Os sismos, o aquecimento global, a gripe A, a recessão, o aumento da criminalidade...

Se alguma (ou todas) estas questões a preocupam, saiba que não está sozinha. A ansiedade é uma condição da vida moderna e está em toda a parte.

Hoje, temos vidas mais longas, seguras e saudáveis e, porém, vivemos no medo. Este é o tema abordado no livro «Panicology» pelos autores britânicos Simon Briscoe e Hugh Aldersey-Williams que apontam o dedo aos meios de comunicação social e analisam mais de 40 histórias largamente noticiadas, defendendo que os factos são manipulados ou deturpados pelos media. O autor Hugh Aldersey-Williams, formado em Ciências da Natureza e com experiência em jornalismo, falou-nos sobre esta teoria.

Como surgiu a ideia para o livro «Panicology»?

Surgiu quando comecei a ver demasiadas fotomontagens do mar a atingir níveis impossíveis, por exemplo, imagens do rio Tamisa a inundar metade do Big Ben. Também vi um projecto escolar em Norfolk, muito irresponsável, em que foi pedido aos alunos para pintarem a terra de azul, como se todo o oceano Árctico e Antárctico tivessem derretido.

Como define o termo «Panicology»?

É a ciência que estuda os receios difundidos pelos meios de comunicação social. Um panicologista é uma pessoa céptica que tem o bom-senso de ver para além do que é noticiado.

É possível evitar o pânico ou essa é uma característica inata do ser humano?

Parecemos estar pré-condicionados para nos preocuparmos, mas a comunicação social faz disso o seu trabalho, fazendo com que nos preocupemos ainda mais. Um pouco de preocupação é provavelmente bom para nós, reduzindo o risco e reforçando o sentido de comunidade entre as pessoas. Mas somos encorajados a
preocupar-nos indiscriminadamente, muitas vezes com coisas patetas ou sobre as quais não podemos fazer nada, o que é simplesmente uma perda de tempo.

Poderá esse tipo pânico produzir na audiência o efeito contrário?

As pessoas estão cada vez mais cientes de que os media podem ser ignorados. Por exemplo, apesar da crise, se você tem dinheiro por que não gastá-lo? Você é que decide. Na verdade, até somos encorajados a comprar para manter a economia em movimento.

Quais os pontos positivos dessa ansiedade à escala global?

Usamos os nossos sentidos para avaliar o perigo imediato, por exemplo, olhar antes de atravessar a estrada ou cheirar antes de provar um iogurte fora de prazo. Mas não temos um equipamento destes para lidar com o risco. Em vez disso, discutimos sobre aquilo que nos preocupa à refeição ou numa esplanada entre amigos. A educação, o preço das casas... E isto fornece-nos uma espécie de cola social que pode ser positiva.

Quais os benefícios de quem consegue manter-se livre do pânico?

Liberdade e tempo para seguir em frente com a sua vida.

Veja na página seguinte: Quem sofre mais de ansiedade? Os homens ou as mulheres?

Quem sofre mais de ansiedade? Os homens ou as mulheres?

Não temos muita informação acerca disso.

Presume-se que as mulheres se preocupam mais com os assuntos relacionados com a saúde e os homens com coisas mais abstractas, como a economia e as mudanças climáticas.

Actualmente, quais são os factos que causam mais pânico?

Depende daquilo que assusta cada um de nós, da mesma maneira que a dimensão real do risco depende muito da localização e do contexto, algo que os meios de comunicação social nacionais não conseguem definir com clareza. Por exemplo, na planície rural de Norfolk, eu devia talvez estar preocupado com a subida do nível da água do mar, com a gripe aviária, com as mudanças climáticas, com o trabalho imigrante precário... Mas não estou.

Que factos justificam entrarmos em pânico?

Nunca vale a pena entrar em pânico.

Mas não é normal temermos pela nossa saúde à medida que vemos novas doenças surgir?

Sim, isso é racional. Mas as pessoas precisam de ter noção do verdadeiro risco. A gripe aviária nunca foi uma doença transmissível de humano para humano, e as únicas pessoas que morreram devido à doença estavam em íntimo contacto com aves.

Portanto, para a grande maioria das pessoas o risco foi sempre nulo e, no entanto, o problema produziu o maior pânico provocado pelos meios de comunicação social, relacionado com uma doença, nos últimos anos. A gripe A é (um pouco) mais preocupante e pode ter o benefício, não intencional, de fazer com que levemos a gripe normal mais a sério.

Acha que as pessoas estão, realmente, preocupadas com a possibilidade de um ataque terrorista perto de suas casas?

As pessoas preocupam-se, mas não sabem o que fazer ou como agir. As autoridades dizem-nos para estarmos vigilantes, mas não a quê. O efeito disto é simplesmente pôr-nos à beira do pânico, possivelmente, na tentativa de produzir uma população condescendente.

Será que hoje estamos melhor preparados para reagir a uma catástrofe natural depois de assistirmos a tantas em directo na televisão?

Os desastres naturais tendem, pela sua natureza, a ser inesperados. Eu suponho que vamos continuar a tentar preparar-nos para eles, até ao ponto em que a previsão é possível, mas tenho a certeza de que a maioria da acção será tomada após a ocorrência, como aconteceu com o tsunami no Oceano Índico.

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A opinião do psicólogo

Vítor Rodrigues comenta a teoria dos autores britânicos:

Analisar os media

«Estamos biologicamente preparados para reagirmos com medo ou agressão e os media exploram esse facto», sublinha.

«Inventam-se ou ampliam-se medos e inimigos para vender mais produtos de comunicação social», refere. «Basta ver o slogan socialmente destrutivo apregoado em alguns meios jornalísticos, good news no news. Caiu um voo da Air France, morreram quase 200 pessoas e foi trágico. Mas quantas pessoas morrem, por dia, na soma de acidentes de trabalho, domésticos, de avião, automóvel e comboio? E por que é que um milhão de assassinados no Ruanda, há anos atrás, tiveram
muito menos cobertura do que o caso Maddie?», interroga-se.

Para não entrar em pânico

«Há que ensinar a todos que o que vemos e ouvimos nos meios de comunicação é provavelmente distorcido, incompleto, parcial ou falso. Há que ensinar as crianças a pensarem criticamente, a desconfiarem e a procurarem os pontos fracos das notícias», recomenda.

Texto: Vanda Oliveira com Vítor Rodrigues (psicólogo)