Primeiro, foi noticiada a percentagem (importante) de trabalhadores com sintomas de burnout. Mais recentemente, a notícia de outro estudo veio mostrar-nos que os nossos jovens também sofrem, muitas vezes em silêncio, com problemáticas de saúde mental. Podem tecer-se imensas (e pertinentes) considerações sobre esta questão. Uma delas é, sem dúvida, a do estigma associado à doença mental. Ele é uma das razões mais fortes para que um grande número de pessoas ainda sofra em silêncio, até com vergonha, de problemáticas clinicamente tão bem definidas e explicadas como a depressão, a ansiedade ou a psicose. A categoria de mito a que, muitas vezes, são remetidas as questões de saúde mental, não faz sentido numa sociedade informada e com conhecimentos clínicos que nos permitem compreender cada vez melhor os mecanismos envolvidos no adoecer da mente.

A questão do estigma é uma questão essencial quando falamos em promoção da saúde e acesso a cuidados de saúde adequados. A resistência em procurar ajuda para problemas do foro mental é claramente maior do que quando estamos a falar de doenças físicas. É mais fácil saber o que dizer a alguém que partiu a perna e tem de fazer fisioterapia, do que a alguém que está deprimido e faz psicoterapia. É mais fácil transmitir aos outros que o estômago dói, do que dizer que a ansiedade corrói a capacidade de ser funcional. É mais fácil sofrer em silêncio, do que ficar à mercê do estigma que poderá advir de qualquer referência a um problema mental.

As doenças mentais são tão doenças quanto as outras e têm consequências tão nefastas como elas. Esta ideia tem sido difundida – felizmente – em algumas iniciativas de louvar e o estigma está geralmente ligado a uma falta de informação ou, até mesmo, a má informação. Não é assim tão raro depararmo-nos com considerações como “Diz que está deprimida! Sabe-lhe é bem ficar em casa”, ou “Ansiedade? Devia ter vivido o que eu vivi e ia ver o que era ansiedade”. Podemos ainda acrescentar a tradicional “Vai ao psiquiatra porque é maluco” ou “É doido porque ouve vozes”.

Há, efetivamente, uma panóplia de manifestações abertas do estigma na nossa sociedade. No entanto, existem outras que, sendo mais privadas e íntimas, têm um impacto insidioso na vida de quem as sofre: o marido que menospreza a esposa porque está sempre a chorar, a mãe que ralha com o filho que cede à pressão dos testes escolares, ou a irmã que se afasta do irmão que não tem amigos e se isola no quarto. Há uma espécie de inabilidade em identificar o sofrimento desproporcionado como reflexo de um problema de saúde que deve ser abordado como tal. Se eu estou triste e sinto que não consigo lidar com essa tristeza, porque razão hei-de ser julgada por pedir ajuda?

As estatísticas dizem-nos que mais de um em cada cinco portugueses sofre de uma perturbação psiquiátrica. Estes são números que não permitem que ninguém se sinta imune de poder vir a desenvolver um problema de saúde mental. Por isso, a questão do estigma não é uma questão importante para as pessoas que estão doentes. É uma questão fundamental para todos nós, que já estivemos ou poderemos vir a estar doentes também.

Catarina Janeiro - Psicóloga Clínica

Psinove – Inovamos a Psicologia