Sentamo-nos e procuramos posição cómoda. Cresce a ansiedade frente ao grande ecrã na proporção inversa do minguar das luzes. Súbito, há um sopro de luz que inflama de imagem a tela. A vida, mas também tudo o que podemos imaginar, rolam frente aos nossos olhos. Há 125 anos, a ilusão do movimento, a fórmula que anima uma sucessão de imagens estáticas, tornou-se matéria palpável à qual chamámos cinema. Um cosmos de infinitas histórias, mas também ele, o cinema, protagonista de uma narrativa que, como se usa dizer, “dava um filme”. No caso presente deu um livro, o de Mário Augusto, jornalista, escritor e apresentador, há mais de 30 anos figura inalienável do cinema contado em português. O autor retornou aos livros para nos entregar Como se Fosse um Romance: A Mais Curiosa História do Cinema (Bertrand Editora).

Uma jornada que percorremos à conversa com o homem nascido em 1963 em São Félix da Marinha, perto de Espinho. Loucura, paixão, crime, criatividade e engenho dão-nos matéria-prima para uma troca de palavras sobre uma arte nascida de um tempo que inventou um mundo novo. Com o fim do século XIX, dealbar da centúria seguinte, a Terra iluminou-se com a eletricidade e acelerou com o motor de combustão. O século XX, trouxe uma vertigem de velocidade na qual embarcaram uma sucessão de inventos, raiz para o que viria a ser o cinema.

Uma história para contar onde cabem figuras como Thomas Edison, os irmãos Lumière, também o cinema enquanto experiência, arte, vítima e beneficiário da guerra e promotor de uma indústria milionária, palco para um novo panteão de estrelas, beleza e miséria. Um palco onde também cabe a história de um português, António José da Rocha, ligado aos pioneiros que fundaram Los Angeles.

Como Se Fosse um Romance deixa-nos matéria para outras conversas. Nesta, cingimo-nos às origens da Sétima Arte e olhamos brevemente para o futuro. Também deixamos um desafio a Mário Augusto: tendo de escolher um filme, qual transporia para a sua cidade natal?

Como se Fosse um Romance: A Mais Curiosa História do Cinema, é o título que escolheu para o seu mais recente livro. A história do cinema tem todos os ingredientes que compõem o Romance enquanto género literário?

Ao escrever, acontece-me habitualmente não ter uma ideia para o título. No entanto, as palavras “como se fosse um romance” já bailavam há algum tempo sobre o manuscrito. Sempre vi o cinema como a arte de contar histórias. Ela mesmo, na sua história real, é um manancial de vários géneros, do drama, da comédia, da ficção, enfim, todas as áreas que são a fórmula para o romance. Depois, quando se entrega um trabalho ao público, a intenção é que este chegue ao maior número de leitores. Não procurei um título pretensioso, como se estivesse a escrever um livro sobre crítica de cinema, mas antes uma sequência de narrativas que, reunidas, nos dão a evolução da história do cinema. Uma história repleta de curiosidades.

Nas histórias de Mário Augusto cabe um mundo de cinema. Contamos-lhe algumas, como se fossem um romance
créditos: António José Rodrigues

De curiosidades, mas também espanto, assombro, emoção… O Mário Augusto há muito que “viaja” na Sétima Arte. A jornada que fez na compilação do material para este livro ainda lhe trouxe espanto?

Há sempre assombro e por uma razão. Quando olhamos para o cinema, vemos-lhe um puzzle tão vasto de histórias, de emoções e de curiosidades que lhe encontramos sempre a possibilidade de novos caminhos. Se, neste momento, quisesse escrever um Como se Fosse um Romance II, encontraria subsecções da história do cinema que seriam igualmente interessantes e apaixonantes para cada período, género de cinema, país e produção. Este livro, foi pensado e preparado ao longo de dois anos, fruto de muita pesquisa e de seleção de informação. Continuo a ser surpreendido, até porque o livro não tem só cinema, tem, por exemplo, histórias de portugueses que, sem estarem diretamente ligados à história do cinema, têm algo a ver com ele; de pessoas que fundaram os locais do cinema, como o português António José da Rocha que construiu a primeira casa onde hoje é Los Angeles.

