"A obesidade é uma doença crónica e uma condição multifatorial, ou seja, determinada por fatores que vão desde a genética a características da própria criança e família", descreve Paula Vilariça, médica pedopsiquiatra no hospital Dona Estefânia e convidada do quinto episódio do Podcast "O importante é ter saúde" do SAPO Lifestyle.
"Obviamente as crianças não têm culpa de ter obesidade", acrescenta. "A criança está inserida num núcleo familiar e é alimentada por adultos até poder fazer as suas escolhas e mesmo essas escolhas são determinadas pela influência que os adultos tiveram no desenvolvimento. Há muitos fatores que ultrapassam a possível culpa da criança", explica a especialista.
"Não gosto da palavra culpa. A culpa atribui um cariz moral e pesado a tudo", diz ainda, para referir que existe, no entanto, "responsabilidade parental e social" na doença.
"O impacto da obesidade na vida social das pessoas é determinada por muitas influências que ultrapassam as próprias famílias. Mesmo as famílias são influenciadas também pelo seu contexto mais alargado, portanto é como se fosse uma grande cadeia de fatores a contribuir para a mesma finalidade", reitera no Podcast conduzido pelo jornalista Nuno de Noronha.
"Realmente 30% das crianças são obesas, o que é uma vitória face à realidade de há uns anos, mas a obesidade aumenta com a idade. Nos adolescentes os números são bastante superiores", adverte a pedopsiquiatra que sublinha que a prevalência desta doença vai aumentando com a idade.
Para a pediatra Joana Martins, "o culto do paladar" é um fator extremamente importante na luta contra a obesidade. "Portugal não está sozinho nos seus níveis de obesidade. A obesidade não afeta somente uma fração da população ou meia dúzia de países. O culto do paladar é algo transversal à sociedade e diz respeito ao consumo de sal e ao consumo de açúcar. A forma como o açúcar é percepcionado no nosso cérebro funciona como uma forma de recompensa simples e imediata", frisa a especialista.
"A necessidade do sabor açucarado tem sido largamente explorada pelos produtos que se vendem", adverte a médica que sublinha a importância de fazer escolhas alimentares adequadas na hora de ir ao supermercado.
"O bebé quando nasce tem uma apetência natural para o sabor doce, e o leite materno é doce dentro daquilo que é natural. Esta apetência tem que ver com um fator protetor no ser humano. O ser humano há milhares de anos atrás distinguia uma planta que lhe fazia bem de uma planta venenosa através do sabor amargo. Nós aprendemos a reconhecer o sabor amargo como um potencial veneno, logo, como comparação óbvia, o doce é seguro", indica a pediatra para acrescentar logo a seguir: "o problema foi o mercado".
"Hoje temos supermercados cheios de produtos confecionados feitos com o açúcar todo para cativar o paladar e responder às necessidades de segurança", critica a especialista. "As pessoas não são fracas moralmente nem têm falta de vontade. É difícil vencer isto. Não há alternativas saudáveis na maior parte dos espaços", afirma.
"Não é fácil tratar e não é fácil viver com obesidade, especialmente nos seus graus mais elevados", salienta, por outro lado, Paula Vilariça. "A obesidade é uma doença crónica e esta marca metabólica fica para sempre", adverte Joana Martins.
"É preciso prevenir e a única maneira é desculpabilizarmos a obesidade e deixarmos de colocar o ónus nas pessoas. Temos que ter leis rigorosas que impeçam a venda de determinados produtos super açucarados", defende a pediatra.
"Temos de contribuir para a literacia da população para compreender os rótulos [dos produtos alimentares] e para escolher de forma sistemática alimentos que não são processados", sugere a mesma médica.
O jornalista Nuno de Noronha falou ainda com as convidadas sobre os riscos da obesidade para a saúde mental, a importância dos 1.000 dias da alimentação da criança e a influência da gravidez no desenvolvimento do bebé. Fique ainda a conhecer alguns conselhos para combater o excesso de peso na infância.
O quinto episódio do Podcast "O importante é ter saúde" do SAPO Lifestyle, sobre "Obesidade infantil", pode ser ouvido no Spotify.
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