Adelaide Cabete (1867-1935), a médica que aos 18 anos ainda era analfabeta

Adelaide Cabete nasceu no concelhos de Elvas em 25 de janeiro de 1867. Era analfabeta quando casou aos 18 anos com Manuel Cabete, um sargento do exército, que a incentivou a instruir-se e a desenvolver a sua vertente feminista. Realizou o exame de instrução primária aos 22 anos, terminando o curso dos liceus com distinção. Em 1895, muda-se com o marido para Lisboa e, no ano seguinte, aos 29 anos, ingressou na Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa. Em 1900, já com 33 anos, terminou a licenciatura em medicina.

Segundo livro Príncipes da Medicina do pediatra e escritor Mário Cordeiro, Adelaide Cabete lutou desde cedo pelo livre acesso à saúde pública, bem como pela adoção de medidas profiláticas contra doenças infetocontagiosas. Foi professora universitária e uma importante feminista que ajudou a divulgar o papel da mulher em vários setores da sociedade portuguesa.

Reivindicou desde cedo a construção de uma maternidade pública, vindo a construir-se, em resultado da sua ação, a Maternidade Alfredo da Costa em Lisboa, no ano de 1932. Um ano depois, tornou-se na primeira e única mulher a votar em Luanda após a nova Constituição Portuguesa de 1933. De facto, em 1929, emigrou par Angola, descontente com a situação em Portugal, onde desempenhou um papel fundamental na promoção de cuidados de saúde junto de crianças e mulheres. Faleceu em Lisboa em 1935.

Domitila de Carvalho (1871-1966), a primeira licenciada em Matemática

Domitila Hormizinda Miranda de Carvalho nasceu em Santa Maria da Feira em 10 de abril de 1871. Foi uma médica, professora, escritora e política, sendo a primeira mulher a frequentar a Universidade de Coimbra, onde se licenciou em Matemática, Filosofia e Medicina. Quando se doutorou em Medicina, em 1904, com 16 valores, teve por madrinha a rainha D. Amélia de Orleães. Era monárquica e conservadora, destacando-se no seio da pequena elite feminina que apoiava o salazarismo. A sua condição de monárquica levou a que fosse a interlocutora entre Salazar e a ex-rainha D. Amélia de Orleães, com quem mantinha correspondência.

Domitila de Carvalho foi uma das primeiras três deputadas eleitas em Portugal ao integrar em 1934 a lista dos deputados escolhidos pela União Nacional para a I Legislatura da Assembleia Nacional.

Exerceu medicina em Lisboa, como médica na Assistência Nacional aos Tuberculosos, mas optou mais tarde por ingressar num lugar como professora efetiva no Liceu de D. Maria Pia, a primeira escola secundária criada em Portugal para o sexo feminino. Ao lecionar a disciplina de Matemática, coube a Domitila de Carvalho, que era a primeira mulher portuguesa licenciada em Matemática, tornar-se também na primeira mulher portuguesa a ser professora daquela disciplina. Morreu a 11 de novembro de 1966, na freguesia dos Prazeres, em Lisboa, aos 95 anos.

Carolina Beatriz Ângelo (1878-1911), a primeira cirurgiã portuguesa

Carolina Beatriz Ângelo nasceu a 16 de abril de 1878, na Guarda. Foi sempre uma aluna de excelência e completou a licenciatura na Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa. Em 1903, um ano depois de terminar o curso, apresentou uma dissertação intitulada Prolapsos Genitais (Apontamentos), iniciando a sua prática clínica como a primeira cirurgiã portuguesa, acabando por especializar-se nas áreas de Ginecologia e Obstetrícia.

Carolina Beatriz Ângelo foi ativista dos direitos humanos, em particular dos direitos da mulher. Na sequência da publicação, a 14 de março de 1911, da Primeira Lei Eleitoral do Regime Republicano, o legislador não mencionou a proibição do voto feminino. Previa esse direito a "todos os cidadãos", "com mais de 21 anos", "que soubessem ler e escrever" e que fossem "chefes de família".

Sendo viúva e mãe de filhos, Carolina Beatriz Ângelo invocou o seu direito ao voto em tribunal numa altura em que as mulheres sufragistas o tentavam também um pouco por todo o mundo. Um juiz concedeu-lho, tornando-se a primeira mulher recenseada e a primeira a votar em Portugal. Fê-lo em 28 de maio de 1911 nas eleições para a Assembleia Constituinte. Em 1913, a lei foi mudada e passou a ler-se nela que "são eleitores de cargos legislativos os cidadãos portugueses de sexo masculino".

