Do grego khalaó, a palavra calatonia significa relaxamento, afastar-se do estado de ira, abrir uma porta, deixar ir. Este método de trabalho visa a integração corpo-mente através da aplicação de técnicas que desenvolvem a perceção do próprio corpo, da sua linguagem, da sua forma específica de manifestar sintomas e imagens enquanto símbolos, tendo como objetivo a autorregulação e o diálogo entre a consciência e o inconsciente, tanto através do corpo como da psique. A calatonia é uma abordagem não invasiva e eficiente na promoção de comutações neurofisiológicas. Pode ser utilizada isoladamente, apenas como técnica de relaxamento. No entanto, associada à psicoterapia, este método ajuda a estabelecer e a fortalecer o vínculo terapeuta-utente, criando um campo favorável ao aparecimento de sensações e de imagens espontâneas que, segundo Pethö Sándor, criador do método, constitui a base de uma terapia efetiva.
Inicialmente desenvolvida como uma técnica, após muitas décadas de aplicação clínica em São Paulo, a calatonia transformou-se num método que trabalha corpo e mente, utilizando toques em diversas áreas do corpo de forma muito leve e subtil.
Através dos toques, alcançamos o registo psicológico encontrado no corpo físico. É assim que a calatonia e a psicologia se cruzam, sendo que a base desses conceitos englobam a psicologia de Carl Gustav Jung que, por interesse pessoal, estudou a cultura oriental e acrescentou vários conhecimentos holísticos à sua obra.
Jung, fundador da psicologia analítica, não trabalhou com a manipulação física, mas os seus conceitos foram fundamentais para que Sándor, o criador da calatonia, pudesse observar e perceber as particularidades psicológicas das pessoas que atendia.
Sándor criou os toques subtis como um trabalho corporal extremamente delicado, organizado em sequências de toques sobre a pele, em vários pontos do corpo. A calatonia é uma técnica de relaxamento profundo que baseia a sua atuação na sensibilidade táctil, através da aplicação de estímulos suaves, em áreas do corpo onde se verifica especial concentração de recetores nervosos. De acordo com o seu criador, quanto mais suave o estímulo mais profundo o seu efeito, por isso, os toques da calatonia são aplicados com a leveza das asas de uma borboleta.
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Quando um desvio de um determinado ponto normal é detetado são desencadeadas reações de compensação, que se mantêm até que a situação normal de equilíbrio seja restaurada. Por exemplo, a febre surge no combate às infeções; o suor aparece quando a pele precisa de ser arrefecida; respiramos mais depressa para melhorar a oxigenação do corpo quando corremos, etc.
O que acontece é que a autorregulação, para além de ocorrer a um nível corporal, através dos vários mecanismos de regulação dos processos fisiológicos que espontaneamente entram em ação quando ocorre algum desequilíbrio no sistema, também ocorre a nível psíquico, através de sonhos, imagens, fluxo de introversão e extroversão.
Muitas perturbações psicológicas têm origem na perda da capacidade espontânea de autorregulação do corpo e da psique. Ao encontrar uma situação externa ou interna que provoque um desequilíbrio emocional, como uma perda ou frustração, o indivíduo procura autorregulação artificial, por exemplo, através do consumo de drogas, pois o seu processo espontâneo foi bloqueado.
Através de técnicas de abordagem corporal, como a calatonia e os toques subtis, que induzem à autorregulação, o corpo reencontra o seu equilíbrio e a sua homeostase.
Por outro lado, podem também ser utilizadas, de forma preventiva, na educação de crianças e adolescentes, visando o desenvolvimento da autoconfiança, da concentração e do respeito pelo próprio corpo.
Algumas técnicas também podem ser aplicadas a pacientes internados em hospitais (politraumatismos, pré e pós-cirúrgicos, pacientes portadores de doenças crónicas); associadas à quimioterapia, diminuem os sintomas secundários decorrentes do tratamento do cancro. Na odontologia ajudam a diminuir a tensão temporomandibular, causadora do bruxismo. Pacientes psiquiátricos também beneficiam com esta técnica, na medida em que ajuda a desenvolver uma noção do próprio corpo e melhora o vínculo terapeuta-paciente.
Todos os procedimentos podem ser utilizados em sessões de psicoterapia, visando a integração corpo-mente, promovendo o relaxamento do corpo, facilitando o processo de recuperação de lembranças esquecidas ou reprimidas, e ajudando a desenvolver criatividade com o possível surgimento de imagens que brotam espontaneamente durante o relaxamento.
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Os toques podem ainda ser aplicados nas mãos, seguindo a mesma sequência: todos os dedos serão tocados, dois pontos nas palmas das mãos, toques nos antebraços e pulsos, terminado com um toque suave na sola dos pés. Os toques devem ser feitos em silêncio, de forma simples e suave, durante 2 a 3 minutos em cada um dos pontos.
Apesar de ser possível traçar alguns paralelos, a escolha destes pontos não se baseia em técnicas como a reflexologia ou a acupuntura. O trabalho foi desenvolvido de forma empírica: Sándor descobriu que a manipulação, de forma subtil e não habitual, das extremidades do corpo proporcionava alívio de dores e de tensões, aumentando o bem-estar dos pacientes.
Segundo ele, o bem-estar ocorre devido a uma redistribuição energética ocasionada pelos toques e que gera o alívio de tensões. A redistribuição energética é ainda o motivo para se executar sempre um toque na polaridade do corpo oposta à parte que recebeu a calatonia. Assim, se trabalhamos os pés, terminamos com um toque na cabeça. Se trabalhamos as mãos, terminamos com um toque nos pés.
Para além dos pontos físicos já enumerados, Sándor, o criador do método, sugeria que durante o trabalho corporal o terapeuta fixasse a sua atenção no Terceiro Ponto.
O Terceiro Ponto (um ponto “imaginário” que se localiza entre o terapeuta e o cliente) representa aquilo que se interpõe entre todos os indivíduos, as suas relações, e o seu modo de estar no mundo. É um ponto intermediário que equilibra a relação e impede a criação de uma postura de poder por parte do profissional: ensina que cada um de nós é apenas um meio ou um canal através do qual a energia (da vida, do inconsciente ou do mundo espiritual) pode fluir sem obstáculos para o bem de todos.
Texto: Leda Maria Perillo Seixas, psicóloga, especialista em terapia junguiana e cinesiologia
Edição: Patrícia Velez Filipe
Modelo: Ana Luísa Miranda
Fotografia: Helena Gairão Rios
Agradecimentos: ALBA
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