O tempo é essencial. Quanto mais rapidamente a vítima chegar ao hospital, mais áreas do cérebro poderão ser poupadas. Os acidentes vasculares cerebrais (AVC) são a principal causa de morte em Portugal e a sua prevenção debate-se com um velho conceito. "É preciso lutar contra a ideia de que nada pode ser feito", alerta Maria Teresa Cardoso, membro do conselho consultivo do Núcleo de Estudos da Doença Vascular Cerebral da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna, que chegou a coordenar.
"Conhecemos os fatores associados a 90% do risco e, para a maioria deles, há prevenção e tratamento eficazes", garante a especialista. De acordo com os dados oficiais nacionais, morrem em média, por dia, 35 pessoas vítimas de AVC. Representam cerca de 9,8% da mortalidade total e configuram uma taxa de 106,5 mortes por 100.000 habitantes. Segundo as estatísticas, apenas uma em cada cinco vítimas reconhece atempadamente os sinais e liga de imediato para o 112, um gesto que pode fazer toda a diferença.
O AVC afeta as artérias cerebrais e dá-se "quando um vaso sanguíneo que transporta oxigénio e nutrientes para o cérebro rompe ou é bloqueado por um coágulo", esclarece a American Heart Association. "Quando tal acontece, uma parte do cérebro não consegue obter o sangue e oxigénio de que necessita e começa a morrer", informa a associação norte-americana que reúne alguns dos mais reputados cardiologistas do mundo. Este acidente é súbito e os seus efeitos no organismo são imediatos, por vezes fatais. Existem, essencialmente, dois tipos de AVC, os isquémicos e os hemorrágicos. Os primeiros ocorrem quando um coágulo bloqueia uma artéria, impedindo a irrigação sanguínea de uma área do cérebro. Os segundos dão-se quando uma artéria rompe.
O cérebro controla as funções corporais em áreas específicas, pelo que as consequências dependem da área e da extensão afetada após o incidente. Se o AVC atacar o hemisfério esquerdo, a área que controla os movimentos do corpo do lado direito, esse lado vai ficar paralisado. O cérebro também controla os processos mentais mais nobres, que envolvem atividades como o comunicar, o sentir e o pensar, que também podem ficar perturbados, em maior ou menor grau, como consequência de um acidente vascular deste tipo.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), aplicar todas as medidas de prevenção conhecidas e disponíveis nos tempos que correm permite reduzir em cerca de 80% a doença vascular cerebral. De acordo com este organismo internacional, são cinco os fatores de risco que pode controlar, a hipertensão arterial, a fibrilação auricular, o colesterol elevado, o tabagismo e a obesidade, como pode comprovar de seguida. Veja ainda as recomendações essenciais que os especialistas globais mais fazem.
Hipertensão arterial
É preciso monitorizá-la regularmente. "É um dos mais potentes fatores de risco, contribuindo em 54% para o risco de AVC", alerta Maria Teresa Cardoso. A hipertensão faz o coração bombear o sangue de forma mais enérgica, uma situação que prejudica o normal funcionamento deste órgão. Uma ação que pode "enfraquecer os vasos sanguíneos e danificar órgãos principais, como o cérebro", sublinha a associação americana National Stroke Association (NSA). Os cuidados que deve ter para não a fazer disparar:
- Reduza a ingestão de sal
Diminua as quantidades que utiliza e, se necessário, substitua-o por ervas aromáticas. "É uma medida crucial que está associada à diminuição da pressão arterial e da mortalidade por AVC", refere Maria Teresa Cardoso. A OMS recomenda um máximo de 5 gramas diárias. "Os portugueses fazem uma ingestão média de cerca de 12 gramas de sal por dia", critica a especialista.
- Meça a pressão arterial
Mantenha-a sob vigilância. "O controle tensional ótimo é da maior importância para uma redução sustentada do risco de AVC", sublinha a médica, especialista em medicina interna. 120/80 é o valor aproximado de uma pressão arterial normal. Faça a medição, no mínimo, uma vez por ano. Deve fazê-lo mais vezes, se tem outras complicações de saúde.
- Respeite a medicação
Não facilite. Caso esteja a ser medicado para a hipertensão, siga as indicações à risca. "A terapêutica anti-hipertensora reduz em 28% o risco de AVC e em 39% a morte por AVC nos doentes com mais de 80 anos", refere ainda Maria Teresa Cardoso.
Fibrilhação auricular
É outro dos fatores de risco que pode controlar. "Trata-se de uma arritmia que aumenta em cerca de cinco vezes o risco de AVC", informa Maria Teresa Cardoso. Segundo a NSA, graças a este problema, "há tendência para a formação de coágulos que podem alojar-se numa artéria cerebral e provocar um AVC". Prevenir e controlar este problema é, por isso, fundamental, pelo que deve procurar ajuda especializada para vigiar esta situação. Eis que o deve fazer para se defender:
- Avalie o ritmo cardíaco
Os aparelhos de medição de tensão arterial também avaliam o batimento cardíaco, mas só a realização de um eletrocardiograma permitirá fazer o diagnóstico.
