São muitas as belezas do Lake District, um parque nacional, localizado no noroeste de Inglaterra, no Reino Unido, muito procurado pelos lagos, pelas montanhas de relevo acidentado e pelas associações literárias históricas, que exibe aquela que é uma das paisagens mais bonitas de Inglaterra. Por esta razão, The Lakes, como esta área é designada, foi uma zona privilegiada para famílias abastadas construírem casas familiares com belíssimos jardins que são hoje algumas das grandes atrações desta área.

Um dos jardins que lá visitei e que mais me impactou foi Holker Hall. Esta propriedade de grandes dimensões, nas mãos da família Cavendish desde 1756 até aos dias de hoje, tem cerca de 30 hectares e reúne vários jardins num só. A casa senhorial data do século XVI, com as habituais alterações posteriores nos séculos XVIII e XIX. É, talvez, a que tem o interior mais interessante de todas as que vi, com enormes espaços menos escuros que o costume, graças a belíssimos vitrais e com muito boa pintura para amostra.

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Mas, como estas casas me interessam pouco, acho até que é tudo mais do mesmo, fugi logo que pude para os jardins, para uma visita que me encheu as medidas. Devido à sua dimensão, Holker ainda demora umas horas a percorrer se quisermos ver com atenção o espetacular jardim formal junto à casa e deambular pela enorme área de bosque até ao roseiral construído em sunken garden, tão ao gosto dos ingleses. A impecável manutenção de toda a área e o batalhão de jardineiros que dele cuidam só são possíveis porque o lorde e a lady Cavendish, além de fazerem de Holker Hall casa de família, são ambos jardinistas aficionados, como pude constatar.

Por essa mesma razão, estamos perante um jardim muito personalizado e o gosto pelo experimentalismo dos proprietários é evidente e contribui para que Holker Hall seja um jardim em permanente mutação, oferecendo aos visitantes um aspeto diferente em cada visita. Do impacto do jardim formal, com a sua impecável topiária e os seus generosos canteiros de flores, à tranquilidade do bosque, com os seus percursos ensaibrados, ao intimismo do roseiral, oferece-nos o prazer de desfrutarmos das suas vistas desafogadas.

Não é difícil termos a noção de que estamos perante uma paisagem vivida, trabalhada e estimada pelos proprietários, tal como também sucede em Holehird, que nasceu fruto das boas vontades. A história deste espaço é, todavia, completamente diferente da de Holker Hall. Os últimos proprietários, na impossibilidade financeira de manterem quer a casa quer as áreas envolventes, doaram Holehird ao concelho, tendo o edifício sido cedido a uma fundação que, depois, o transformou numa residência para deficientes.

O Lake District tem muitos encantos mas há dois locais que não podem (mesmo) ficar de fora do seu roteiro

Os jardins de Holehird são, desde 1969, geridos pela Lakeland Horticultural Society e inteiramente mantidos por voluntários. Composição, plantação, limpeza, manutenção, catálogos, estufas, propagação, tudo está a cargo de 250 pessoas que se ofereceram, benevolamente, para esse efeito. Desde as tarefas mais especializadas às mais simples, o trabalho efetuado nesta área de quatro hectares é não remunerado, mas feito com gosto e sabedoria, sendo os voluntários recrutados entre os cerca de 1700 associados da LHS.

As tarefas são distribuídas consoante a expertise individual. Não se paga bilhete à entrada, como noutros espaços. O contributo fica ao critério de cada um. É, todavia, recomendado um modesto donativo de cinco libras esterlinas, cerca de 5,50 euros, mas a sociedade tem conseguido aumentar sucessivamente a área de Holehird graças a inúmeras doações, ao contributo dos associados e à venda de plantas e livros à disposição do visitante. Holehird consiste em três áreas de jardim, muito diferentes.

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Além do Rock Garden, há o Lower Garden e o Walled Garden. Todos eles são um exemplo de cuidado na manutenção. O Rock Garden é, talvez, o melhor jardim do género que me foi dado conhecer, superior até aos famosos jardins de Kew, diria mesmo. Uma enorme área em declive exibe uma cuidadosa coleção de plantas de pequeno porte escolhidas pelo seu colorido, formato e textura, por entre as quais se avistam pedregulhos que servem de suporte à inclinação do terreno. O Lower Garden é um arranjo paisagístico naturalista por onde se pode passear em torno de um pequeno lago, usufruindo das vistas sobre os Lakeland Fells.

A cereja no bolo desta visita é o Walled Garden, uma zona quadrada que exibe muros rematados por canteiros luxuriantes e, pelo meio do relvado central, surgem cinco ilhas, não menos exuberantes garanto, de um colorido que regala os olhos. Como Holehird, é dos poucos jardins do Lake District que está aberto ao público todo o ano. Os seus canteiros são constantemente replantados para oferecerem uma variedade cromática surpreendente e irresistível ao longo das quatro estações do ano, como pude comprovar.

Quando lá estive, ainda era verão. O espetáculo estava centrado numa fabulosa coleção de dálias, mas também avistei exemplares de Eucryphia, para além de hostas, de rosas, de budleias, de hidrângeas e de lírios, só para citar algumas das variedades botânicas que mais me encantam. Seis estufas, cinco de propagação e uma para exposição, completam esta deliciosa e original ideia de fazer e manter um jardim, algo só possível, nos dias que correm, num país em que o amor pelas plantas e pela jardinagem faz parte da cultura.

Texto: Vera Nobre da Costa