Em declarações à Lusa e ao Público, Adão Silva foi questionado sobre a iniciativa que tem como primeiro subscritor o ex-líder da JSD Pedro Rodrigues, e que manifestou na terça-feira à noite à Lusa intenção de avançar com uma resolução a propor um referendo sobre a despenalização da eutanásia.
“A questão de referendo não é uma questão de consciência, é uma questão política, tem de ser decidida pelos órgãos políticos do PSD, neste caso a direção política, não é o grupo parlamentar ou deputados que o podem fazer”, defendeu, pelo contrário, Adão Silva, primeiro vice-presidente da bancada do PSD.
Adão Silva considerou “completamente inaceitável” que uma iniciativa deste tipo surja de “um deputado ou grupo de deputados” sem que seja articulada com a direção, e manifestou mesmo dúvidas de que se venha a concretizar num projeto de resolução a pedir um referendo. “Se der entrada, não será agendada porque a direção do grupo parlamentar não estaria avalizada pela direção política para a agendar em conferência de líderes, é um exercício inconsequente”, afirmou.
Questionado pela comunicação social sobre a mesma matéria após a conferência de líderes, Adão Silva assegurou que a iniciativa encabeçada por Pedro Rodrigues foi feita “à revelia” quer da direção da bancada, quer do partido.
“Para nós é completamente inoportuno o seu aparecimento, aquilo que é oportuno é criar condições de serenidade, de tranquilidade para que cada deputado, sendo dono da sua consciência, possa expressar a sua vontade. Convém que não haja exercícios que subvertam esta tranquilidade”, alertou.
Questionado se a liberdade de voto que haverá no PSD sobre os projetos que pedem a despenalização da eutanásia não se estende a um grupo de deputados que defende o referendo, Adão Silva reiterou o entendimento de que são duas matérias completamente diferentes.
“O presidente do PSD [Rui Rio] deixou muito claro na reunião do grupo parlamentar que uma questão era matéria de consciência, que é a votação de amanhã, outra é matéria de referendo, que não é de consciência, mas política. São matérias completamente diferentes e que não podem ser postas em paralelo”, defendeu.
Por essa razão, no debate de quinta-feira, o PSD terá quatro deputados a intervir (dois homens e duas mulheres), nenhum da direção, em que dois serão pelo ‘sim’ e dois defenderão o ‘não’. Adão Silva reafirmou que, neste momento, a questão do referendo “não se coloca mesmo” e pediu aos deputados do PSD “serenidade e máxima consciência” no debate e votações de quinta-feira.
Pedro Rodrigues disse na quarta-feira à Lusa contar já com o apoio de vários deputados da bancada, entre os quais os líderes das distritais de Porto, Coimbra, Viseu e do ex-líder da distrital de Lisboa Pedro Pinto, e manifestou a intenção de avançar com o projeto de resolução nos próximos dias.
Para resultar num referendo, a resolução teria de ser agendada e de ser aprovada em plenário da Assembleia da República.
A Assembleia da República debate e vota na quinta-feira os cinco projetos de lei para a despenalização da morte assistida - BE, PS, PAN, PEV e Iniciativa Liberal - que preveem essa possibilidade, mas sob diversas condições.
Em curso, está já a recolha de assinaturas por um grupo de cidadãos para a realização de um referendo sobre a matéria, que tem o apoio da Igreja Católica. Dos partidos com representação parlamentar, apenas o CDS-PP e o Chega apoiam a ideia, assim como de várias figuras do PSD, incluindo ex-líderes como Cavaco Silva, Manuela Ferreira Leite ou Pedro Passos Coelho.
Quando resulta de iniciativa popular, a proposta de referendo tem de ser subscrita por um mínimo de 60.000 cidadãos eleitores portugueses, regularmente recenseados no território nacional.
A Ordem dos Médicos já se manifestou contra a morte medicamente assistida, porque os médicos "estão preparados para salvar vidas".
No entanto, inquéritos demonstram que os clínicos estão divididos.
Conselho de ética desfavorável
O Conselho Nacional de Ética considera que "o pedido de alguém para morrer" deve ser entendido como "pedido de ajuda", compreensível no plano humano, e não algo que motive uma resposta jurídica que consagre a morte a pedido. Esta ideia consta das conclusões do parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV) que é desfavorável ao projeto-lei do PS de alteração ao Código Penal, regulando as condições especiais para a prática da eutanásia não punível.
O parecer alerta que a possibilidade de a morte ser executada em alguém a seu pedido, em circunstâncias clínicas muito precisas e tomada como uma afirmação de vontade própria, criando assim uma nova moldura jurídica, não beneficiou de "estudos prévios que pudessem auxiliar a sua clarificação e sustentação".
O parecer defende ainda que o "pedido de alguém para morrer deve em primeiro lugar ser entendido como um pedido de ajuda, justificado no sofrimento e com significados complexos (medo, perda de controlo, solidão, sentimento de `fardo´, dor física insuportável) que exigem adequada compreensão, devendo ser abordados num plano humano e solidário e não secundarizados por uma resposta jurídica que consagre a morte a pedido".
Relativamente aos efeitos e impacto da decisão proposta pelo PS, o Conselho Nacional de Ética alerta que o procedimento legislativo proposto para autorizar e executar a morte a pedido "desconhece quantos profissionais estarão disponíveis para concretizar um conjunto vasto de responsabilidades (processo médico-administrativo, realização material do ato de eutanásia, prescrição de fármacos letais para o doente se suicidar)".
No presente - lembra o Conselho Nacional de Ética - estes atos estão excluídos da praxis médica e da lei que a regula uma vez que executar a morte não é "um ato da profissão". O mesmo ocorre na eventual participação dos enfermeiros e farmacêuticos em alguns daqueles atos, acrescenta o parecer.
O parecer desfavorável adverte igualmente que no diploma do PS é "imprecisa a relação de todos os intervenientes (médicos, enfermeiros, farmacêuticos) com o Sistema Nacional de Saúde (SNS) e com as estruturas do SNS, nomeadamente com o que possa colidir com o escopo das suas competências, quando o projeto lei lhes "comete novas tarefas e responsabilidades (organizar as condições logísticas para concluir o processo de morte).
Ao pronunciar-se desfavoravelmente, o Conselho de Ética alega também que se desconhecem os encargos organizacionais e financeiros que o diploma do PS acarretará para o SNS "ao acrescentar a prestação de novos serviços e adicionar novas exigências em recursos físicos e humanos", os quais poderão, em contrapartida, vir a "empobrecer a oferta de apoio clínico, psicológico e social em contexto de fim de vida".
O Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida deu ainda "parecer ético desfavorável" a três outros projetos de lei para a despenalização da morte medicamente assistida que vão ser debatidos no parlamento na quinta-feira.
Os pareceres negativos, aprovados por maioria, incidiram sobre os diplomas do PS, BE, PAN e PEV, e foram divulgados no ‘site’ do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, com a data de segunda-feira, 17 de fevereiro.
Notícia atualizada às 13h57
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