Há 100 anos Lisboa enlouqueceu. Os anos de 1920 reaprenderam a felicidade após a pandemia e a guerra
Há 100 anos Lisboa enlouqueceu. Os anos de 1920 reaprenderam a felicidade após a pandemia e a guerra
Ver artigo

A “ilusão do movimento” de que nos fala logo a abrir o seu livro antecede em décadas aquele que temos como o momento inaugural do cinema, com os franceses irmãos Lumière. Houve quem lhes antecedesse?

Por uma questão de facilidade, a história precisa de datas e de referências específicas. Logo, também para o cinema, é tentador arranjar uma data certa para o seu nascimento. O que acontece é que os irmãos Lumière são aqueles que começam, efetivamente, a fazer cinema como espetáculo, pago à porta e com o público a comprar um bilhete. Antes, tanto as experiências de Thomas Edison com fotografias animadas [cinetoscópio], como outras experiências que estavam a ser feitas em Inglaterra e na Alemanha, apresentavam resultados semelhantes. Curiosamente, há polémicas interessantes sobre as primeiras sessões de cinema. Semanas antes dos irmãos Lumière fazerem a apresentação pública de 1895, em Paris, na cave do Grand Café, com convidados e bilhetes pagos, outros dois irmãos, os Skladanovski, tinham feito uma sessão idêntica em Berlim, mas sem bilhetes pagos.

Quando olhamos para o cinema, vemos-lhe um puzzle tão vasto de histórias, de emoções e de curiosidades que lhe encontramos sempre a possibilidade de novos caminhos.

Inclusivamente há um caso de polícia nos primórdios do cinema…

Sim, a envolver Augustin Le Prince o francês que terá desenvolvido um processo de filmagem para, depois, filmar em 1888. Mais tarde, vai de comboio a Paris para exibir a sua maquineta que filmava e projetava imagens. No entanto, Le Prince desapareceu durante a viagem entre Dijon e a capital francesa. Não voltou a ser encontrado, assim como o aparelho que levava.

Não nos podemos esquecer de um outro inventor francês, Léon Bouly que, uns anos antes dos irmãos Lumière, registou a patente de um equipamento a que chamou cinematógrafo. Bouly, essencialmente, construiu um protótipo e procurava financiadores para o projeto, o que não conseguiu. Sem meios para renovar o registo da patente, a designação cinematógrafo ficou disponível e foi registada pelos Lumière. Tudo isto corrobora a ideia de que, na época, muita gente trabalhava com vista ao mesmo fim.

Nos Estados Unidos, Edison também já tinha cobrado pela exibição de imagens em movimento. Não era cinema?

Na década de 1890, Edison já exibia nos Estados Unidos imagens em movimento e cobrava a cada espetador para as exibir. Mas é diferente do espetáculo de cinema, pois as pessoas espreitavam para o interior de uma caixa escura onde brilhava uma imagem em movimento. Quem assistia pagava, embora não estivesse numa plateia. A diferença residia aí.

Edward Muybridge
Sequência de um cavalo a galope nas imagens de Edward Muybridge. Um dos marcos da imagem em movimento. créditos: Domínio público

Olhando para este cenário de frenesim de experiências com aquilo que serviria de base ao cinema, podemos dizer que este nasceu mais da curiosidade científica do que da intenção de fazer arte?

Temos de avaliar duas realidades. Uma, os próprios Lumière tinham essa perceção, achavam que era uma mera curiosidade científica, daí, passado pouco tempo, abandonaram o negócio do cinema. Isto, sem que antes tivessem feito com o seu equipamento, através dos seus funcionários, grandes digressões mundiais, aproveitando para filmar nos diferentes locais e, dessa forma, exibirem novos filmes. Nos seus primeiros anos o cinema queria mostrar movimento, no fundo tratava-se de um postal com imagens que mexiam, mas que não contava uma história.

A segunda realidade, a de contar uma história, nasce com Georges Méliès, ilusionista e proprietário de um teatro, que quis adquirir uma maquineta aos Lumière. Estes, desincentivaram-no: o equipamento não teria futuro, seria uma mera curiosidade científica. Méliès não desistiu e usou o cinema como forma de contar histórias curtas e com truques visuais. Por sua vez, o engenheiro francês Léon Gaumont, do famoso estúdio Gaumont, fundado em 1895, ainda hoje existente, procurou desde logo contar histórias através do cinema. Fenómeno que também se dá na América do Norte. No início do século XX dá-se uma explosão de criatividade em torno do cinema. Ali, o grande boom em termos de negócio ocorre com a chegada de imigrantes europeus.

