O “mal do século XXI”, nas palavras da Organização Mundial de Saúde, afeta também os mais novos. A depressão infantil é uma realidade e sintomas como a apatia, isolamento, tristeza, alterações do sono e do apetite, diminuição do rendimento escolar, entre outros, não devem ser descurados — mesmo na fase pré-escolar, aos três ou quatro anos. Não há uma idade mínima para chegar ao diagnóstico.

Estudos recentes apontam para que a depressão infantil seja mais frequente do que inicialmente se pensava: cerca de5% das crianças e adolescentes possuem um grau significativo de depressão. De acordo com a última versão do Manual de Diagnóstico e Estatística das Doenças Mentais (DSM-5), da Associação Americana de Psiquiatria, a depressão tem uma prevalência de 2 a 5% entre crianças e adolescentes.

A depressão infantil é uma perturbação psicológica associada a algum aspeto de comprometimento da personalidade da criança, tal como baixa autoestima e autoconfiança. Os principais comportamentos da criança com depressão infantil são:

  • Autodepreciação, tristeza, frustração, medos;
  • Perda da energia habitual, diminuição do apetite e redução de peso;
  • Hiperatividade, agressividade e irritabilidade;
  • Alterações do sono;
  • Alterações do apetite, seja diminuição ou aumento marcados;
  • Diminuição da socialização;
  • Atitude negativa em relação à escola e baixo rendimento escolar.
  • Baixa autoestima e constantes sentimentos de culpa;
  • Extrema sensibilidade à rejeição e ao fracasso;
  • Fadiga, falta de energia;
  • Apatia, perda de interesse nas brincadeiras ou atividades que anteriormente a entusiasmavam;
  • Queixas somáticas;
  • Agitação psicomotora;
  • Entre outras.

Estão também associados sintomas somáticos como enurese/encoprese, dores de barriga e diarreia, dores de cabeça, vómitos, além de condutas socialmente menos adequadas. No entanto, há que referir que os sintomas da depressão na infância variam de acordo com a idade.

Até os 7 anos, as crianças, não apresentam competências verbais para expressar os seus sentimentos, desta forma, o diagnóstico de sintomas depressivos torna-se mais difícil nesta faixa etária. Assim, é necessário ter em especial atenção a comunicação não-verbal, a expressão facial, os desenhos e a postura corporal da criança. Deste modo, pais, educadores e professores devem estar atentos aos comportamentos da criança, sendo o baixo rendimento escolar um dos primeiros sinais do surgimento de um possível quadro depressivo. Os pais poderão identificar problemas no repertório comportamental da criança, variando desde extrema irritabilidade à obediência excessiva, ocorrendo ainda uma instabilidade significativa em relação a esses comportamentos.

Quanto mais problemas de comportamento a criança apresentar, maior será a probabilidade de um desenvolvimento atípico, visto que a depressão interfere nas atividades associadas à cognição e à emoção. A deteção precoce de sintomas depressivos em crianças evita que venham a desenvolver quadros graves, com prejuízos no convívio social e no ambiente escolar e familiar.

Mas ela ainda é tão pequenina ainda não sabe o que é vida e já tem depressão?

A depressão infantil pode surgir na sequência de uma situação traumática ou um acontecimento sentido pela criança como traumático, como por exemplo uma separação, abandono, doença ou morte de alguém próximo, uma mudança de escola, são apenas alguns exemplos. No entanto por norma há uma situação, ou várias, que se relacionam.

Nem sempre existe um acontecimento único identificável, a causa da depressão infantil pode ser multifatorial. Alguns estudos sugerem que a genética possa ter alguma influência na propensão para o seu desenvolvimento. As crianças nascem com um património genético, mas depois estabelecem relações numa família, na escola e pode ou não experienciar acontecimentos de vida traumáticos. Para o desenvolvimento de um quadro depressivo, o meio ambiente é, por esse motivo, determinante. Um historial familiar depressivo pode, ser um sinal de alarme, pela importância dos aspetos relacionais e por poder significar uma situação vivida como negativa pela criança.

Como ajudar estas crianças?

As crianças têm maior dificuldade em exprimir verbalmente o que sentem e não existem sintomas exclusivos da depressão infantil, pelo que muitas vezes, não é fácil chegar ao diagnóstico. Pelo que no início, ocorre muitas vezes a incompreensão do que se está a passar com a criança, por parte dos pais e dos professores, não têm a clara perceção do problema, daí a extrema importância da procura de ajuda profissional.

Além da observação e avaliação dos sintomas verificados, atendendo à sua duração, frequência e intensidade, é importante ouvir os pais e outros cuidadores, perceber se a criança teve alguma experiência vivida como traumática e se em causa estão problemas relacionais, entre outros.

Na maioria dos casos é necessário pedir exames complementares de diagnóstico, nomeadamente os testes psicológicos para despiste de outras patologias, como por exemplo problemas de desenvolvimento, perturbações de comportamento, entre muitas outras.

De uma forma geral, os pais, familiares e professores devem estar atentos aos sintomas mencionados, uma vez que, as consequências da depressão infantil são principalmente ao nível do desenvolvimento cognitivo e emocional, iniciar devendo iniciar-se um tratamento precoce, evitando, dessa forma, maiores prejuízos. 

Tratamento da depressão infantil

O recurso a antidepressivos, estabilizadores de humor ou outros psicofármacos no tratamento da depressão infantil continua a ser alvo de muita discussão e é uma questão controversa. Na minha opinião, a psicoterapia individual deve ser o tratamento de eleição, não excluindo também a intervenção com a família e, se necessário, com a escola ou outras pessoas e/ou entidades que rodeiam a criança.

O que não quer dizer que, em situações mais graves, não se recorra a medicação para alívio dos sintomas. A abordagem psicoterapêutica individual tem uma duração variável, consoante a severidade da situação, mas implica um acompanhamento regular que pode variar entre meses a anos.

Dai ser importante a ajuda profissional de um psicólogo, que poderá ajudar a criança a superar as suas dificuldades psicológicas, emocionais e sociais.

Um artigo da psicóloga clínica Marisa Marques.