Fevereiro, o mês mais curto do ano que celebra o amor no Dia dos Namorados e a folia no Carnaval. Igualmente conhecido como o período em que muitos constatam que as resoluções de ano novo, tão cuidadosamente estabelecidas na passagem de ano, desapareceram quase tão depressa como o momento em que se saboreavam as passas ao soar da meia-noite. Seja o compromisso de praticar mais exercício físico, dedicar-se à leitura ou deixar de fumar, é comum apercebermo-nos que, ao chegar fevereiro, a empolgação inicial diminuiu, dando lugar ao cansaço e à falta de vontade. Mas porque será assim tão desafiante manter as resoluções de ano novo?
De todos os atributos que diferenciam o ser humano dos restantes animais, possivelmente nenhum é tão importante como a sua capacidade de criar um propósito e de agir em conformidade com ele. Vejamos, então, o que é um propósito de vida ou, por outras palavras, um valor.
O que são valores?
Os valores constituem os desejos mais profundos do nosso coração, relativamente à forma como ambicionamos as nossas interações com o mundo, com os outros e connosco mesmos. Representam o tipo de pessoa que pretendemos ser, como nos comportamos, e as características e qualidades que queremos desenvolver. Não são coisas que possuímos tal como um telemóvel topo de gama ou uma cara bonita, mas sim direções de vida que escolhemos por lhe darem significado. Podem incluir ser um bom amigo; dar, partilhar e contribuir ou manter a saúde e a forma física.
São pessoais. Tal como não temos de justificar porque é que a nossa cor preferida é azul, amarelo ou qualquer outra, também não temos de dar explicações sobre os valores que escolhemos. O que é importante para si pode não ser importante para o seu parceiro/a, e o que é importante para os seus pais ou amigos/as pode não ser importante para si. Não há valores certos ou errados, bons ou maus.
São inatingíveis e duradouros. Isto é, não podem ser alcançados ou completados. Por exemplo, se a alimentação saudável for considerada um valor nunca será totalmente satisfeita ou permanentemente alcançada, mas sim procurada atingir continuamente, dia após dia.
Valores vs. Objetivos
De notar que um valor não é um objetivo. Um objetivo é algo que pode ser riscado de uma lista de coisas para fazer, ou seja, pode ser completo. Correr 10 quilómetros é um objetivo enquanto cuidar da saúde física através de exercício é um valor. Sentir felicidade é um objetivo emocional enquanto ser aberto e amigável com os outros é um valor.
Querer algo implica que esse algo está em falta. Desta forma, procurar ser feliz unicamente através do alcance de objetivos significa viver uma vida em que o que é importante está sempre ausente. Embora isso possa motivar uma pessoa e as suas ações, pode apoderar-se do seu sentido de vitalidade. Assim, é importante utilizar os objetivos apenas como um meio de se envolver num processo e de manter uma direção. Os objetivos são, portanto, ações tomadas ao serviço de um determinado valor.
Os valores são como uma bússola que orienta os barcos a atracar no porto certo. Sem ela, a navegação é possível, mas acaba por ser desprovida de rumo. Não é algo que exija a necessidade de consulta constante, mas está presente nos momentos cruciais, sempre que seja preciso orientar a rota, prevenindo o risco de naufrágio mesmo quando o mar se encontra extremamente agitado. Os valores fazem o mesmo para a viagem que é a nossa vida. Utilizamo-los para escolher a direção em que queremos avançar e para nos mantermos no caminho pretendido. Por sua vez, os objetivos são marcos que procuramos atingir ao longo da viagem. Fazer algumas paragens em vários portos ao longo da travessia marítima para explorar as cidades, por exemplo. Chegar ao destino final pode ser o grande objetivo, mas é possível que essas paragens tenham sido o que tornou a jornada realmente interessante.
Como definir valores?
Conceber os nossos valores é um trabalho árduo e, por vezes, moroso. Algumas questões que podem ser importantes nessa reflexão: Num mundo onde pudesse escolher uma direção para a sua vida, o que escolheria? E se ninguém soubesse, o que valorizaria? Isto é, imaginando que os seus pais, os seus filhos/as ou os seus amigos/as não saberiam das suas conquistas, continuariam a ser importantes para si?
Como ponto de partida pode ser útil pensar em objetivos concretos assim como direções de vida mais gerais, sonhos ou desejos. Os valores podem enquadrar-se em algumas áreas, tais como relações íntimas; relações familiares; relações sociais; emprego/carreira; desenvolvimento pessoal; cidadania; bem-estar físico, lazer e espiritualidade. Desta forma, é benéfico considerar o tipo de pessoa que gostaria de ser nessas diversas áreas e o que o cativa nelas, assim como a importância dada a cada uma. Após esta reflexão, é possível definir que objetivos (eventos atingíveis) e ações (passos concretos que podem ser tomados) manifestam os valores intencionados.
Viver de acordo com os valores dá-nos, fundamentalmente, um sentido inerente de propósito e vitalidade que faz do confronto com as dificuldades internas e externas um compromisso legítimo e honorável. Posto isto, talvez as resoluções de ano novo que escolheu não lhe façam tanto sentido agora que pensa nelas. Ou talvez façam ainda mais sentido. A essência reside na transformação dessas resoluções em ações e objetivos que estejam alinhados com os seus valores. Ao fazê-lo, aumenta consideravelmente a probabilidade de manter esse compromisso porque estará a agir com base no que é verdadeiramente importante para si, independentemente de ser difícil, aborrecido, trabalhoso ou até mesmo que não pareça o certo para as pessoas à sua volta. Fica, assim, o convite feito para pôr “mãos à obra” este mês e estabelecer resoluções mais significativas para si que se mantenham ao longo da sua vida!
Um artigo da psicóloga clínica Joana Francisco do PIN.
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