Três em cada quatro doentes com cancro morreram numa instituição hospitalar, apesar de mais de metade terem expresso a vontade de serem tratados em casa na fase terminal, segundo um livro que é lançado hoje em Lisboa.

O obra “A Morte e o Morrer em Portugal”, da autoria de Maria do Céu Machado, Luísa Couceiro, Isabel Alves, Ricardo Almendra, Maria Cortes, é um estudo sobre a mortalidade em Portugal nos anos 2000, 2004 e 2008.

O estudo indica que 74,9 por cento dos doentes com cancro morreram em hospital ou clínica, 22 por cento em casa e 3 por cento noutro local.

“Em Portugal, tal como na generalidade dos países desenvolvidos, a maioria dos doentes com tumor maligno morrem em instituição hospitalar”, mas “esta situação parece estar em dissonância com aquilo que diversos estudos realizados noutros países mostraram: mais de metade das pessoas exprime a vontade de serem tratados em casa na fase terminal”, refere.

Embora não haja estudos em Portugal que tenham abordado esta questão, a situação será provavelmente coincidente com o que se verifica nos outros países.

Os autores consideram que para uma boa qualidade de vida na fase terminal é determinante que os doentes possam ser tratados com “respeito e dignidade, sem sofrimento, no ambiente familiar e na companhia dos familiares e amigos”.

Os dados indicam que 60,6 por cento dos serviços facilita o acompanhamento permanente da família, enquanto 81,6 por cento informam a família sobre os cuidados a prestar e 65,8 por cento têm orientações sobre como comunicar com a família em caso de morte eminente.

O telefone é o meio mais utilizado (71,7 por cento) para dar a notícia da morte e são os médicos (76,3 por cento) e os enfermeiros (65,8 por cento) que a transmitem com mais frequência.

Contudo, perto de 95 por cento dos médicos não receberam formação específica pré-graduada nesta área, enquanto a maioria (51,1 por cento) dos enfermeiros refere um resultado contrário. Relativamente à formação específica pós-graduada, o padrão de respostas é para médicos (80,5 por cento) e enfermeiros (61,9 por cento).

Segundo o estudo, 73,2 por cento dos médicos e 75,6 por cento dos enfermeiros lida com mais de 10 doentes em fase terminal de vida por ano.

Relativamente à formação da família como cuidadores, os médicos (39 por cento) consideram que é efetuada frequentemente, mas os enfermeiros (38,1 por cento) optam pela resposta “algumas vezes”.

Cerca de metade dos médicos sinalizam, algumas vezes (29,3 por cento) ou frequentemente (29,3 por cento), os familiares do doente para apoio psicológico durante o processo terminal. As respostas dos enfermeiros são semelhantes.

A médica Maria do Céu Machado disse à Lusa que já “há uma preocupação por parte dos serviços hospitalares e dos profissionais de saúde relativamente à problemática do apoio ao doente em fase terminal”.

“Isto não tem bem a ver com cuidados paliativos, tem a ver com o doente em fase terminal que está na enfermaria de um hospital e precisa de ter uma morte digna e confortável e que a família tenha apoio médico, religioso e psicológico”, disse a antiga alta comissária da saúde.

Os dados demonstram também que a letalidade intra-hospitalar nos doentes com cancro da mama, do colo do útero, do cólon e do reto resulta, na grande maioria dos casos, da progressão da doença oncológica primária.

Maria do Céu Machado defende que há mortes sensíveis aos cuidados de saúde: ”o ensinamento é que temos de avançar mesmo com o rastreio do cancro porque estamos a ter uma mortalidade que pode ser detetada mais cedo do que está a ser atualmente”.

22 de setembro de 2011

Fonte: Lusa