A 3 de outubro de 1911, morre aos 33 anos de miocardite quando regressava a casa de uma reunião de mulheres feministas.

Matilde Bensaúde (1890-1969), a primeira bióloga investigadora portuguesa

Matilde Bensaúde concluiu os estudos secundários na Suíça em 1909. Ingressou no Ensino Superior em Lausanne, não terminando aí o curso e regressando a Portugal. Em 1913, matriculou-se na Faculdade de Ciências da Universidade de Paris-Sorbonne. Estudou Ciências Naturais, licenciando-se em 1916. Doutorou-se em 1918 com uma tese sobre a sexualidade dos basidiomicetos.

Em 1920, foi a única mulher entre os fundadores da Sociedade Portuguesa de Biologia. Em 1923, terminou nos Estados Unidos da América a sua especialização em Fitopatologia.

Estudou doenças e pragas de diversas culturas em Portugal. Trabalhou no Instituto de Investigação Científica Rocha Cabral, de Lisboa, onde se dedicou ao estudo das fuchsinas. Foi ainda a impulsionadora das primeiras legislações sobre a fitossanidade.

Branca Edmée Marques (1899-1986), a discípula de Marie Curie

Branca Edmée Marques é considera a discípula de Marie Curie, sendo a precursora do estudo da radioatividade em Portugal. Nasceu em Lisboa, em 14 de abril de 1899. Estudou nos liceus Maria Pia e Pedro Nunes. Terminou a licenciatura em Ciências Físico-Químicas em 1926 na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Partiu para França em 1931, onde fez investigação em Física Nuclear no Laboratório Curie. Em 1923-24, estagiou no Laboratório de Química Analítica no Instituto Superior Técnico sob orientação de Charles Lepierre. Obteve o doutoramento em 1935, na Universidade de Paris sob orientação de Marie Curie.

No ano seguinte, em Portugal, é lhe reconhecida a equiparação ao grau de doutor em Ciências Físico-Químicas das universidades nacionais e funda o primeiro Laboratório de Radioquímica no país, precursor do Centro de Estudos de Radioquímica, da Comissão de Estudos de Energia Nuclear do qual foi diretora.

Aos 65 anos, tornou-se a primeira mulher a obter a cátedra química numa faculdade de ciências em Portugal. Faleceu em Lisboa, em 19 de julho de 1986.

Sara Benoliel (1898-1970), a pediatra que queria as crianças ao ar livre

Sara Berchilon Benoliel nasceu em 1898, em Borba, no Amazonas, Brasil. Chegou a Portugal ainda antes de iniciar o ensino preparatório e aos 7 anos contraiu poliomielite. Foi nessa altura que teve os primeiros contactos com o mundo da medicina, algo que a marcou para sempre, inclusivamente na escolha da profissão.

Em 1924, criou um jardim-escola no Hospital D. Estefânia que depois, em 1930, recebeu o estatuto de escola oficial. Em 1925 formou-se em medicina pela Universidade de Lisboa. Especializou-se em pediatria na Alemanha, Áustria e França. Em 1928 nacionalizou-se portuguesa.

Nos Hospitais Civis de Lisboa, onde exerceu, dedicou-se à implementação da pediatria e desenvolveu um serviço domiciliário, com apoio alimentar para as famílias mais carenciadas. Percursora dos métodos Froebel e Montessori, Sara Benoliel insistiu sempre na ideia de que as crianças pudessem passar muito tempo ao ar livre e não fechadas entre quatro paredes. Publicou vários livros sobre medicina e pediatria e foi umas das primeiras mulheres a guiar um automóvel em Portugal. Sara Benoliel faleceu a 20 de dezembro de 1970, em Lisboa, com 72 anos. Está sepultada no cemitério israelita, perto do Jardim da Estrela, em Lisboa.

Cesina Bermudes (1908-2001), a primeira portuguesa doutorada em Medicina

Cesina Borges Adães Bermudes nasceu em Lisboa, a 20 de maio de 1908, na freguesia dos Anjos. Frequentou o Liceu Camões, sendo a única rapariga a terminar o ensino secundário numa turma de 15 rapazes. Licenciou-se em medicina em 1933 e em 1947 concluiu o doutoramento com 19 valores, o que fez dela a primeira mulher doutorada em Medicina em Portugal. Antes desse feito, foi assistente nas cadeiras de Anatomia e de Clínica Geral, especializando-se em obstetrícia.

O contacto com o contexto da mulher na sua prática clínica levou-a a aprofundar os seus ideais feministas. Opondo-se ao salazarismo, desenvolveu a sua consciência política e fez campanha por Norton de Matos. Esteve ainda ao lado de Maria Lamas e de Isabel Aboim Inglês, duas importantes ativistas, feministas e democratas.

