As mulheres têm mais probabilidades de recair durante o tratamento de dependência de álcool, assim como quem consome há mais de 20 anos, revela o estudo hoje premiado pela Sociedade de Ciências Médicas de Lisboa.

“Há doentes que quando entram em tratamento têm mais sucesso do que outros”, contou à agência Lusa o investigador Pedro Aguiar, explicando que o estudo que coordenou tentou perceber quais as “características” que fazem como que algumas pessoas consigam resistir ao vício.

Os investigadores estudaram o perfil do doente no momento em que é admitido para tratamento e avaliaram, ainda, um conjunto de fatores durante o tratamento.

Na primeira fase foram analisados fatores socioeconómicos (como o sexo, idade ou estado civil), o consumo de outras substâncias aditivas, a quantidade de álcool que bebiam antes do tratamento e de que forma a bebida afetava as suas vidas (no que toca à saúde física, mental, consequências sociais, familiares e profissionais).

Os resultados do estudo vieram mostrar que “as mulheres têm um prognóstico mais desfavorável, assim como os doentes com um nível socioeconómico mais baixo. Já os doentes empregados a tempo inteiro apresentam um prognóstico mais favorável”, resumiu o coordenador do estudo, apontando o trabalho como um “fator protetor”.

O sucesso da recuperação aumenta consoante os anos de dependência: “Quanto mais tempo há de consumo o prognóstico é melhor, porque os doentes vão ficando mais velhos e querem recuperar”, explicou o investigador da Escola Nacional de Saúde Pública, da Universidade Nova de Lisboa.

Mas, a partir dos 20 anos de adição, a situação inverte-se: “Daqui para a frente, a situação é sempre pior”, sublinhou.

Quem consome logo de manhã e até à hora de almoço é mais capaz de resistir ao vício. Já as pessoas com mais problemas na sua vida acabavam por ter mais dificuldade em ter sucesso nos tratamentos.

Na análise ao tratamento, foram comparados os efeitos de dois fármacos, o efeito do número de consultas efetuadas, a participação do corresponsável nas consultas e se o doentes que tomavam fármacos para tratar depressões e ansiedades eram mais vulneráveis.

Os doentes que fizeram tratamentos durante menos de 120 dias tiveram resultados muito pouco satisfatórios, independentemente do fármaco que estavam a tomar (“Dissulfiram” e “Acamprosato”).

“Quem suspendia passados dois meses do início do tratamento acabava por ter maiores hipóteses de recaída. Já com cinco meses, havia grandes sinais de sucesso”, recordou, explicando que quem tomou Dissulfiram teve melhores resultados, apesar de este “fármaco funcionar melhor com a supervisão de um corresponsável, que normalmente é um familiar ou amigo próximo”.

Pedro Aguiar sublinha contudo que os resultados comparativos dos dois fármacos não são um ensaio clínico. Independentemente do fármaco usado, certo é que o número de consultas reflete-se nos resultados: quantas mais consultas maiores são as hipóteses de ser bem sucedido no tratamento.

Pedro Aguiar sublinhou ainda que todos os doentes que deixaram de aparecer nas consultas durante o tratamento foram considerados como casos em que houve recaídas.

Curioso é o facto de quem entra em tratamento com menos dias de abstinência (até uma semana) apresenta melhores resultados.

Os doentes analisados eram 84% homens, com idade mediana de 41 anos, com um consumo mediano de 192 gramas/dia e uma duração mediana de consumo pesado de 13 anos. Mais de metade (61%) dos doentes pertenciam a níveis socioeconómicos mais baixos.

O trabalho – “Prognostic factors of outpatient treatment on alcohol dependent patients: cohort study with six months of treatment follow-up” - é hoje galardoado com o Prémio Sociedade de Ciências Médicas de Lisboa em Epidemiologia Clínica.

26 de junho de 2012

@Lusa