“É possível ajudar estas pessoas numa dimensão muito maior, muito mais numerosa do que tem sido até agora”, afirma em entrevista à agência Lusa o autor do livro “Reféns das próprias emoções - Um retrato íntimo das pessoas com personalidade ‘borderline’”.
João Carlos Melo diz que é importante transmitir uma “palavra de esperança” a estes doentes de que podem melhorar e, por isso, “é importante que haja tratamento para todas estas pessoas”.
Para o psiquiatra, é “inaceitável” que exista “uma doença tão mal conhecida, tão mal diagnosticada e tão maltratada”.
“Um dos maiores desafios que a psiquiatria terá de abraçar é o de encarar de frente e com coragem o grande problema que constitui a perturbação ‘borderline’”, afirma no livro o diretor do Hospital de Dia de Psiquiatria do Hospital Fernando Fonseca (Amadora-Sintra).
Tal passa por identificar melhor a doença e as pessoas afetadas por ela. “Fazendo estimativas por baixo, podemos admitir que existam em Portugal 200 mil pessoas com a doença. E se considerarmos que ela acaba por afetar todas aquelas com quem a pessoa se relaciona em privado, podemos aceitar que, direta e indiretamente, são afetados quase um milhão de portugueses. É muito”.
Por outro lado, apontou João Carlos Melo, não há muitos profissionais a dedicarem-se a estes doentes, o que faz com que sejam poucos os doentes que têm acesso a tratamentos tanto nos hospitais privados como públicos.
Até agora, os tratamentos disponíveis têm-se restringido aos poucos doentes que têm tido “a sorte” de poder ter acesso aos escassos programas terapêuticos que existem.
Mas há um problema que se prende com o facto de haver poucos psiquiatras com formação específica nesta área.
Para ultrapassar esta situação, João Carlos Melo defende a criação de programas específicos que pudessem ser postos em prática “por técnicos que, embora competentes e dedicados, não tivessem de ter uma formação diferenciada, dispendiosa e pouco acessível”.
“O comportamento e o quadro clínico é muito variável de pessoa para pessoa e há muitas pessoas que foram diagnosticadas com outras doenças como depressão, doença bipolar, déficit de atenção com hiperatividade, toxicodependência, alcoolismo etc”, diz à Lusa.
Também são diagnosticadas com crises de pânico, de ansiedade, ansiedade social, ansiedade generalizada e o diagnóstico médico fica por aí, lamenta.
Há também muitos doentes que são diagnosticadas pela opinião pública como tendo “mau feitio” e há outras situações que estão nas classificações oficiais e que se designam por ‘quiet bolrdeline’.
“São pessoas que não exteriorizam o sofrimento, mas sofrem muito em silêncio e há pessoas que têm comportamentos autolesivos, crises de grande desespero e de grande raiva, mas viram isso tudo para dentro, de tal modo, que as pessoas próximas nem se apercebem disso”, descreveu.
João Carlos Melo salienta a importância de ter “uma atitude de compreensão” para com estas pessoas.
“Isto já é um ponto muito importante porque aquilo provoca muitas vezes reações, mais negativas, é as pessoas se sentirem incompreendidas”, rematou.
Como há poucos psiquiatras com formação psicoterapêutica limitam-se muitas vezes a prescrever medicamentos, uma situação que pode ser sentida pelo doente como uma rejeição.
“Este médico não me quer ouvir, o que quer é despachar-me com medicamentos e isto aumenta a irritação da pessoa e, portanto, há todas estas razões que levam a que haja ideias preconceituosas, mal-entendidos e estigma dos próprios técnicos de saúde mental em relação a estas pessoas”, salientou o médico.
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