- Tome a medicação à risca
Se está a ser medicado, siga a medicação à risca. "O tratamento hipocoagulante pode diminuir o risco de AVC em 62%", sublinha Maria Teresa Cardoso. "Os novos anticoagulantes orais têm a grande vantagem de não necessitarem de monitorização e de terem poucas interações medicamentosas", referiu ainda a médica em declarações à revista Prevenir.
Tabagismo
É outro dos fatores de risco. "Fumar danifica as paredes dos vasos sanguíneos, acelera a obstrução das artérias, aumenta a pressão arterial e o esforço do coração", recomenda a NSA. Deixar de fumar é o melhor gesto preventivo que deve fazer. "O tabagismo aumenta duas a três vezes o risco de AVC, que desaparece ao fim de dois a quatro anos após a suspensão deste hábito", refere Maria Teresa Cardoso. A toma concomitante de contracetivos orais aumenta ainda mais o risco.
Colesterol elevado
Também deve ser mantido debaixo de olho. "Níveis elevados de colesterol LDL aumentam 1,5 vezes o risco de AVC", adverte Maria Teresa Cardoso. O mau colesterol contribui para "a acumulação progressiva, nas paredes arteriais, da placa de ateroma, formada por depósitos de gordura e outras células", alerta também a NSA. O seu valor total de colesterol deve ser inferior a 190 miligramas/decilitro. Faça regularmente análises para se manter a par destes níveis e adote estes gestos preventivos:
- Selecione as gorduras
Evite alimentos ricos em gorduras saturadas e trans, como é o caso de bolos, bolachas, carnes gordas e fritos. Prefira gorduras saudáveis como as do azeite e dos peixes gordos, ricas em ómega-3.
- Aposte nos vegetais
Coma cinco ou mais doses de fruta e vegetais ao longo do dia. Em vez de hidratos de carbono como as massas e o arroz, privilegie os legumes crus, cozidos ou salteados em azeite e alho.
- Respeite a medicação
Caso o seu médico considere que deve ser medicado, cumpra as suas recomendações. "As estatinas reduzem a incidência de AVC de 3,4% para 2,7%", sublinha Maria Teresa Cardoso.
Obesidade
É outro dos grandes males das sociedades de hoje. "A obesidade duplica o risco de AVC isquémico", revela a especialista. O excesso de peso está diretamente ligado a outros fatores de risco do AVC, como a diabetes (triplica o seu risco) ou a hipertensão arterial, colocando em tensão todo o sistema circulatório. Para se defender deste tipo de acidentes vasculares, seja mais ativo.
Não use o elevador se pode subir as escadas nem vá de transportes se pode ir a pé. Se costuma percorrer grandes trajetos de transportes públicos, saia uma ou duas paragens antes e caminhe. O objetivo são 30 minutos de atividade física todos ou na maior parte dos dias. Vigie também as calorias que consome. Para se manter em forma, não pode ingerir mais calorias do que as que consome.
Outros fatores de risco
Para além da hipertensão arterial, da fibrilação auricular, do colesterol elevado, do tabagismo e da obesidade, existem outras variáveis que obrigam a precauções acrescidas no combate de prevenção contra o AVC:
- Idade
A partir dos 55 anos, a probabilidade de AVC duplica a cada década de vida.
- História familiar
Os familiares diretos de doentes com AVC correm maior risco de sofrer um AVC. Segundo Maria Teresa Cardoso, "se forem portadores de fatores de risco vascular com incidência familiar, tais como a hipertensão arterial, a dislipidemia, diabetes mellitus, a correção de todos os fatores de risco, através da mudança do estilo de vida associada a terapêutica farmacológica, é fundamental na prevenção", assegura a especialista.
- Acidente isquémico transitório
O risco é superior em quem já teve anteriormente um AVC e um ataque cardíaco, mas também em quem já sofreu um acidente isquémico transitório, também conhecido como AIT. A probabilidade é dez vezes superior. Nesta situação, o fluxo sanguíneo numa área cerebral é interrompido de forma passageira. Os sintomas são idênticos aos do AVC, mas desaparecem completamente em alguns minutos ou até 24 horas. É uma situação de emergência. Reconhecê-lo e tratá-lo reduz o risco de AVC.
Os principais sinais de alarme
Quanto mais depressa atuar, menores serão as sequelas de um AVC. Perante estes sintomas não hesite em chamar o 112:
- Boca ao lado
- Dificuldade em falar
- Perda de força no braço e/ou perna, sobretudo num dos lados do corpo
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