossa mente.

Mas o mais incrível é que conseguimos vê-lo nos outros. Ou seja, tudo o que reprimimos ganha força e tem de se expressar de alguma forma. Aquilo que negamos em nós conseguimos ver nos outros, fazemos aquilo a que em psicologia se chama de projeção. Trata-se de um mecanismo de defesa do ego, em que aquilo que não queremos reconhecer em nós atribuímos aos outros. É um mecanismo inconsciente que surge quando entramos em conflito interior com algum pensamento ou emoção que consideramos inadequados ou que nós supostamente não deveríamos ter (por medo de não sermos aceites) e que acaba por reduzir a ansiedade que esses mesmos pensamentos ou emoções nos façam sentir.

As nossas inseguranças são aspetos em nós que revelam a nossa falta de confiança em nós mesmos. Ao projetarmos as nossas inseguranças nos outros, acabamos por projetar a falta de confiança também. Ora, se não confiamos em nós próprios, temos receios, medos e dúvidas, iremos com certeza ter dificuldades em confiar nos outros.

"Mas eu quero ser mais segura, quero conseguir confiar nos outros."

O segredo passa por trabalhar essas mesmas inseguranças, aceitando-nos como somos, assumindo as nossas falhas e erros, responsabilizando-nos, reconhecendo que por vezes ter determinados pensamentos ou emoções negativas fazem parte da condição de Ser Humano.

O segredo passa por praticar a consciência/atenção plenas estando presentes no “aqui e agora”, racionalizando e refletindo sobre pensamentos e sentimentos, trazendo-os da sombra para a luz, para que sejam processados e integrados de forma salutar.

O segredo passa por este autoconhecimento, que nos permite olhar para dentro de forma honesta, reconhecer o espaço para melhoria e sobretudo amarmo-nos e aceitarmo-nos exatamente como somos. Porque só quando tivermos uma relação honesta e confiante connosco próprios, poderemos então estabelecê-la com os outros.

Ao sermos honestos connosco próprios aprendemos a confiar em nós e nos outros, ficando para trás a necessidade de projeção ou de qualquer outro tipo de mecanismo de defesa.

Um artigo de Ana Evaristo, psicóloga na Clínica da Mente.