Existe um forte motivo biológico subjacente ao fenómeno de não conseguirmos ceder à tentação de comermos aquilo que gostamos. Logo fazê-lo não é um sinal de fraqueza ou desleixo de prevaricador.

À semelhança de outras funções vitais, tais como respirar, o instinto e vontade de comer é uma função muito bem controlada por mecanismos que a todo o custo almejam prevenir qualquer falha de transmissão da informação que conduza à perda do apetite. Dito isto, nada mais normal do que o deleite perante uma mesa apetitosa.

A verdade é que as gerações de hoje descendem de gerações que sobreviveram a longos períodos de fome. Como tal, a maioria da população dos dias de hoje herdou os genes "poupadores" destes seus ancestrais.

Porém, em tempos de abundância de oferta e mesa farta, uma característica que no passado foi uma vantagem é hoje uma ameaça, já que a insatisfação permanente com a quantidade de alimentos ingeridos conduz à acumulação excessiva de gordura, excesso de peso e obesidade.

60% da população tem excesso de peso

Em Portugal, a prevalência de obesidade é atualmente de 22,3%, enquanto o somatório das prevalências de pré-obesidade e obesidade é de 60%, segundo os números revelados num estudo publicado no final de novembro de 2017. Como se esta grandeza não bastasse, estes números denunciam ainda tratar-se de um problema em franco crescimento, uma vez que as prevalências são superiores às divulgadas pelo Eurostat em outubro de 2016 relativas a 2014.

Contrariamente ao que vulgarmente se possa pensar, o excesso de gordura não é um mero problema de estético resultante do desleixo com o estilo de vida. A acumulação excessiva de gordura é uma doença crónica chamada obesidade e que está na origem das doenças que representam as maiores causas de mortalidade dos nossos tempos.

A obesidade está associada a uma panóplia de complicações, como a diabetes, doenças cardiovasculares, apneia do sono e mesmo vários tipos de cancro. Como a maioria das doenças associadas à obesidade são preveníeis, tratáveis ou mesmo reversíveis com a perda de peso vale a pena investir para reverter a tendência dos tempos modernos.

Nas últimas décadas, os avanços da investigação científica permitiram conhecer melhor os mecanismos que regulam o apetite e a saciedade, sabendo-se que são maioritariamente controlados por hormonas. Os indivíduos obesos não só têm níveis de hormonas que controlam o apetite diferentes das pessoas com peso normal como após as refeições libertam níveis menores de hormonas que induzem saciedade, o que pode levar ao aumento da ingestão de alimentos.

Tratamento limitado

Uma vez que a regulação do apetite é importante para manter um peso corporal saudável, foram desenvolvidas substâncias semelhantes às hormonas que diminuem o apetite, que constituem atualmente um tratamento inovador e seguro para a obesidade. No entanto, uma vez que estes compostos ainda não são comparticipados, por motivos económicos o acesso alargado ao tratamento é ainda limitado.

A obesidade, apesar de ser um problema de saúde pública bem reconhecido, é ainda uma doença subdiagnosticada, subvalorizada e subtratada. Subdiagnosticada por não ser reconhecida de um modo generalizado pela sociedade como doença, subvalorizada por não ser dado o devido valor às suas potenciais consequências de modo a prevenir danos para a saúde e subtratada pela não instituição de intervenções adequadas a um problema crónico permitam a redução do peso e sua manutenção a longo prazo, seja com intervenções no estilo de vida, tratamento farmacológico ou intervenção cirúrgica dependendo da gravidade e condição de cada doente.

Um artigo de Mariana P. Monteiro, médica endocrinologista, professora, diretora e investigadora da Unidade Multidisciplinar de Investigação Biomédica do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) da Universidade do Porto.

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