Perceberam a oportunidade de negócio?

Sim, os imigrantes que chegavam à América perceberam o potencial do negócio, pois o cliente paga antes de ser servido [risos]. Era-lhes cobrado o bilhete antes de assistirem ao espetáculo. Não podemos olhar para estes imigrantes como grandes homens de negócios, eram uns “desenrascados”, com sentido de oportunidade para ganhar dinheiro com os cinemas, conseguindo rentabilizá-los como não acontecia na Europa e fundam as suas produtoras. Acabam por se lançar numa guerra de patentes com Edison o que levou, mais tarde, à instalação do negócio do cinema em Los Angeles, na Califórnia, e a sair de Nova Iorque.

Vírus, terramotos e extraterrestres em histórias portuguesas do “fim do mundo”
Vírus, terramotos e extraterrestres em histórias portuguesas do “fim do mundo”
Ver artigo

O que acontecia deste lado do Atlântico era que tínhamos uma série de artistas na forma como contavam e realizavam histórias. Um dos nomes que já referi é o Georges Méliès, um visionário. Na Europa, ainda no início do século XX, já se definiam estilos e géneros e criavam-se as grandes obras e tendências das artes cinematográficas. Por exemplo o Expressionismo Alemão é muito importante logo nas primeiras décadas do século XX, o Impressionismo Francês também. Ou seja, todas essas tendências artísticas que crescem na Europa acabam por ser influenciadoras da evolução artística do cinema.

Não nos podemos esquecer que grande parte das obras iniciais do cinema, que inspiram americanos a desenvolverem coisas mais arrojadas como David Griffith com o seu filme O Nascimento de uma Nação [1915] e o Intolerância [1916], inspiraram-se em grandes produções europeias. A Europa acaba por marcar o ritmo. O grande problema do Velho Continente é que tem uma visão artística do cinema que não acompanha esses imigrantes e um outro drama maior.

A Primeira Guerra Mundial?

Sim e que arrasa o negócio do cinema na Europa e obriga a que grandes artistas emigrem para os Estados Unidos. Mesmo as estrelas do cinema mudo saem da Europa, como Charlie Chaplin e a Marlene Dietrich.

A Primeira Guerra Mundial vai destruir o potencial de crescimento artístico e de inovação que lhe é subjacente. Não nos podemos esquecer que os grandes produtores europeus se estabeleceram em Nova Iorque, ainda na década de 1910, e começaram a produzir a partir dos Estados Unidos onde estabeleceram estúdios. Por exemplo, as companhias cinematográficas francesas Pathé e Gaumont criaram estúdios em Nova Iorque. Daí, esse acentuar de uma posição diferente daquele que se entende como o cinema artístico, como é visto desde a Europa, e o negócio americano.

mário augusto
créditos: António José Rodrigues

Lemos no seu livro que em 1900 a tecnologia já permitia filmes sonoros. Mas estes só se impuseram três décadas depois.

Há, desde logo, um marco importante na história do sonoro que é a Exposição de Paris de 1900. Tinham passado cinco anos desde que o cinema tivera as primeiras exibições públicas. A Gaumont já apresentava filmes em que o som e imagem eram síncronos. Não nos esqueçamos que na época já tinha sido inventada a grafonola e formas de registar som em cilindros de cera. No entanto, a realização de filmes sonoros não avança pois era demasiado cara e não tinha impacto maior junto dos públicos por uma razão curiosa: até 1907, o cinema americano atinge uma qualidade de produção, de fotografia, iluminação, de dinâmica e complexidade nas histórias que, na perspetiva da indústria, não trazia valor acrescentar-lhas o som. O cinema que a América exportava para o mundo não seria entendível em países não falantes do inglês. Havia outro problema grave que se prendia com o apetrechamento das salas. O cinema mudo pedia um projetor, uma tela e uma sala simples. Já adicionar-lhe som era mais complexo, pois seria preciso equipar a sala com novas máquinas e um investimento pesado para a exibição. Também encontrávamos atores e atrizes com poucos dotes de representação ou com vozes desagradáveis. Inclusivamente havia atores, com melhor voz, a fazer a dobragem das vozes de algumas estrelas do cinema.

