Em declarações à Lusa, Fausto Pinto, reagiu com desagrado às ideias expressas por Manuel Heitor numa entrevista ao Diário de Notícias, na qual o ministro manifestou a expectativa de ter novos cursos de medicina nas universidades de Aveiro, Vila Real e Évora dentro dos próximos dois anos.

“A formação médica em Portugal não passa por novas escolas ou aumento de vagas, porque isso não vai contribuir em nada para resolver o problema da suposta falta de médicos”, afirmou o ex-líder do CEMP, sublinhando: “Só podemos compreender como algum desconhecimento sobre aquilo que é a educação médica e serem mais afirmações de caráter político do que relacionadas com a formação médica ou a melhoria dos cuidados de saúde”.

Fausto Pinto referiu que a medicina é hoje “uma das áreas mais dinâmicas no ensino” nacional e refutou a necessidade de diversificação da oferta expressa pelo MCTES.

“Ensinar medicina não é o mesmo que matemática e se calhar é isso que o ministro não entende”, disse, realçando ainda a existência de regras para este processo e uma aparente “pressão política” sobre a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES).

Hospital Santa Maria inaugura hoje maior unidade de cuidados intensivos do país
Hospital Santa Maria inaugura hoje maior unidade de cuidados intensivos do país Fausto Pinto, médico cardiologista créditos: JOÃO RELVAS/LUSA

“Estranhamos haver uma afirmação destas que antecede qualquer decisão pela agência reguladora, que é quem faz a acreditação dos cursos em Portugal, e isso já tinha acontecido com a criação do curso na Universidade Católica. Significa, enfim, alguma pressão política nesse sentido e a leitura que fazemos é uma leitura política completamente desenquadrada da realidade do que é o ensino médico em qualquer país e em Portugal”, frisou.

Por outro lado, o diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa considerou um “mito” a falta de médicos em Portugal, identificando como principal problema “uma má gestão dos recursos humanos”. Ademais, Fausto Pinto defendeu que a aposta deveria passar pelo reforço das atuais faculdades de medicina e pelo aumento da sua competitividade e capacidade de atração.

“Se é para contribuir para o empobrecimento do ensino de medicina e para aumentar a oferta de médicos para depois serem explorados por empresas médicas e serem mão de obra barata, então que se diga isso e seja essa a opção política que será depois sufragada”, vincou, sem deixar de considerar que a posição de Manuel Heitor está apenas baseada em “princípios ideológicos” e que não contribui para uma “discussão séria” sobre a formação em medicina.

Reivindicando “autoridade moral e científica e o conhecimento da realidade no terreno”, Fausto Pinto manifestou também a esperança de que este objetivo do ministro não avance, por entender que “não há massa crítica suficiente” para a sua concretização.

“Se, de facto, avançar neste sentido, vai ser mais um erro de ‘casting’ e de decisão e as consequências que vai ter é eventualmente agradar a alguns autarcas locais, que vão ter mais estudantes e poder dizer que têm ensino universitário na região, mas para uma evolução do ensino da medicina em Portugal… por favor, não brinquem connosco. Em vez de melhorar, é empobrecer. É um erro”, concluiu.

No ano passado, o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior já tinha referido que a manutenção das vagas para os cursos de medicina tornava clara a necessidade de disponibilizar o ensino desta área noutras instituições, públicas ou privadas.

Na entrevista de hoje, Manuel Heitor reafirmou também que são precisos mais médicos em Portugal e o alargamento da formação na saúde.

“O alargamento da capacidade de formação faz sentido se for feito juntamente com a diversificação da oferta. Isto foi algo que nas áreas das Engenharias, das Tecnologias e até das Ciências Sociais e da Economia já foi feito há muito tempo. Algumas áreas, mais por interesses corporativos, não diversificaram a oferta. Vê-se que nós em Portugal, por opção das próprias instituições e também das ordens profissionais, formamos todos os médicos da mesma forma”, referiu.