Por processo de luto entende-se a experiência de adaptação à perda da pessoa amada e, por sua vez, ao mundo sem tudo aquilo que a pessoa perdida proporcionava (por exemplo, o carinho, o afeto, as dinâmicas relacionais, o suporte emocional).
Apesar da natureza normativa, inevitável e pertencente ao ciclo da vida desta experiência, quando acontece uma perda tão violenta e inesperada como é no homicídio, este processo pode ser traumático.
Neste âmbito, as investigações têm vindo a reconhecer três características singulares que definem e distinguem o processo de luto por homicídio e que explicam os fatores de risco para patologia associados a esta perda, nomeadamente:
1. A natureza inesperada, repentina e violenta da morte
Devido à natureza tendencialmente deliberada e premeditada do crime, quando comparada com outras mortes que envolvem violência (por exemplo, suicídio ou acidentes de viação), o homicídio é percecionado como particularmente violento e desumano. Com frequência, são desenvolvidos pensamentos traumáticos relativos ao momento da morte.
2. A existência de processos judiciais
A sua natureza morosa dos processos judiciais desencadeados por este crime facilita a vivência de sentimentos de impotência e falta de controlo. Na maioria das vezes, o final do processo legal significa o início do processo de luto. A demora e sofrimento do processo judicial faz com que as pessoas sintam que não possuem tempo e espaço para processar a perda, o que permite negar e evitar o contacto com a realidade da morte.
3. A dimensão pública do homicídio
A cobertura mediática selvagem prejudica a privacidade que as pessoas necessitam para estar em luto. A divulgação do acontecimento na comunicação social pode ser percebida e descrita como uma experiência desrespeitadora da família e da própria vítima, fomentando o sofrimento da perda.
A natureza traumática desta perda e consequente processo de luto é acentuada pela tendência a recorrer a comportamentos de risco para gerir o sofrimento e esquecer, ainda que por momentos, a perda (por exemplo, consumo de drogas, álcool e medicação).
Não raras vezes, a pessoa é envolvida em sentimentos de culpa, particularmente, quando a morte é interpretada como uma falha no cuidado (“E se eu tivesse estado lá naquele dia?”, “E se eu tivesse prevenido a morte?”), sendo que o suporte social tende a ser bastante reduzido e faz com que os familiares e amigos se sintam sozinhos.
Após a experiência do homicídio, as pessoas em luto ficam mais alertas a potenciais eventos negativos. A irritabilidade, agitação e alterações do humor que tendem a ser provocadas pelo trauma fazem com que sejam vivenciadas tensões também no seio familiar.
No entanto, a pessoa em luto não está sozinha. Apesar do tamanho sofrimento vivido, pedir ajuda é um ato de coragem necessário para reduzir o sofrimento e retomar (a possível) normalidade e bem-estar individual e familiar.
Peça ajuda especializada, não se encontra sozinho(a).
Um artigo dos psicólogos clínicos e forenses Sofia Gabriel e Mauro Paulino, da MIND | Psicologia Clínica e Forense.
Comentários