A quadra natalícia é tipicamente associada a um momento de reunião familiar, acompanhado por sentimentos de paz, harmonia e aconchego. Contudo, as cadeiras vazias em algumas famílias promovem que este seja também um momento de reflexão e, inevitavelmente, de tristeza – pela ausência da pessoa perdida e pelos assuntos pendentes com a mesma.

O que são “assuntos pendentes”? Este termo diz respeito aos pensamentos, sentimentos e desejos que nunca foram partilhados com a pessoa perdida e que, por isso, geram sentimentos de culpa e arrependimento – elementos altamente prejudicais para a aceitação da perda na história de vida da pessoa em luto.

Aquando da vivência de uma perda, os assuntos pendentes mais frequentes remetem para a expressão de afeto e para o perdão.

Mesmo que os assuntos pendentes envolvam sempre uma segunda pessoa, são vividos como conflitos internos e, por isso, não necessitamos do outro para alcançar alguma paz. Por outras palavras, os assuntos pendentes não são conflitos com o outro, mas sim em relação a nós próprios.

Desta forma, dependemos somente de nós mesmos para solucioná-los ou, no mínimo, para atenuar o sofrimento associado aos mesmos. Isto significa que mesmo quando perdemos uma pessoa, ainda é possível alcançar uma sensação de resolução relativa aos assuntos pendentes com a mesma.

Expressar Afeto

Não raras vezes, quando a pessoa ainda se encontra ao nosso lado, sentimos que temos tempo para expressar tudo o que sentimos. A dificuldade em encontrar as palavras certas, o constrangimento em relação à reação do outro e o medo da rejeição levam-nos a evitar ou adiar este momento. Apesar disso, uma perda inesperada e violenta como aquelas que aconteceram ao longo dos últimos anos de pandemia, pode roubar-nos esse tempo.

Quando perdemos alguém que amamos, sentimo-nos desesperados, perdidos e refletimos acerca de tudo o que ficou por dizer – o quanto gostávamos da pessoa, o impacto dela na nossa vida, o quanto desejaríamos não a ter perdido.

Contudo, como referido anteriormente, ainda é possível expressar afeto. Uma das ferramentas diz respeito à oportunidade de recorrer a rituais do luto, os quais permitem homenagear a pessoa perdida e, simultaneamente, transformar a relação que era anteriormente física numa relação meramente simbólica, interna e emocional. Inevitavelmente, ao homenagear a pessoa perdida estamos a expressar o nosso afeto.

Tomem-se como exemplos de rituais escrever uma carta em que expressamos tudo o que sentimos e/ou o que a pessoa perdida foi para nós; construir um livro de memórias com fotografias e poemas; colocar flores junto da fotografia, campa ou lugar especial da pessoa perdida, plantar uma árvore no jardim da casa partilhada durante anos, entre outros.

Perdoar

Perdoar é um ato de libertação das injustiças de que fomos vítimas e/ou do sofrimento causado pelo outro. Quando perdoamos, a pessoa que nos magoou perde o poder que tinha sob o nosso bem-estar.

Mas quando poderemos saber que já perdoamos alguém? Um dos sinais diz respeito à capacidade de recordar episódios em que o outro nos magoou, sem nos emocionarmos (por exemplo, chorar, gritar, insultar o outro).

Existem pessoas que ainda não partiram, mas que perdemos das nossas vidas por conflitos familiares, dificuldades na comunicação ou traições. Porém, nunca é tarde demais para o perdão, desde que este seja impulsionador do bem-estar da pessoa que perdoa, em detrimento de um fator facilitador da continuidade ou reparação de ciclos tóxicos, os quais devem ficar no passado.

A magia do Natal, associada ao simbolismo do Ano Novo, deve ser potenciadora da reflexão e, particularmente, da definição de novas metas e objetivos, os quais não devem incluir a manutenção de relações consideradas tóxicas e que impedem o nosso bem-estar.

É também imperativo, neste momento de reflexão, perdoar-se a si mesmo. Pelo que ficou por dizer à pessoa perdida, por escolhas erradas ao longo do último ano. Ao perdoar-se a si mesmo, liberta-se da carga emocional da culpa e sente-se mais motivado para reconstruir o seu caminho.

Ainda que o Natal seja quando o homem quiser, a quadra Natalícia pode ser importante para refletir sobre o perdão. Comece por se autoquestionar: que assuntos pendentes vou levar para 2022?

Frequentemente, para se alcançar um processo de pleno desenvolvimento e crescimento pessoal, é imperativo recorrer a ajuda especializada. Não está sozinho(a), peça ajuda e liberte-se da culpa e assuntos pendentes que limitam a sua felicidade.

As explicações são de Sofia Gabriel e de Mauro Paulino da MIND | Instituto de Psicologia Clínica e Forense.