Pode-se encarar os fatores de risco dos cancros do sistema digestivo sob duas perspetivas. Uma, os fatores de risco para o seu aparecimento, a segunda, os fatores de risco para que este tipo de cancro não seja superado. Na primeira destas perspetivas podem-se enunciar os principais fatores que aumentam o risco de desenvolver algum dos tipos de cancro digestivo:
- Cancro da cavidade oral e esófago: Consumo de tabaco e álcool; infecção pelo Vírus do Papiloma Humano (HPV) - este último está atualmente em avaliação para determinar o seu real impacto
- Cancro da junção gastro-esofágica: Refluxo gastro-esofágico e Esófago de Barrett
- Cancro do estômago: Consumo de carnes fumadas; Infeção por Helicobacter Pilorii (algumas estirpes desta bactéria)
- Cancro do pâncreas: Consumo de tabaco; Obesidade e Diabetes Mellitus: Pancreatite Crónica
- Cancro colorretal: Obesidade; Pólipos do cólon; Síndromas familiares (Polipose Adenomatosa Familiar, Síndrome De Lynch; entre outros)
- Cancro do canal anal: Infeção pelo Vírus do Papiloma Humano (HPV)
Mais fatores de risco existem mas, na generalidade, por serem mais raros têm menor relevância no valor global da incidência destes tumores.
Salienta-se que, em Portugal e para a população em geral, só se justifica fazer rastreio destas doenças no caso do cancro colorretal. Entende-se por rastreio, a deteção de uma neoplasia em pessoas sem sintomas. Existem no entanto alguns grupos de risco acrescido para uma dada, ou várias, neoplasias para os quais um programa de rastreio está indicado e, até, com critérios mais rigorosos do que para a população em geral. No caso do cancro colorretal, o rastreio com colonoscopia e eventual remoção dos pólipos encontrados, tem impacto na taxa de incidência desta doença.
O importância do estadio e do tratamento
A outra perspetiva anteriormente enunciada prende-se com os fatores de risco que, estando a doença diagnosticada, podem contribuir para piores resultados, culminando na morte do doente. Neste contexto, assumem particular importância dois aspetos em larga medida determinantes do resultado final. A fase em que a doença se encontra quando é detetada e a qualidade do tratamento que é prestado ao doente.
A fase, ou estadio, em que a doença se encontra quando é diagnosticada representa o principal fator de prognóstico nestas doenças. Quando esta se encontra numa fase inicial, e para o conjunto dos cancros digestivos, a maioria dos doentes pode ser curada. Obviamente, existem diferenças dos resultados obtidos consoante o tipo de tumor que seja considerado, sendo exceção àquela regra os cancros do esófago e pâncreas que apresentam piores resultados que os restantes. Mas, na generalidade, aquela afirmação é verdadeira.
Ao invés, quando estas doenças se encontram disseminadas, os resultados terapêuticos são muito maus conduzindo geralmente à morte. Também nesta situação existem exceções, caso de algumas formas de cancro colorretal metastizado, em que a possibilidade de cura é real. Atualmente, nalguns destes tumores com metásteses no fígado ou pulmão, a cura pode ser atingível.
O segundo fator que contribui para o resultado final é a qualidade do tratamento prestado ao doente. Desde logo, o tempo de espera para iniciar a terapêutica. Este tipo de doenças não espera e continua a evoluir até ser tratada. Esta premência não se mede em horas ou dias, mas o começo atempado da terapêutica é importante.
Outro aspeto determinante do resultado final é a qualidade intrínseca do tratamento prestado. Esta é condicionada por vários aspetos que contribuem para um plano terapêutico optimizado. Salienta-se a abordagem multidisciplinar, a experiência das equipas e, com grande relevância, a qualidade do tratamento cirúrgico. Existem vários estudos científicos que demonstram que a qualidade da cirurgia realizada para o tratamento destes tumores tem um enorme impacto na sobrevivência dos doentes e no desenvolvimento de recidivas. Mais, sabe-se que o fator “cirurgião”, aquele que faz intervenção cirúrgica, é determinante no prognóstico de vários destes tumores.
Assim, existe uma palavra de esperança para os doentes com cancro digestivo. Em Portugal o rastreio do cancro colorretal deve ser feito a partir dos 50 anos pois reduzirá a possibilidade desta doença se desenvolver. Para os outros tumores, a deteção atempada implicará que muitos podem ser curados. Este resultado dependerá da fase em que a doença é detetada e da qualidade do tratamento prestado.
As explicações são do médico José Crespo Mendes de Almeida, responsável da Cirurgia Oncológica e Coordenador da Unidade de Digestivo Alto do Instituto CUF de Oncologia.
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