Os jardins rurais minhotos são, por oposição aos urbanos, mais industriais, o resultado da organização social dos portugueses, do clima, da morfologia e do gosto, com as plantas dos descobrimentos lusos e das ex-colónias. O Minho é uma província do noroeste de Portugal com uma paisagem verdejante e fortemente humanizada, o que a diferencia no contexto português. O jardim português é um jardim com características próprias e individualizado dos seus congéneres europeus.
Essa condição confere-lhe um carácter próprio, resultante da organização social, do clima, do acidentado do território e da cultura dos portugueses. Estas características da identidade do jardim português são naturalmente comuns ao Minho, com uma grande diferenciação no desenvolvimento vegetativo causado pelos fatores edafoclimáticos dos solos de origem granítica e da forte influência marítima. Os jardins de todas as épocas têm um ambiente próprio que os torna inconfundíveis.
É natural que um povo que sempre viveu em condições especiais em relação ao resto da Europa tivesse, nos seus jardins, um cunho próprio e não apenas um papel meramente receptivo em relação à jardinagem. É notória a persistência do espírito medieval, pois o jardim, apesar de ligado à casa, quase nunca atinge a unidade de composição entre estes dois elementos, com o desenvolvimento de axiais bem marcadas, como acontecia com o jardim do renascimento italiano e que culminou no barroco francês. A integração paisagista é, assim, uma realidade. Os diversos compartimentos dos jardins lusos dispõem-se ao sabor das vistas.
Estes espaços, que ainda hoje pode visitar, adaptam-se admiravelmente ao terreno em que foram implementados, mas sem a rigidez e a pureza geométrica que encontrou a sua expressão perfeita no jardim francês do século XVIII. Este século foi um período de grande edificação das quintas de recreio do norte do país e dos seus jardins, de maior ou menor dimensão. Eram seleccionados os melhores sítios para se construírem as casas e os jardins, com a escolha de locais com grandes vistas.
O jardim se abre-se totalmente ou parcialmente sobre a paisagem. Em muitos locais do Minho, aproveitou-se o acidentado do terreno para construir o jardim em terraços, sistema que terá derivado da forma de construção em socalcos dos terrenos de cultura, particularidade que terá facilitado a integração paisagista destes jardins rurais na paisagem natural. Apresentam, assim, um ambiente próprio que os torna inconfundíveis, pelo tipo de elementos e pela forma como se dispõem.
Os jardins rurais do Minho são o resultado da organização social dos portugueses, do clima, da morfologia e do gosto, com a disponibilidade de plantas que os descobrimentos nacionais, e mais tarde as colónias, foram fornecendo. O jardim surge, geralmente formal, no patamar superior e nos patamares seguintes, que poderá, nestes últimos, ser já de laranjal com pequenos canteiros de buxo ou ainda com latadas, tanques e fontes. Estes jardins têm frequentemente uma situação dominante.
Dominam sobre a paisagem que, além da usufruição desta, permitia o controlo dos trabalhos agrícolas das quintas em que muitos deles ainda hoje se inserem, muitas delas visitáveis. O facto de o jardim se situar num patamar superior conferia uma maior intimidade, uma das principais características do jardim português. Também por esta razão a maior parte destes jardins não se encontra, tradicionalmente, no acesso direto à casa mas, sim, lateralmente ou atrás da residência dos seus donos.
O papel das latadas e das ramadas
O jardim é, na maioria dos casos, uma extensão da casa ao ar livre, tendo sido, talvez, o amor pela natureza que determinou este prolongamento, em que quase sempre um dos terraços se encontra perto do nível da habitação. Os jardins mihotos têm elementos bem característicos, como a sua ortogonalidade, a sua delimitação por muros ou sebes, as alamedas, as latadas, os tanques e as fontes, o que lhe confere um contraste de luz/sombra e de frescura no calor abrasador nos meses de verão.
Estes verões quentes e a forte luminosidade motivaram a criação de espaços de sombra e frescura, com a criação das referidas latadas para sombrear os caminhos e dos recantos frescos sob as árvores de grande copa. A água aparece em todos os nossos jardins, sempre aproveitada com o maior cuidado, quer como água corrente de repuxos ou fontes quer como espelhos de água que serviam de reservatórios para rega do próprio jardim e das culturas agrícolas. Os tanques também foram um dos elementos característicos dos espaços de recreio. O tanque da quinta, de grandes blocos de granito de forma quadrangular, era muito comum na época.
Para além da função predominantemente utilitária, tinha também um aproveitamento recreativo, embelezado por vezes com formosas bicas de cantaria. O borbulhar da água é um som dos jardins minhotos, que corre das minas para passar de tanque em tanque até ao ribeiro mais próximo de inverno ou para servir de rega da horta, do pomar e dos campos agrícolas nos meses de verão. Pequenos lagos circulares ou octogonais integram muitos destes jardins formais. A explicação é simples.