No início, a classe média, média/alta olhava para o cinema como algo pobre, um espetáculo de feira. Em abono da verdade, os atores de teatro olhavam com desdém para a ‘malta’ do cinema.

Contudo, na década de 1920, a conjuntura acaba por impor o cinema sonoro.

Em Hollywood a transição do cinema mudo para o sonoro acontece quando os dois irmãos Warner, falidos devido a uma série de projetos que não apresentavam os resultados que eles esperavam disseram: “perdidos por dez, perdidos por mil” e decidiram fazer um filme sonoro, O Cantor de Jazz [1927], com um sucesso tremendo junto do público. Visto a partir dos nossos dias, aquela película não é um filme sonoro, é um filme com som. Aliás, tiveram de produzir duas versões, uma muda e outra sonora, pois não havia salas apetrechadas com o novo sistema de som. Dois anos mais tarde, em 1929, as salas de cinema americanas projetavam centenas de filmes sonoros produzidos nos Estados Unidos. A história do cinema é mesmo assim, quando algo vinga, há um fenómeno de replicação.

Como se fosse um romance
Ilustrações de André Carrilho na capa do novo livro de Mário Augusto. créditos: Bertrand Editora

Ainda no século XIX também Lisboa conhece o cinematógrafo. A capital portuguesa rendeu-se às imagens em movimento?

Em 1896, chegou à capital portuguesa aquele que ficou conhecido como o “eletricista húngaro”, Edwin Rousby. O projecionista aqui chegou a pedido do empresário lisboeta António Santos Júnior que, antes, em Madrid, vira uma apresentação do animatógrafo [rebatismo do teatrógrafo]. Na capital portuguesa a projeção decorreu num espaço nas proximidades do atual Coliseu dos Recreios. Ao que se sabe, esta primeira sessão não correu muito bem, apesar do entusiasmo do público. Tratava-se de uma retroprojeção, ou seja, o filme era projetado por trás de uma tela encharcada para ganhar luminância.

Falando de Portugal e dos portugueses, também encontramos um nosso concidadão ligado à fundação de Hollywood. Quer contar-nos brevemente esta história?

É uma história muito curiosa e anterior ao cinema. Incluí-a no livro porque António José da Rocha está ligado ao desenvolvimento da região onde nasceria Hollywood e ao crescimento e implementação da cidade de Los Angeles. Quando ali chega, depois de 1814, António é o primeiro não nativo da região a tocar naquelas paragens. O português começa a cultivar o terreno da quinta que adquire, o La Brea Ranch, hoje uma avenida gigante em Los Angeles. Porquê La Brea Ranch? Na época a Califórnia era um território remoto. António José da Rocha chegara aquele local vindo do Minho, de Santiago de Sopo, Vila Nova de Cerveira, de onde fugiu à miséria no nosso país devido as Invasões Francesas. Na primeira década do século XIX, António, então com 18 anos, acabara de chegar ao pueblo de Nuestra Señora de Los Ángeles del Rio de Porciúncula, mais tarde a cidade de Los Angeles. O sítio onde construiu a sua casa, o Rancho La Brea, ganhara o seu nome dos espanhóis que assim se referem ao alcatrão. António tinha na sua quinta um lago borbulhante de petróleo, na época ainda não explorado. O luso construiu a primeira casa em tijolo da cidade de Los Angeles, ali pondo a sabedoria portuguesa. Essa casa ainda existe e é habitada.

Los Angeles
Poços de petróleo em Los Angeles em 1896. créditos: Domínio público

Como reagiram as outras artes, nomeadamente as de palco, ao aparecimento e sucesso do cinema?

Nos primórdios, o cinema acaba por roubar público a outros espetáculos, embora não muito e por uma razão. Como vimos, chegavam anualmente à América milhões de europeus, normalmente do leste do continente; famílias de judeus numerosas, mão-de-obra pouco qualificada, gente que escapava à fome e miséria na velha Europa que procurava o sonho americano e, muitas vezes, acabava explorada. Essas pessoas não iam ao teatro, à ópera ou a concertos. Acresce que não dominavam o inglês e o cinema dava-lhes uma narrativa percebível.

