Esta técnica de meditação, baseada no budismo e fruto da teoria de um investigador do Massachussets Institute of Technology (MIT) nos Estados Unidos da América, já conquistou praticantes em todo o mundo. Porquê?
No dia a dia apressado e agitado em que vivemos, sempre ligados a aparelhos eletrónicos e à internet, perdemos o foco das coisas simples e essenciais.
Conduzimos quase como se estivessemos a competir para o primeiro lugar num prémio de automobilismo ou apanhamos o autocarro ao ritmo do stresse, almoçamos a olhar para o smartphone ou para o tablet... Nunca desligamos verdadeiramente! A negligência para com a simbiose entre as sensações interiores e os estímulos que recebemos do exterior retira-nos a total capacidade de sentir o momento.
Pelo contrário, o mindfulness convida-nos a prestar a atenção ao aqui e agora, ao tempo real, e a desligar dos estímulos mundanos. Esta técnica de meditação inspirada na filosofia budista que nasceu no Ocidente, em 1979, pelos ensinamentos de John-Kabat-Zinn, professor e investigador do MIT, conquistou uma legião de praticantes em todo o mundo.
A lista de praticantes inclui mesmo figuras mediáticas como o ator Richard Gere ou o presidente da Google, Eric Schmidt. Em Portugal, o boom está a acontecer agora. Tínhamos de perceber porquê, experimentar. Fizemo-lo numa breve sessão de introdução ao mindfulness, seguindo a voz de Nuno Mendes Duarte, psicoterapeuta, em busca do estado de consciência plena.
A ligação do corpo ao mundo
No interior de nós existe um lugar onde distinguimos claramente os pensamentos da realidade. A realidade é o nosso corpo que, num momento, permanece sentado numa cadeira, noutro instante desce uma rua, conduz um automóvel, reage aos estímulos sonoros, ao sabor de uma boa refeição. O corpo liga-nos ao mundo através dos cinco sentidos, mas dele tantas vezes nos desligamos para entrar em piloto automático. Dominados pelo nosso pensamento saltitante, entramos em mindlessness, viajamos de um sítio ao outro e nem nos damos conta do trajeto.
Ora programamos a semana, ora pensamos nas inúmeras tarefas que temos de concretizar nas próximas horas, no que pode correr mal. É neste momento que o tempo psicológico desafia o tempo real e nos transporta para um estado de ansiedade que, na realidade, não existe. Como descreve Nuno Mendes Duarte, «o mindfulness ajuda-nos a perceber que isso não são mais do que atividades mentais e que não há nenhuma realidade naquilo que estamos a pensar».
Treinar a atenção
Estou sentada confortavelmente numa cadeira. A minha mente, que minutos antes se debatia entre o atraso matinal e a preocupação com as mil coisas para fazer nas próximas horas, despoja-se de toda a pressão a que está submetida no dia a dia. Liberta-se, focando-se primeiro nas mãos sobre os joelhos, depois nas pernas em contacto com a cadeira, no pé esquerdo sobre o chão, no pé direito. Nota a qualidade das sensações, se está frio enquanto se distrai com os sons do exterior. Com a chuva, com o trânsito…
Os olhos permanecem fechados. Os estímulos visuais e sonoros são demasiado fortes e facilmente desviam a atenção. O importante é regressar ao corpo. Reconhecer que estamos apenas a pensar, sem nunca sair da cadeira. Não precisamos de mudar nada, simplesmente reconhecer que está a acontecer e regressar ao corpo, às costas em contacto com a cadeira.
Começo a diferenciar a atenção do pensamento. Continuo a seguir a voz do terapeuta que, pausadamente, me leva agora a focar a atenção na respiração. O ar a entrar nas narinas, a passar pela garganta, a chegar aos pulmões. Evito a tensão nos braços. Descaio os ombros sem nenhum tipo de tensão, enquanto a mente tende a distrair-se com a maré de pensamentos.
Mindfulness para a vida
«Treinar a consciência é isto, notar que num momento a atenção está concentrada numa parte do corpo, mas facilmente se distrai com os pensamentos, como uma criança irrequieta. Notar para que sítio foi. Sempre que saltitar para outro estímulo regressar à barriga. É o foco escolhido. Uma escolha opcional. Não interessa combater os pensamentos, apenas reconhecê-los», descreve Nuno Mendes Duarte.
Depois, continua o especialista, «começo a ouvir os sons lá fora. Mas aí sou capaz de estar só com a minha mente, que me leva e escolher onde quero focar a atenção. Este é um conceito fulcral. Mindfulness é prestar atenção ao aqui e ao agora, sem luta, sem julgamento, apenas aceitando o que a mente faz, mas sem mergulhar no que o pensamento está a dizer», sublinha.
Os benefícios desta terapia
Num desenvolvido e extenso artigo sobre o tema, a revista Time apresentou esta prática como o segredo para o bem-estar e a felicidade. «Não é fácil estar num estado de consciência plena», refere o terapeuta, que aconselha pelo menos seis sessões. A mindfulness tem de ser uma técnica continuada. «Ao terminar as sessões, os participantes ficam com a noção do que podem aprofundar», refere Nuno Mendes Duarte.
«Uma prática regular diária de 25 minutos de meditação é um gesto para a vida», acrescenta. Os benefícios são reconhecidos pela ciência. «Vários estudos na área da neurologia e psicoterapia demonstraram que praticar mindfulness regula as emoções, altera o fluxo sanguíneo e interfere na frequência cardíaca e no ritmo respiratório, atuando positivamente na dor crónica e nas emoções negativas», conclui.
Experimente em casa
Comece por fazer este exercício durante 10 minutos. Com a prática progressiva, sentirá que este treino mental a ajuda a concentrar-se e a sentir-se mais tranquila.
1. Sente-se de pernas cruzadas no chão ou numa cadeira com os pés ligeiramente afastados, as costas direitas e sem nada que a incomode. Deixe os seus ombros descair, respire profundamente e feche os olhos.
2. Embora seja difícil concentrar-se numa única coisa, tente centrar-se e focar a sua atenção na respiração. Foque-se nos movimentos que a sua barriga faz quando inspira e expira. Sinta-os pausadamente.
3. Se tiver pensamentos que a distraem da respiração, aceite-os e depois recentre o foco da sua atenção na respiração.
4. Não faça julgamentos sobre si própria nem tente ignorar as distrações. A sua missão é perceber que a sua mente vagueia e recentrar a sua concentração na sua respiração.
Rotinas mindfulness:
- Ao tomar banho tente não pensar em nada e focar a atenção na água a cair no corpo. Foque a atenção na pele.
- Às refeições evite estar ligado ao telemóvel, ver televisão. Em vez disso, opte por tentar sentir a textura com a língua o sabor de cada alimento.
- Na rua enquanto caminha, sinta o contacto com o chão. Foque a atenção no pé direito, depois, no pé esquerdo. Concentre-se nos movimentos, nos músculos. É normal distrair-se com os estímulos visuais e sonoros, mas regresse ao seu corpo.
Texto: Fátima Lopes Cardoso com Nuno Mendes Duarte (psicoterapeuta e diretor clínico da Oficina da Psicologia)
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