Investigadores do National Cancer Institute e da Harvard Medical School, associados a colegas em vários pontos do mundo, debruçaram-se sobre 12 estudos, que abrangiam 26 tipos de cancro, que envolveram 1,44 milhões de participantes com idades entre os 19 e os 98 anos, residentes nos Estados Unidos da América e na Europa. O acompanhamento médio destes participantes por parte dos estudos foi de 11 anos. Graças a esse trabalho, foi possível apurar um dado impressionante.

A prática de exercício físico pode reduzir o risco de 13 tipos de cancro. Depois de ler este artigo, vai querer praticá-lo todos os dias. É aqui que vai encontrar o que pode começar a fazer já. "A falta de atividade física tornou-se uma grave questão de saúde pública nos dias que correm", alerta Steven Moore, coordenador de uma investigação publicada no Journal of the American Medical Association, que relaciona a prática de exercício físico à redução do risco de, pelo menos, 13 tipos de cancro.

"Replicámos descobertas anteriores sobre o cancro do cólon, mama e endométrio, mas constatámos também uma diminuição do risco no adenocarcinoma do esófago, na leucemia mieloide, no mieloma e nos cancros do fígado, do pulmão, do rim, no gástrico [tumor cárdio], no da cabeça, no do pescoço, no do reto e no da bexiga. Não sabemos porque os restantes tipos não apresentaram esta associação", explicou o investigador em entrevista exclusiva à revista Prevenir.

"Neste grupo, os cancros têm diferenças biológicas consideráveis entre si e não parece existir um ponto comum entre eles", acrescenta ainda. Este especialista do National Cancer Institute revela que, para além de comprovar os benefícios do exercício como peça-chave na prevenção do cancro, "os resultados demonstram que estes benefícios podem ser alargados a vários grupos da população, incluindo fumadores e pessoas com excesso de peso ou obesidade", refere.

Uma análise pioneira

As descobertas feitas ao longo das análises científicas que foram levadas a cabo nos últimos anos entusiasmam os investigadores. "A atividade física em períodos de lazer já tinha reconhecidos benefícios na redução dos riscos de doença cardiovascular e mortalidade geral, bem como de cancro do colon, mama e endométrio", sublinha Steven Moore. "Contudo, sabia-se menos sobre o seu efeito na redução do risco de outros tipos de cancro", alerta o cientista norte-americano.

Apesar de centenas de estudos prospetivos terem analisado esta ligação com diferentes tipos de cancro e de apresentarem indícios sugestivos, os resultados eram inconclusivos. "Acreditávamos ser possível confirmar algumas das potenciais ligações e ficámos surpreendidos por ter conseguido comprovar a existência de tantas", afirma o coordenador da investigação, que teve como objetivo identificar a relação entre a atividade física e o risco de cancro e "determinar se estas associações variam segundo o peso ou o histórico de tabagismo".

A redução do risco (também) verificada nos fumadores

Uma das principais conclusões deste estudo é a importância da atividade física para a saúde e prevenção do cancro, seja qual for a condição física da pessoa. Após compararem os vários fatores, constataram que os benefícios eram idênticos tanto no grupo de peso normal como no grupo com excesso de peso ou obesidade, fumadores ou não fumadores. Dados que apontam para um benefício da atividade física que vai além do metabolismo e da gestão do peso.

"Descobrimos que a associação à atividade física era independente, o que significa que as pessoas ativas com peso corporal normal têm o risco mais baixo de cancro. Mas se uma pessoa tem excesso de peso e não consegue perdê-lo, a atividade física pode ser usada para ajudar a mitigar alguns dos riscos que esse excesso tem para a saúde. Estes dados aplicam-se no cancro, bem como na mortalidade geral, como já verificámos em estudos anteriores", sublinha ainda Steven Moore.

O caso do cancro da mama

O efeito protetor da prática de exercício em relação ao cancro da mama já havia sido comprovado em relação ao risco de recorrência da doença, notando-se que nas pessoas que praticam mais exercício tendem a registar-se menos recorrências. "Até agora pensava-se que a ligação entre o exercício físico e o cancro era mediada por diferentes sistemas hormonais", referiu, em entrevista à edição impressa da Prevenir, na condição de coordenadora da Cirurgia da Mama da Unidade de Mama da Fundação Champalimaud, Maria João Cardoso, apontando um exemplo.

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"Um ano de atividade física moderada reduz os níveis de estrogénio e estradiol em mulheres pós menopausa conduzindo à redução do peso, com menos tecido adiposo e menos estrogénios circulantes. No entanto, outros mecanismos não hormonais parecem ser suportados por vários estudos, como a inflamação, a função imunitária, o stresse oxidativo e, no caso do cancro do cólon, a melhoria do trânsito intestinal. Alguns deles poderiam explicar por que é que a prática do exercício está mais associada à redução do tipo de cancro da mama com recetores hormonais negativos do que do com recetores hormonais positivos", realça a especialista.

"Mas, para muitos cancros, como por exemplo o cancro do esófago, um dos que apresentou maior redução com a prática de exercício, a relação causa efeito permanece desconhecida", sublinhou, contudo, na altura, a investigadora da Fundação Champalimaud, o principal centro de investigação e tratamento de cancro da capital, uma das unidades mais reconhecidas na Europa. Apesar de ainda não serem conhecidos os resultados de estudos em curso, não há dúvidas de que o desporto faz bem.

Para a fundadora do Centro Mama Help, a prática de exercício físico deve ser recomendada. "Já é e não só para as pessoas com antecedentes familiares de cancro, mas para todas", refere. O estilo de vida tem uma importância inegável para a saúde, "pelo aspeto objetivo da redução da incidência de cancro especificamente neste estudo e noutros prévios, mas também e, sobretudo, porque o exercício físico está associado à diminuição de mortalidade por todas as causas", realça a especialista.

Segundo Maria João Cardoso, "pessoas que tenham uma doença, o cancro ou outra, e que decidem alterar o seu estilo de vida, através da prática de exercício e de outras estratégias, estão a decidir ser os timoneiros da sua saúde. Isso é o mais importante", afiança a especialista. As conclusões desta investigação podem e devem ser alargadas a toda a população, garante o coordenador da equipa norte-americana que desenvolveu o trabalho científico que defende a atividade física.

"O nosso estudo não incide especificamente na atividade física de pessoas com história familiar de cancro, mas parece altamente provável que os benefícios da atividade física sejam semelhantes neste tal como noutros grupos", refere ainda. A próxima etapa, adianta Steven Moore, passa pela "realização de estudos que permitam definir com mais exatidão o tipo, intensidade e quantidade de atividade física necessária para reduzir o risco de desenvolver cancro", revela.

Números que dão que pensar

Cerca de 31% da população mundial não pratica exercício regularmente, como recomendado pela generalidade dos especialistas mundiais. 150 minutos de exercício por semana é a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) para um adulto. Caminhada ou ciclismo são opções que pode fazer ao longo da semana, por períodos mínimos de 10 minutos, a combinar com exercícios localizados nos principais grupos musculares. Em alternativa recomenda-se pelo menos 75 minutos de atividade intensa semanal.

Texto: Manuela Vasconcelos com Maria João Cardoso (coordenadora da unidade de Cirurgia da Mama da Unidade de Mama da Fundação Champalimaud e presidente do Centro Mama Help) e Steven Moore (investigador em epidemiologia oncológica no National Cancer Institute nos EUA)