Os hábitos e rotinas desempenham um papel central no controlo da doença bipolar e, consequentemente, na qualidade de vida dos doentes. Tal como os seus amigos e familiares. Em entrevista ao psiquiatra Filipe Arriaga, ficámos a conhecer, quer os aspetos mais importantes a ter em conta, quer os que não têm qualquer influência na qualidade de vida destes doentes. Serão a alimentação, exercício físico e horários de sono importantes? As respostas vêm já a seguir.
Qual a importância dos ritmos de vida para estes doentes?
A larga maioria dos psiquiatras do mundo está de acordo sobre a importância da educação para medidas psico-educativas. Estas pessoas ficam incapacitadas, não por razões de trauma psicológico, mas por factores de vida. Nomeadamente, tudo o que perturbe os ritmos circadianos [relativos a variações biológicas rítmicas ou que pertence a um período de 24 horas]. Uma crise e, de um modo especial uma crise de mania, pode acontecer por se privar um doente de uma noite de sono.
Muitos destes doentes iniciam uma crise maníaca, por exemplo porque se levantaram de madrugada para apanhar um avião ou porque, por qualquer razão, saltaram uma noite de sono. O consumo de estimulantes como cafeína, por exemplo, é absolutamente proibido nesta doença mas, sobretudo, a regularidade dos horários e, em particular, do horário do sono é fundamental como fator estabilizador.
O exercício físico e a alimentação são importantes?
O exercício não deve ser sequer indicado, já que um dos fatores precipitantes de crises é o stresse emocional e físico, pelo que o cansaço físico é prejudicial. Já a alimentação, é um dos cuidados gerais de saúde, mas não há nada de específico relativo a esta doença.
Que papel devem assumir os familiares e amigos mais próximos?
Basicamente, ajudar o doente a zelar pelos tais aspectos que fazem parte deste curto mas fundamental pacote de medidas co-educativas, que incluem a regularidade de horários, a regularidade dos ciclos de sono, a não ingestão de estimulantes e, obviamente, de substância ilícitas.
O álcool não é aconselhável, embora não seja um factor precipitante de crises. É, sobretudo, complicado quando o predomínio da doença é depressivo porque facilita a depressão. O primeiro papel dos familiares é ajudar o doente a zelar pelo respeito destas normas muito simples que têm a ver com a educação para a doença.
E em situações de crise?
Normalmente, nas fases depressivas o doente mantém-se consciente de que está doente ou em crise e queixa-se rapidamente ao médico, mas nas fases maníacas esquece-o rapidamente. É capaz de reconhecer que está em excitação por um período breve de tempo no início da crise, mas depois perde essa capacidade.
Mesmo um doente tratado com estabilizadores de humor, se der um primeiro sinal de mania, sente-se bem e acha que não precisa de ir ao médico. O papel dos familiares é, por isso, muito importante no reconhecimento dos sintomas e na deteção precoce de uma crise. Sem esse apoio, o doente acaba por escapar ao controlo de todos e perde-se o controlo da situação.
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Qual a importância do contacto com o médico?
É importante o contacto com o médico e o papel de colaboração e detecção precoce, sobretudo das crises de mania, porque são aquelas em que o doente, muito rapidamente, perde a capacidade de reconhecimento de que se encontra doente.
É possível estabelecer uma correlação entre doença bipolar e suicídio?
A depressão, em geral, é um fator muito importante para o aumento do risco de suicídio. E há crises de mania com características clínicas particulares (chamadas manias atípicas ou, segundo uma designação que eu considero infeliz, estados mistos) em que, simplificando as coisas, em vez de euforia há irritabilidade. E por vezes, no contexto desta irritabilidade, associada à desinibição comportamental, estão descritas tendências suicidas.
Mas a mania é, por definição, uma fase de bem-estar excessivo, pelo que, em princípio, não está associada a um risco aumentado de suicídio. Até estará, calculo, associada a um risco menor do que o da população em geral.
Texto: Rita Miguel com Filipe Arriaga (psiquiatra)
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