Associada às grandes obras públicas que decorreram durante o Estado Novo, a Alameda D. Afonso Henriques imprime em várias gerações da população lisboeta uma influência muito significativa sobre a sua memória. Em meados dos anos 20, surge em Portugal o ciclo modernista, assistindo-se a uma evolução do novo gosto Art Deco para o modernismo experimental, esquecendo temporariamente a história e a memória. As mudanças na arquitectura portuguesa surgem com um novo material, o betão armado, que permitiu a construção de obras inéditas, como o Cinema Capitólio, com apontamentos do novo gosto Deco e um purismo racionalista, referência nos modelos de vanguarda internacional do Movimento Moderno.

Veja a GALERIA DE IMAGENS DA ALAMEDA D. AFONSO HENRIQUES   A partir de 1926, com a implantação e consolidação do Estado Novo, Lisboa é alvo de uma nova política de expansão e embelezamento de características monumentais e nacionalistas. A cidade viu parte do seu tecido urbano desaparecer por meio de expropriações e demolições e consequente construção de espaços emblemáticos para o sistema político vigente. Alameda Afonso Henriques, Praça do Império, Praça do Areeiro e de Londres são alguns dos espaços legados pelo regime autoritário de Salazar. Duarte Pacheco protagonizou a política das Obras Públicas do Estado Novo enquanto ministro das Obras Públicas e Comunicações e, mais tarde, como presidente da Câmara Municipal de Lisboa, cargo que acumulou com o primeiro até à data da sua morte, em 1943. A primeira grande obra pública modernista do regime iniciou-se em 1927, no ano seguinte ao do golpe militar, com a edificação do Instituto Superior Técnico, projectado por Pardal Monteiro.   Veja na página seguinte: A construção da acrópole moderna Com o objectivo de «dar aos engenheiros uma casa condigna», como se justificou na altura, conclui-se em 1941 um desenho de pavilhões cúbicos, onde se afirma a fachada livre e a janela em largura. Criou-se assim a chamada moderna acrópole, elevando a arquitectura à escala da cidade, numa grande composição que se articulava entre uma das franjas das Avenidas Novas e a futura alameda monumental, juntamente com outros equipamentos modernos, nomeadamente o Instituto Nacional de Estatística, o conjunto de moradias modernistas e a Casa da Moeda. A partir de finais da década de 1930, surgem na arquitectura características historicistas e regionalistas, de raízes clássicas, próximas de modelos nazis e fascistas da época. Em matéria de espaços verdes, Duarte Pacheco idealizou mais tarde o prolongamento da acrópole através da Alameda D. Afonso Henriques, criando um eixo verde de características monumentais. Numa escala urbanística, surgiu este novo eixo urbano no qual se foram edificando diversos blocos de habitação entre 1936 e 1946. Para rematar a extremidade oriente da Alameda D. Afonso Henriques, esteve prevista a construção de uma igreja, ideia que foi posteriormente abandonada. Em 1939, Carlos Rebelo de Andrade e Guilherme Rebelo de Andrade formulam um novo projecto, que valorizaria o conjunto edificado do Instituto Superior Técnico (IST), com a criação de uma fonte e um miradouro no seu terraço superior, permitindo a contemplação da vista panorâmica sobre a alameda.   O projecto da Fonte Monumental da Alameda D. Afonso Henriques, de estilo neojoanino, em oposição ao modernista conjunto do IST, alia solidez e monumentalidade, através da utilização de um corpo em cantaria de Cabriz e um vocabulário historicista e nacionalista. Diogo de Macedo é o autor do conjunto escultórico central e das Tágides com caudas de peixe, que seguram golfinhos e búzios. O conjunto escultórico central representa alegoricamente a figura do Tejo segurando uma nau, a qual um tritão montado num cavalo-marinho tenta alcançar. Esta composição faz alusão às obras hidráulicas de 1940 que possibilitaram a entrada das águas do vale do Tejo no abastecimento de água a Lisboa, passando a existir um fornecimento de 100 milhões de litros de caudal diário aos habitantes. Maximiano Alves é responsável pelas figuras de nereides, que seguram búzios e vieiras, por onde caem fios de água. Jorge Barradas teve a seu cargo os dois baixos relevos policromos, que representam alegorias ao trabalho. A sua construção teve início em 1940. Contudo, apesar de ter sido concluída em 1943, só foi inaugurada oficialmente a 28 de Maio de 1948, aquando da celebração da Revolução Nacional e da abertura da I Exposição de Obras Públicas. No ano de 1945, iniciou-se o concurso para a construção do jardim-miradouro na elevação sobranceira à fonte monumental, por iniciativa da Câmara Municipal de Lisboa. Recentemente este espaço foi recuperado, permitindo à população não só desfrutar da ampla e profunda vista como também de um espaço de estadia agradável, com diversas sombras. Veja na página seguinte: A estrutura do jardim