No início, a classe média, média/alta olhava para o cinema como algo pobre, um espetáculo de feira. Em abono da verdade, os atores de teatro olhavam com desdém para a ‘malta’ do cinema. Este era o parente pobre da arte de representar. As histórias não eram suficientemente consistentes, não era uma representação linear. Por seu turno, o teatro é a arte da representação. Grande número dos atores que aparecem no contexto do cinema era gente que não interessava ao teatro. O próprio Chaplin vai para o cinema porque lhe pagavam melhor do que a fazer teatro.

Em síntese, as outras artes não encararam o cinema como uma ameaça como, mais tarde, o cinema viu a televisão. Na realidade todos conquistaram o seu espaço e coexistiram.

Podemos afirmar que é a arte plural por excelência?

Não é uma arte única, tem de ter representação, música, escrita, a componente cénica, entre outras. Diria que é a arte das artes. A base para o filme é sempre uma história. Atualmente, o próprio gaming obedece a uma narrativa. Os próprios jogos têm, a abrir, uma contextualização histórica, antes do jogador tomar conta da ação. Acaba por criar relações com as personagens que vamos gerir.

Não acho que o cinema acabe. Serão produzidos filmes e conteúdos específicos para plataformas digitais, enquanto outros filmes terão força no grande ecrã.

Mário, agora que chegámos ao presente, seria interessante abrirmos um pouco a porta do futuro. É lícito olharmos para o streaming e ver-lhe a plataforma herdeira de uma arte sedutora a que chamamos cinema?

Não acho que o cinema acabe. Serão produzidos filmes e conteúdos específicos para plataformas digitais, enquanto outros filmes terão força no grande ecrã. Julgo que o acontecerá – e acontece sempre na evolução – quando há grande quantidade, algo ‘morre’ pelo caminho. A ideia do multiplex, com 20 salas de cinema, máquina de pipocas, talvez se perca. O cinema voltará a ter uma certa magia, com salas mais pequenas, onde iremos assistir a determinados filmes em família e com os amigos, imbuídos de um certo encantamento, associado à projeção, ao apagar da luz, um ecrã gigante e som envolvente. Agora, as comédias românticas e outros filmes mais ligeiros, terão espaço na televisão. Assistir à saga Star Wars, ao Avatar ou o Indiana Jones num cinema é uma coisa, na televisão é outra. Teremos um cartão de assinatura dos serviços de streaming ou o que resultará da fusão de todos eles.

Falta saber como tudo isto irá evoluir. Tanto quanto se sabe, a Netflix, apesar de ter 230 milhões de assinantes, não teve qualquer lucro em nenhum ano. Isso poderá mudar o modelo de negócio.

Na lista de filmes que apresenta no final do seu livro há três géneros cujas sugestões de películas ficam nos anos de 1990: “15 dramas imperdíveis”, “10 comédias clássicas” e “10 westerns”. O cinema anda pouco inspirado nestes géneros?

Julgo que se têm replicado muito as fórmulas. Compilar essa lista foi a coisa mais difícil do mundo [risos]. Quis restringir a lista a 125 filmes, tantos quantos anos tem a história do cinema. Numa primeira fase fiz a lista com esses 125 filmes e verifiquei que havia itens desprotegidos, dada a qualidade das películas que incluíra noutros. Depois, segmentei por géneros, o que me permitiu incluir películas que não juntara antes. Ficaram de fora umas dezenas de filmes que estavam na primeira lista. Optei por filmes comprovadamente reconhecidos, pela qualidade narrativa, pelas produções, pelas histórias e importância na linha do tempo do cinema. Na seleção, temos 10 ou 15 filmes mais recentes. De resto, concentrei-me mais nos clássicos porque, na verdade, são os que mais me seduzem. Há um filme que, com muita pena minha, não está na lista, A Última Sessão, um dos mais importantes da produção americana dos anos de 1970, realizado por Peter Bogdanovich.

O Mário vive em Espinho, tem um mar indomável frente aos olhos. Se tivesse a possibilidade de transpor um filme e as suas personagens para a sua terra natal, qual escolheria?

Há um filme que, julgo, permitia fazer uma história numa cidade pequena como esta, com características singulares. Por exemplo, escolheria um filme do Billy Wilder ou, se quisermos algo mais dramático, até porque o realizador [Paul Thomas Anderson] já esteve comigo em Espinho, escolheria o Magnólia. Aquelas personagens poderiam andar nesta cidade pequena.