Apesar de doutorada, o Estado Novo impediu-a de assumir o cargo de professora na Faculdade de Medicina de Lisboa. Em 1954, Cesina Bermudes partiu para Paris para estudar formas de atenuar a dor da mulher no parto. Consta que é a ela que se atribui a frase "gravidez não é doença". Faleceu aos 93 anos, em 2001.

Laura Ayres (1922-1992), a mãe do Inquérito Serológico Nacional

Laura Guilhermina Martins Ayres nasceu em Loulé, em 1 de junho de 1922. Licenciou-se em medicina, em 1945, pela Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. Foi médica interna dos Hospitais Civis de Lisboa, onde se dedicou à saúde pública, já que desde cedo demonstrou especial interesse pelas doenças transmissíveis. Foi no antigo Instituto Superior de Higiene (ISH), hoje Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, que estudou várias patologias respiratórias, nomeadamente os vírus da gripe.

Os seus estudos sobre o agente do tracoma, uma doença ocular altamente contagiosa, valeram-lhe o prémio Ricardo Jorge de Saúde Pública em 1963, o primeiro dos dois que recebeu. Laura Ayres coordenou o primeiro Inquérito Serológico Nacional para patologias de natureza infeciosas, nomeadamente as evitáveis pela vacinação, que lhe deu em 1983 o seu segundo prémio Ricardo Jorge. Este estudo permitiu traçar o perfil de 19 infeções prevalentes em Portugal.

Foi docente de Microbiologia Sanitária na Escola Nacional de Saúde Pública e uma das importantes vozes na luta contra o vírus da imunodeficiência humana (VIH).

Maria de Lourdes Pintasilgo (1930-2004), a única primeira-ministra de Portugal

Maria de Lourdes Ruivo da Silva de Matos Pintasilgo nasceu em Abrantes em 18 de janeiro de 1930. Foi uma engenheira química, dirigente eclesial e política portuguesa. Foi a única mulher que desempenhou o cargo de primeira-ministra em Portugal, tendo chefiado o V Governo Constitucional, em funções de julho de 1979 a janeiro de 1980. Foi a segunda mulher a desempenhar o cargo de primeira-ministra na Europa, dois meses depois da tomada de posse de Margaret Thatcher no Reino Unido.

Em 1940, ingressou no Liceu D. Filipa de Lencastre, terminando em 1947 o curso secundário como a melhor aluna da escola. Em 1953, com 23 anos, licenciou-se em Engenharia Químico-Industrial, pelo Instituto Superior Técnico de Lisboa, numa época em que poucas mulheres enveredavam pela área da engenharia. Entre 1952 e 1956, presidiu à Juventude Universitária Católica Feminina.

Iniciou a sua carreira profissional, em setembro de 1953, como investigadora na Junta de Energia Nuclear, na qualidade de bolseira do Instituto de Alta Cultura. Em julho de 1954, foi nomeada chefe de serviço no Departamento de Investigação e Desenvolvimento da Companhia União Fabril (CUF), que aceitou pela primeira vez uma mulher nos seus quadros técnicos superiores. Faleceu em Lisboa, aos 74 anos de idade, e repousa num modesto jazigo no Cemitério dos Prazeres.

Maria de Sousa (1939-2020), a mulher que pôs Portugal no mapa da imunologia

Maria de Sousa nasceu em Lisboa em 1939. Médica, cientista, escritora, professora universitária e investigadora, lecionou em Inglaterra, Escócia e Estados Unidos, depois de ter saído de Portugal ainda durante o Estado Novo, em 1964. Regressaria já no período democrático, em 1985, passando a professora catedrática de Imunologia do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS), no Porto.

Licenciou-se em Medicina em 1963 e doutorou-se em imunologia em 1972 na Universidade de Glasgow. Foi nos Estados Unidos que desenvolveu maioritariamente a sua carreira científica. Dirigiu o Laboratório de Ecologia Celular do prestigiado Memorial Sloan Kettering Cancer Center, em Nova Iorque. Foi nessa fase que se distinguiu internacionalmente enquanto autora de vários artigos científicos fundamentais para a definição da estrutura funcional dos órgãos que constituem o sistema imunológico, entre os quais o que consagrou a descoberta da área timo-dependente (1966), hoje conhecida universalmente por área T.

Maria de Sousa fundou em 1985 o Mestrado em Imunologia do ICBAS, que formou grandes nomes da ciência atual como a bióloga e cientista portuguesa Maria Manuel Mota, uma autoridade internacional nos estudos da malária.