Todos nós passamos por eventos dolorosos e pode ser muito difícil ajudar uma pessoa próxima a lidar com isso. É muito custoso assistir ao sofrimento de alguém com quem nos preocupamos. Quando sabemos que aconteceu algo de mau a alguém, surge logo a questão “o que é que eu agora lhe digo”, sendo que a resposta certa é muito mais simples do que acontece habitualmente: não diga nada, somente esteja presente. Isto irá ser uma acção muito mais valiosa do que qualquer conselho ou dica que tenha para oferecer, pelo menos no momento imediato.
Perante tragédias ou perdas partilhadas nas redes sociais, após dez segundos a navegar nas caixas de comentários percebemos que, na ânsia de ser útil, é comum ir-se na direcção oposta. Num momento de desespero agudo, nada do que possa dizer-se vai amenizar a dor e, na maioria das vezes, vamos meramente usar clichés cansados que podem agravar a situação. Não evitem a dor do outro, permitam que ela exista, que seja verbalizada ou expressada. Estejam ao lado, dêem a mão, ajudem com a logística necessária, seja a cuidar das crianças ou animais, a fazer telefonemas ou a preparar refeições. Estejam presentes, ouçam com atenção, respeitem o que a outra pessoa sente, seja o choro, o silêncio desconfortável ou simplesmente a necessidade de espaço. Isto é um ponto pertinente porque as pessoas reagem de diferentes formas e podem ter necessidade de estar sós, e isso deve ser tido em consideração. Se for o caso, e ainda assim quiser ajudar, pode, pontualmente, apresentar a sua disponibilidade, através uma mensagem indicando, por exemplo, “Respeito o teu espaço, não precisas de responder, só quero que saibas que penso em ti e que estou aqui para o que puder ajudar”.
Este tipo de cuidados demonstrará o vosso apreço e que se preocupam. Fará de vocês um pilar incomumente seguro e raro, já que a atitude habitual é tentar distrair a pessoa e mostrar-lhe que também há coisas boas além da tragédia. É claro que haverá, mas, perante aquele momento de tristeza, a pessoa não quer pensar sobre isso. Não se preocupe com não saber o que dizer, se o outro quiser partilhar, apenas tem de ouvir e validar. Se a pessoa não quiser conversar, também é pouco provável que queira que lhe ocupem o tempo com solicitações (e se o desejar, poderá expressá-lo), agradecendo apenas a companhia que podem proporcionar-lhe.
Se sentirem necessidade de adequar o vosso discurso, questionem como podem ajudar. Perguntem à pessoa se quer conversar sobre o que aconteceu ou se prefere ser distraída. Se quiser falar, questionem se prefere só desabafar o que sente ou se quer algumas sugestões práticas. E, depois disso, é essencial respeitar o que foi pedido. Quando querem apoiar alguém, mais do que fazerem o que gostariam que fizessem por vocês, é essencial que auxiliem do modo como a outra pessoa precisa ou deseja ser ajudada. É a única forma de garantir que serão bem-sucedidos, sem “atropelar” a pessoa com as vossas preocupações.
Após algum tempo sobre o evento, existe uma propensão a não abordar a situação. Se mesmo no momento do evento negativo há a tendência para retirar importância ao sucedido, tentando minimizar com o desconfortável sofrimento do outro, passando algum tempo, rapidamente partirão para o discurso pobre de “tens de ultrapassar isso” ou, pior ainda, fazer de conta que não aconteceu, para não ter de lidar com isso, mascarado de um “só te faz mal pensares nisso”. Se é importante para pessoa continuar a falar sobre o seu trauma ou perda, é fulcral que isso possa acontecer, até para prevenir o seu isolamento social.
Naturalmente, existem situações que se prolongam muito para além do que é saudável, começando a comprometer o funcionamento diário da pessoa, contudo, sendo esse o caso, há que validar que isso é o que a pessoa está a sentir. Pode ser útil sugerir que talvez esteja na altura de procurar algum tipo de apoio psicológico profissional. A psicoterapia, nestes casos, desempenha um papel eficaz a “libertar” as pessoas próximas para poderem usufruir de tempo de qualidade com a pessoa em questão, não apenas servindo de receptáculos da desgraça, que será devidamente adereçada e orientada, de modo a minimizar a dor e a permitir que a pessoa reencontre vínculos positivos com os outros.
Em suma, esteja presente, sem se impor (não permita que a sua apreensão anule a pessoa ou o seu sofrimento), ouça ativamente e ajude com a logística. Lidar com o sofrimento do outro é complicado, seja porque não sabemos o que dizer e temos medo de piorar, seja porque nos sentimos impotentes para ajudar.
Em momentos de crise, ouvirmos e disponibilizarmo-nos para cuidar do que a nossa pessoa não estiver capaz de fazer, pode ser a chave de ouro. A pessoa ficará grata por ter esse amparo, sem ser condicionada a adequar o que sente, sem crítica, moralidades ou conselhos não solicitados. É difícil presenciar a dor do outro sem fazer nada ou tentar “resolver” a sua situação. Assistir e não agir pode ser muito desafiante, mas, se o que pretendemos é ser capazes de ajudar, e isso for o que a pessoa necessita para se sentir um pouco menos triste, vale bem o esforço.
Por Isabel Filipe, Psicóloga Clínica e autora do blogue Agir e Sentir.
Comentários