A estrutura do jardim

A Alameda D. Afonso Henriques, assim denominada em homenagem ao primeiro monarca português, é constituída por dois grandes tabuleiros relvados separados pela Avenida Almirante Reis e por um pequeno jardim no topo da fonte. O eixo de simetria desta alameda serve de charneira às freguesias de Alto do Pina, de São João, de São Jorge de Arroios e de São João de Deus. Em ambos os tabuleiros sobressaem de imediato as duas alamedas paralelas de lodãos (Celtis australis e Celtis occidentalis), que delimitam os grandes relvados que descem do Instituto Superior Técnico e que sobem até à fonte monumental.   A área mais plana é onde se concentram as crianças no parque infantil, os jovens no relvado e os idosos nas mesas de jogos. Este espaço verde municipal com cerca de 5 ha está dotado de uma estatuária, bebedouros, um parque infantil, mesas de jogo e a famosa fonte monumental, que é colocada em funcionamento regularmente. Subindo as escadarias laterais da fonte monumental, chega-se ao primeiro patamar do miradouro, amplo espaço aberto, composto por com um lago e uma pérgola.   Este é encimado por um segundo patamar com caminhos ondulantes entre relvados e enquadrados por arvoredo que proporciona sombras agradáveis. São de referir exemplares de casuarina (Casuarina equisetifolia), palmeira-das-canárias (Phoenix canariensis), bela-sombra (Phytolacca dioica), pinheiro-manso (Pinus pinea) e pimenteira-bastarda (Schinus molle).

O valor patrimonial deste parque

O valor histórico deste jardim é elevado uma vez que se encontra associado às grandes obras públicas que decorreram durante o Estado Novo. A associação deste jardim a uma personagem de destaque em Portugal, através da atribuição de toponímia Dom Afonso Henriques, valoriza o seu interesse histórico. É de destacar a presença da fonte monumental e da estatuária simbólica que conferem características grandiosas a este espaço e remetem para uma nova dimensão temporal e espacial. O seu valor sócio-cultural é alto, pois a existência associada a um período de destaque na história de Portugal imprime em várias gerações da população lisboeta uma influência muito significativa sobre a sua memória. Apesar do tráfego intenso, é um espaço muito vivido e utilizado, especialmente pelos idosos e pelos jovens em actividades desportivas. Este jardim apresenta um elevado interesse turístico devido à sua fonte monumental, que confere uma imponência singular ao espaço, invocando o nacionalismo do período do Estado Novo. Além disso, por ser uma alameda-jardim, apresenta uma dinâmica diferente dos restantes espaços verdes de Lisboa. A Metodologia de Caracterização e Classificação dos Jardins Públicos de Interesse Patrimonial, desenvolvida pelas arquitectas paisagistas Isabel Silva, Elsa Isidro e Ana Luisa Soares, também responsáveis pelo levantamento das espécies arbóreas daquele espaço, foi aplicada a 31 dos jardins públicos da cidade Lisboa, permitindo avaliar a qualidade e interesse dos mesmos. O valor histórico, paisagístico e sócio-cultural da Alameda D. Afonso Henriques confere-lhe uma classificação de 46 valores (sendo o valor máximo 50), ficando em 5º lugar no ranking dos 10 melhores jardins públicos da cidade. Veja na página seguinte: A vegetação de interesse que por lá existe

Vegetação de interesse

Neste jardim destacam-se os seguintes exemplares arbóreos: - Bela-sombra (Phytollaca dioica) Árvore caducifólia originária das regiões temperadas e sub-tropicais da América do Sul. Adapta-se bem à secura do clima mediterrânico. Apresenta crescimento rápido e os troncos são reservatórios de água, daí o seu largo diâmetro. - Lodão-americano (Celtis occidentalis) Árvore caducifólia originária da América do Norte. Difere do lodão-europeu por apresentar as folhas glabras (sem pêlos) na página inferior. - Lodão-europeu (Celtis australis) Árvore caducifólia até 25m, orginária das regiões do Sul da Europa e Sudoeste da Ásia, espontânea em Portugal, surgindo em matas ribeirinhas do Norte e Centro. Muito utilizada como árvore de arruamento e ornamental. - Palmeira-das-canárias (Phoenix canariensis) Palmeira robusta com origem nas ilhas Canárias. Pode atingir 20 metros de altura e tem uma copa densa redonda e abobadada. É a palmeira exótica mais frequente em Portugal, utilizada como árvore ornamental em quase todo o país, em parques, jardins públicos e privados. - Pimenteira-bastarda (Schinus molle) Árvore perenifólia até 12 m de altura, oriunda de habitats de montanha, da América Central e do Sul. Apresenta ramos esbeltos e pendentes, sendo plantada como ornamental no Sul da Europa. A sua frutificação surge no fim de Agosto, com cachos de bagas rosadas, cujo sabor se assemelha ao da pimenta. - Pinheiro-manso (Pinus pinea) Árvore perenifólia de até 30 metros de altura, copa abobadada, com ritidoma gretado. Conífera originária do Mediterrâneo Oriental. Em conjunto com a oliveira e o cipreste esta espécie faz parte das árvores emblemáticas do mediterrâneo. Muito cultivada pela madeira e pelo pinhão.

FICHA TÉCNICA

Localização: Alameda D. Afonso Henriques. Tem acesso pela Avenida Almirante Reis e pela Avenida Manuel da Maia Freguesia: Alto do Pina Área: 5 ha Equipamentos: Parque infantil, mesas de jogos e fonte monumental Horário: Aberto 24h Texto e fotos: Isabel Silva, Elsa Isidro e Ana Luísa Soares (arquitectas paisagistas)