Preocupa-o a opinião dos outros, que possam não gostar de algo ou o achem ridículo? Quer ter sempre razão? Considera-se exigente para consigo? Convive com um familiar, companheiro ou chefe com um grande ego e isso fá-lo sofrer? De acordo com a coach espanhola María de Mondo, por detrás destas questões está o ego, o seu falso eu, o eterno juiz, quem achas que é, mas na realidade não é. Para María de Mondo, no ego “escondem-se as inseguranças, medos, pensamentos negativos, a forma como nos relacionamos com os que nos rodeiam”. Em suma, “o nosso ego é o principal obstáculo à felicidade”. Isso mesmo nos traz a autora no seu livro. Em Eu, Ego (edição Harper Collins), a coach, conduz o leitor a aprender a ligar-se ao seu verdadeiro ser. O objetivo? Assumir o controlo sobre a nossa vida e bem-estar.

“Tenho a suspeita de que o ego vai ser o meu parceiro de vida. Continuo a trabalhar nele e acho que sempre o farei. Há alturas em que assume o controlo da situação, mas também me ensina e aprendo muito com ele. Até hoje, posso dizer que o reconheço em noventa por cento das vezes em que surge, como quando discuto com o meu companheiro, ou julgo se o que as outras pessoas fazem está certo ou errado, se é melhor ou pior”, diz-nos María de Mondo na apresentação ao seu livro, pretexto para conversarmos com a autora.

Porque sentiu a María aos 24 anos que estava a viver uma vida medíocre e onde encontrou motivação para iniciar um novo caminho?

Porque ao atingir os objetivos que o contexto que me rodeava e a sociedade me venderam como fatores para ter uma vida plena, não me sentia feliz. Tinha dois cursos universitários, estava efetiva no trabalho e com um emprego estável, um companheiro e muitos amigos.Mas, sentia-me vazia e perdida. Por que não estava eu feliz? Comecei, então, a olhar para dentro de mim, a conhecer-me verdadeiramente sem a influência do exterior e a criar a minha própria vida, não aquela que se esperava de mim. Encontrei motivação na minha vontade de viver, de me compreender, de estar em paz e de ser feliz. Se houvesse outras pessoas por aí que tivessem feito isso, porque não poderia eu também fazê-lo?

O mundo acelerado em que vivemos está a afastar-nos do nosso verdadeiro ser?

Completamente. Quanto tempo passamos com nós mesmos? Olhamos, realmente, para dentro de nós? Para refletir sobre como nos sentimos, o que precisamos ou o que nos faz felizes? O ego leva-nos a viver fora de nós e para fora. Isso faz-nos esquecer de nós mesmos.

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Como podemos entender o que é o nosso verdadeiro ser se nunca nos permitimos encontrá-lo?

Quando estamos ligados ao nosso verdadeiro eu, estamos em paz. Estamos alinhados com o que pensamos, sentimos e fazemos. Somos fiéis a nós mesmos, apesar do que os outros possam dizer. Amor, aceitação, compaixão e perdão fazem parte da nossa vida quotidiana. Para isso, temos primeiro de nos conhecer, pois estamos completamente condicionados pelas influências externas que temos recebido do nosso meio, por exemplo dos pais, família, sociedade, cultura, religião, e não paramos para pensar se as crenças e valores que temos são verdadeiramente nossos.

Há uma relação direta entre esse encontro com o nosso ser e aquilo que podemos definir como felicidade?

Sim. Ser é a sua verdadeira natureza. Ser é amor, aceitação incondicional, conexão universal, sabedoria e momento presente. Tudo o que nos causa sofrimento nasce do ego.

Falemos do ego. Como podemos defini-lo?

O ego é a falsa identidade que vimos a criar desde o nosso nascimento com todas as condições externas que recebemos desse ambiente. Absorvemos informações desde pequenos sobre como é o mundo e como somos. Informações que não vieram de nós e que não questionámos, pois, quando somos crianças, não temos capacidade nem confiança para fazê-lo. Portanto, o nosso ego formou-se a partir de crenças, julgamentos e experiências que nos foram transmitidas e que direcionam a nossa vida. Formado de fora, vive do exterior e para o exterior. É responsável pelos medos, pela necessidade da aprovação alheia, pela identificação com coisas que nos são externas, por acreditar que o nosso valor depende do que fazemos ou temos, por levar as coisas para o lado pessoal, por viver no passado e no futuro...