São uma herança da planta do jardim conventual, em que o elemento de água, com alimentação lateral ou ao centro sobre a forma de repuxo, é o seu ponto central. As nossas latadas conservaram sempre o carácter marcadamente rústico na sua função primária de suporte de plantas trepadeiras. Entre nós, predominou sempre a videira. Estas latadas ou ramadas, localizadas junto à casa ou cobrindo os caminhos do jardim e os largos debaixo de árvores bem copadas, tinham uma função lúdica.
A função de criar espaços de estar e de passeio, muitos deles rodeados por aromáticas e fruteiras. As ramadas são, geralmente, o eixo de ligação da parte recreativa da área de produção da quinta, muitas vezes também constituindo percursos de passeio recreativo, tornando difícil a delimitação da área recreativa da área de produção. As árvores e arbustos constituem o elemento dominante do jardim, com especial apreço para as plantas aromáticas, que integram a tradição gastronómica local.
Com elas se fizeram as sebes de buxo, de murta e de loureiro que perfumam os nossos jardins. Os jardins do Minho, com a excepção das azáleas (Azalea spp), das camélias (Camellia japonica) e dos rododendros (Rhododendron spp), são predominantemente constituídos por elementos perenifófios, pois o clima é já de transição para o clima atlântico, com invernos frios e húmidos. As glicínias (Wisteria sinensis) e as videiras (Vitis vinifera) que cobrem as pérgolas e as latadas amarelecem fazendo parte do espetro cromático no outono, que contrasta com o dos meses de verão, conferindo um interessante ritmo anual à paisagem.
Para além das camélias, dos rododendros e das azáleas, é comum encontrarmos nestes jardins belos exemplares de tulipeiros-da-virgínia (Liriodendron tulipifera) e de magnólias (Magnolia grandiflora). As laranjeiras (Citrus sinensis) e as oliveiras (Olea europaea), também muito comuns noutras regiões do país, surgem, geralmente, nos outros terrenos envolventes da habitação, já com uma função de produção. Era assim antigamente e, nalguns dos sítios, a realidade continua a ser essa.
Com o intuito de incrementar a produção de frutos nesses territórios, surgem também as nespereiras (Eriobotrya japonica), as cerejeiras (Prunus avium), as nogueiras (Juglans regia), os castanheiros (Castanea sativa), os diospireiros (Diospyrus kaki) e as figueiras (Ficus carica), que ocorrem de forma diferenciada, consoante as condições climáticas do local e também com as próprias características destes espaços, que podiam ser públicos e privados, civis e religiosos, como ainda hoje sucede.
Os jardins são, de todas as obras de arte, as mais frágeis, pelo que não é de admirar que ao longo do tempo, muitos tenham sido sucessivamente alterados, abandonados e até destruídos. O Minho tem hoje uma grande oferta de jardins públicos e privados de elevado valor patrimonial, que podem ser usufruídos pelos turistas e pelos hóspedes das unidades de alojamento turístico, dado que muitos destes jardins privados se encontram em unidades de turismo de habitação em espaço rural.
Os diferentes tipos de jardins poderão ser divididos em públicos e privados e entre civis e religiosos. Os jardins dos claustros e das cercas conventuais e os jardins dos santuários são uma forte marca do Minho, dos quais se destacam o do Santuário da Franqueira em Barcelos, os jardins barrocos e românticos do Santuários do Bom Jesus do Monte, do Santuário da Falperra e do Mosteiro de Tibães em Braga, assim como o do Santuário de Nossa Senhora da Abadia, localizado em Amares.
Os do Santuário de Nossa Senhora do Pilar e do Santuário de Nossa Senhora de Porto d'Ave em Póvoa de Lanhoso e o o Convento de Santa Marinha da Costa, em Guimarães, também merecem uma visita. No campo dos jardins privados, o período barroco é, sem dúvida, o mais fértil, de que se salientam os jardins do Palácio da Brejoeira em Monção, do Paço do Cardido e da Quinta da Boa Viagem em Viana do Castelo, do Paço de Calheiros em Ponte de Lima, da Casa de Assade em Barcelos, do Paço da Glória em Arcos de Valdevez, da Casa dos Biscainhos em Braga e da Casa de Recobelo, localizada na Póvoa de Lanhoso.
Os da Casa de Sezim e do Paço de São Cipriano em Guimarães e os da Casa de Pielas em Cabeceiras de Basto também figuram na lista de espaços ajardinados a ver. No século XX, surgem dois bons exemplares de jardins privados, os jardins da Quinta Villa Beatriz em Póvoa de Lanhoso e do Palácio de D. Chica em Braga. É também neste século que surge a maior parte dos jardins públicos, geralmente com um desenho geométrico de que é um bom exemplo o Jardim de Santa Bárbara, em Braga.
Paralelamente, este território tem assistido, mais recentemente, à construção de novos espaços verdes, de tipologias distintas, mais modernas, alguns deles de contemplação e outros de conservação da natureza e/ou de estadia informal, para satisfazer a crescente procura e atrair mais turistas e visitantes. Destes espaços são exemplo a recuperação das margens do rio Lima, com a criação do Parque do Arnado e do Festival Internacional de Jardins de Ponte de Lima e o Parque da Cidade em Viana do Castelo.
Texto: Manuel de Carvalho e Sousa (arquiteto paisagista)
Comentários