Quão perturbadoras podem ser as obsessões e as compulsões? Quem as experiencia sente-as como muito intrusivas, insustentáveis, incapacitantes ou excessivamente inquietantes. Referimo-nos à perturbação obsessivo-compulsiva (POC), uma patologia do foro psiquiátrico potencialmente incapacitante que, na idade adulta, é tão comum nos homens quanto nas mulheres e mais predominante do que se pensava ainda há poucos anos atrás. Estima-se que atinja cerca de 2% da população portuguesa e está classificada em quarto lugar entre as doenças psiquiátricas mais prevalentes.
Apesar da sua expressividade é, no entanto, uma doença silenciosa, na medida em que as pessoas que a têm interpretam os sintomas, grande parte das vezes, como autênticos absurdos, o que gera sentimentos de muita vergonha de a comunicar e de procurar ajuda.
De facto, quem sofre da perturbação obsessivo-compulsiva reconhece nalgum período da doença que as obsessões ou compulsões são excessivas ou irracionais, o que significa, por outras palavras, que têm consciência dos sintomas que os tomam. Esta capacidade de crítica e reconhecimento apresenta-se como um paradoxo e é uma causa de grande ansiedade: por um lado, está presente a compreensão dos sintomas como sendo algo externo, irracional ou despropositado, e, por outro, um enorme sentimento de impotência para lidar com esses mesmos sintomas.
Quais os sinais e sintomas?
Esta doença manifesta-se por meio de pensamentos, impulsos ou imagens recorrentes e persistentes, que são vividos como intrusivos e inapropriados, provocando ansiedade ou mal-estar intensos. Os estados de elevada ansiedade são, de entre os vários sintomas, aqueles que geralmente impelem a pessoa a procurar a ajuda especializada do psicólogo.
De modo geral, quando se fala em perturbação obsessivo-compulsiva, há uma associação imediata à imagem de alguém excessivamente arrumado, meticuloso e organizado, ou a uma imagem de quem, obsessivamente, lava as mãos (e tudo o que o rodeia) repetidamente, numa tentativa desesperada de limpeza pessoal ou do meio que a circunscreve.
Os filmes “O aviador” ou “Melhor é impossível” são exemplos dos esforços continuados das personagens principais em se afastarem das pessoas, de objetos ou de ambientes que possam estar contaminados pela sujidade, ou de comportamentos repetitivos e estereotipados de limpeza pessoal. Mas nem sempre é assim e, muitas vezes, os sintomas são completamente diferentes.
A perturbação obsessivo-compulsiva, nas suas várias formas de expressão, pode gerar estados de intermináveis e insustentáveis dúvidas, receios ou medos, o que já levou alguns autores clássicos a intitularem a doença como “a loucura da dúvida”.
O homem que está a escassos meses de ser pai e que desenvolve o medo atroz de ser pedófilo ou o homem que se debate com o imenso receio de ser homossexual são meros exemplos de casos em que estas pessoas facilmente são invadidas por pensamentos intrusivos, recorrentes e ruminantes sobre esses temas, levando a um questionamento constante. Alternam a atividade mental entre a assustadora auto confirmação do que é altamente receado e a certeza de que não são quem receiam ser e, nesta inconstância, geram e reforçam obsessões e compulsões, que determinam um longo e infindável círculo vicioso.
Em algumas pessoas com perturbação obsessivo-compulsiva, a perceção da realidade pode estar significativamente comprometida e facilmente as obsessões enraizadas em crenças disfuncionais atingem proporções que as leva a acreditar que os seus pensamentos ou desejos determinam o infeliz destino de outros (tome-se como exemplo, pensar que provocam a morte de alguém apenas porque desejam que assim aconteça), o que lhes provoca, igualmente, muito sofrimento.
Obsessões não patológicas
De realçar que muitas obsessões e comportamentos compulsivos não patológicos cumprem funcionalidades de adaptação e de sobrevivência para o próprio, para a sua família e para a comunidade onde se insere, na medida em que se relacionam com medidas de segurança, proteção, saúde ou organização (designadamente, os cuidados com a verificação da porta de casa que deve ficar fechada, com a boa utilização de aparelhos a gás, com boas práticas de estilos de vida saudáveis, ou com a aplicação de regras de civismo que visam não só a organização e a vivência diária saudável do próprio, como também da comunidade). Nestes casos, não há necessariamente sofrimento associado.
Face a uma doença psiquiátrica que interfere significativamente com o bem-estar e com o dia-a-dia do doente, com perda das suas funcionalidades pessoais, familiares, profissionais ou sociais, urge tomar consciência de que pedir ajuda especializada é um ato inteligente de amor próprio e sinónimo de maior qualidade de vida.
As explicações partilhadas são de Lina Raimundo, Psicóloga Clínica da Mind – Psicologia Clínica e Forense (www.mind.com.pt).
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