A palavra ego leva-nos a uma outra palavra, egocentrismo. Vivemos numa sociedade egocêntrica?

Sim. É uma questão sobre a qual falo muito. O ego faz-nos ser tremendamente egocêntricos. É por isso que levamos as coisas para o lado pessoal. Acreditamos que o mundo e as pessoas giram em torno de nós e ofendemo-nos com muita facilidade. Esquecemos o necessário olhar para o outro porque só vemos o nosso umbigo. Esquecemos que o que os outros fazem ou dizem tem a ver com eles, não com a nossa pessoa. Nada é pessoal, mas o nosso ego egocêntrico faz-nos acreditar que sim, e isso gera muito sofrimento.

Sobre a autora

Licenciou-se em Direito e Administração de Empresas e iniciou a sua carreira no mundo das finanças. Não gostou e entrou numa crise existencial que a fez repensar toda a sua vida. María de Mondo decidiu reinventar-se, formando-se em coaching ontológico, psicologia e mindfulness. Atualmente faz coaching, dá palestras, formações e divulga conteúdos sobre saúde mental e bem-estar. O resto do tempo é investido nas suas duas filhas.

A María quer dar-nos alguns exemplos de momentos em que o ego se manifesta e como tal manifestação pode ser prejudicial?

Sim, por exemplo, quando procura aprovação, apreciação ou reconhecimento de outras pessoas; quando leva as coisas para o lado pessoal; quando acredita que a sua maneira de ver as coisas é a melhor ou a realidade; quando pensa ou age por medo. Também se deixa dominar pelo ego quando acredita que o seu valor depende daquilo que faz ou do que tem ou quando se culpa por ser muito exigente consigo mesmo e perfeccionista.

Pelo que descreve o ego domina inúmeros aspetos da nossa vida…

…há mais. Por exemplo, quando vive de acordo com as expectativas sociais; também quando assume o papel de vítima ou quando julga os outros ou a si mesmo. Há uma manifestação do ego quando tem pensamentos negativos ou confusos, sem controlo, ou quando se desliga do seu verdadeiro eu e perde a liberdade.

Escreve no seu livro que por detrás de um grande ego há uma grande insegurança. Porquê?

Tendemos a acreditar que o ego tem a ver com acreditar que somos melhores do que os outros e é típico de pessoas autoconfiantes. Porém, quando uma pessoa está segura e confiante, ela não precisa provar nada a ninguém. Quando nos concentramos no exterior, em dar uma imagem, em querer demonstrar aos outros, procuramos ser validados pelos outros, e isso revela a nossa própria insegurança.

Podemos tornar o ego no nosso melhor amigo?

Sim. O ego não é o inimigo. Ele tenta proteger-nos, mas fá-lo muito mal. Poderíamos dizer que temos de educá-lo. Temos de transformar crenças e julgamentos destrutivos num ego mais gentil e amoroso.

Como conseguimos perceber se é o ego a falar ou o nosso verdadeiro eu?

Simplificando, o ego fala por medo e o eu fala por amor.

A María fala do ego espiritual. Estamos a falar de uma dimensão diferente do ego?

O ego espiritual é o ego disfarçado de ser. Ou seja, quando aprendemos a identificar o ego, ele transforma-se para não desaparecer. Ele engana-nos, faz-nos acreditar que estamos alinhados com o nosso ser, mas continua a dar-nos ordens. Acontece muito quando começamos a trabalhar no nosso desenvolvimento pessoal. Por exemplo, o ego espiritual aparece quando começamos a dar lições de vida aos outros, sobre como eles deveriam viver e o que deveriam fazer, quando somos muito exigentes com o nosso próprio processo e não nos permitimos cometer erros, quando nos culpamos por não termos seguido os nossos objetivos.

A María desenvolveu um Diário Emocional que disponibiliza no seu site. Quer explicar-nos do que se trata?

Para mim, uma das ferramentas terapêuticas mais poderosas é a escrita. Escrever à mão ajuda-nos a ligar-nos com o nosso ser, a esvaziar a nossa mente de pensamentos confusos, a ver as coisas de outra perspetiva, a questionar o nosso ego, a procurar soluções, a reconhecer e validar os nossos sentimentos. Neste diário convido as pessoas que fazem essa ligação a estabelecer um mantra diário que as guie e a se ligarem com a gratidão transformarem as suas vidas.