Enquanto a ciência continua a tentar descobrir as diferentes formas como a genética influencia a nossa saúde, não devemos ficar de braços cruzados à espera que a hereditariedade se encarregue de traçar o nosso destino.
Qual é, afinal, o peso dos genes no que toca ao cancro da mama, doença de Alzheimer, artritre reumatóide, doenças cardiovasculares, osteoporose, depressão e enxaquecas?
A saber viver conversou com vários especialistas em reumatologia, cardiologia, ginecologia e neurologia, e revela-lhe o que está ao seu alcance fazer para lutar contra a genética.
Cancro da mama
De acordo com Margareth Samson-Smith, ginecologista, «embora nem todos os estudos sejam unânimes, calcula-se que cinco por cento dos casos de cancro da mama estejam relacionados com o factor hereditário. Seguindo este raciocícinio, 95 por cento dos casos são esporádicos e, muitas vezes, relacionados com o avançar da idade. Um em mil casos pode ser causado pelas terapias de substituição hormonal e a obesidade também pode desempenhar um papel importante».
A melhor arma contra o cancro da mama continua a ser o diagnóstico precoce: o auto-exame mensal à mama deverá ser realizado por todas as mulheres, a partir dos 15 anos, cinco a oito dias após a menstruação (a aplicação de um gel ou creme facilita os movimentos). É recomendada a realização de uma mamografia anual a partir dos 40 anos e, no caso de existir história familiar de cancro da mama, essa deve ser feita a partir dos 35 anos.
«No que toca ao estilo de vida, várias pesquisas têm demonstrado que a prática de exercício físico e uma dieta equilibrada que inclua alimentos ricos em fibra e com propriedades antioxidantes são uma forma de evitar a obesidade como já foi mencionado, é um factor de risco para o cancro da mama. Não fumar e ingerir bebidas alcoólicas com moderação são outros cuidados importantes», alerta Margareth Samson-Smith.
Doença de Alzheimer
Eis uma patologia em que os genes têm um peso muito significativo, já que «a hereditariedade pode ter entre 50 a 60 por cento de protagonismo. Se um familiar próximo tiver doença de Alzheimer, a probabilidade de virmos a ter esta patologia é maior do que a chance de não virmos a sofrer desta doença», descreve Rose Salisbury, neurologista. No entanto, existem factores ligados ao estilo de vida que causam outros tipos de Alzheimer e que não são hereditários, como danos cerebrais causados pela ingestão excessiva de bebidas alcoólicas, ou determinado tipo de infecções que conduzem à demência.»
Embora as investigações científicas continuem a tentar apurar como podemos defender-nos da doença de Alzheimer, não existem dados concretos que apontem para formas de prevenção. Porém, julga-se que pessoas que se dedicam a actividades intelectuais estimulantes, como jogar xadrez, tocar um instrumento musical ou fazer palavras cruzadas, terão um menor risco de vir a sofrer de demência. Crê-se, igualmente, que praticar exercício físico está associado à produção de substâncias que auxiliam os neurónios a adaptarem-se a situações novas.
Doenças cardiovasculares
Ian Simpson, cardiologista e vice-presidente da British Cardiovascular Society, explica que «calcular o risco genético exacto da doença das artérias coronárias (um tipo de doença do coração) pode ser complicado.
É sabido que a doença das artérias coronárias pode estar relacionada com a história familiar mas, em muitos casos, deve-se à diabetes, aos níveis elevados de colesterol e da pressão arterial, que têm uma componente genética.
Para além disso, parecem existir outras componentes genéticas na doença das artérias coronárias que nós, em termos científicos, ainda não fomos capazes de compreender. A importância da história familiar é que nos indica um aumento do risco potencial e permite-nos a reconhecer e a procurar níveis elevados de colesterol, pressão arterial alta e diabetes num estádio inicial, ajudando-nos a iniciar o tratamento mais cedo.»
O vice-presidente da British Cardiovascular Society realça que, tal como já referiu, «muita da predisposição genética para desenvolver doença das artérias coronárias relaciona-se com o facto de haver, na família, história de diabetes, pressão arterial e níveis de colesterol elevados, o que deve levar a pessoa a monitorizar esses valores regularmente e a fazer o despiste da diabetes.
Para além disso, existindo esses antecedentes familiares, é ainda mais importante modificar o estilo de vida de modo a minimizar o risco. Deve-se evitar fumar e ter excesso de peso, apostando numa dieta equilibrada e rica em peixes gordos e praticando exercício físico. Fazendo as modificações certas no seu estilo de vida poderá reduzir substancialmente o seu risco individual de vir a ter doença das artérias coronárias.
Artrite reumatóide
Crê-se que «a componente hereditária corresponda a cerca de dois por cento, embora se torne ligeiramente maior se um dos nossos familiares próximos tem uma manifestação forte da doença», refere Christopher Deighton, reumatologista. «Infelizmente, no presente, desconhecem-se formas de prevenir a artrite reumatóide», adianta o mesmo especialista.
Osteoporose
De acordo com Nicholas Harvey, reumatologista e
investigador na Universidade de Southampton, «ter uma forte história
familiar de osteoporose – por exemplo, a nossa mãe ter tido uma fractura
da anca por volta dos 60 anos em consequência de uma queda – aumenta o
risco de osteoporose e de ossos partidos entre 50 e 100 por cento».
«Isto
significa que o risco de uma fractura osteoporótica é de um em 100 e
que, se tivermos uma forte história familiar de osteoporose, esse risco
passa a ser de dois em 100», refere ainda.
«A história familiar actua, em grande parte,
através da herança genética, mas existem muitos genes envolvidos no
risco de virmos a ter osteoporose. No entanto, cada gene,
individualmente, só representa uma proporção minúscula do risco total», subtinha ainda este especialista.
As
notícias são boas. «Há muitas coisas que podemos fazer para reduzir o
risco de osteoporose ao longo da vida. O trabalho que temos desenvolvido
na Universidade de Southampton tem permitido demonstrar que as crianças
cujas mães têm uma alimentação pouco saudável, fumam ou tinham níveis
baixos de vitamina D durante a gravidez, têm uma força óssea menor», destaca.
«Isso
resulta num maior risco de osteoporose e de fracturas quando
ultrapassarem os 60 anos. Todos nós, ao longo da vida, devemos ter uma
dieta equilibrada que inclua cálcio e praticar exercício físico, de
preferência ao ar livre, que ajuda à formação de vitamina D. Fumar e
ingerir bebidas alcoólicas em excesso também é nocivo para os ossos»,
explica ainda este reumatologista.
Depressão
Estudos apuraram que as mulheres parecem ter um risco dez por cento superior ao dos homens no que toca a herdarem depressão, embora as razões para esta diferença sejam complexas e difíceis de justificar. O stress e a ansiedade, assim como a privação de sono, parecem atrair a depressão, pelo que relaxar, dedicarmo-nos a actividades que nos dêem prazer, dormir o número de horas suficiente e praticar exercício físico (que ajuda a que o cérebro produza substâncias responsáveis pela sensação de bem-estar) são conselhos a seguir.
Se a sua mãe ou outro familiar próximo sofreu ou sofre de depressão,
aprenda com a experiência dele, estando atenta aos sinais de alerta e
situações desencadeantes e tornando o seu estilo de vida mais saudável.
A herança das enxaquecas
Pesquisas recentes revelam que as
enxaquecas têm uma forte componente genética e recaem mais sobre o sexo
feminino, sendo que todas as mulheres têm cerca de 20 por cento de
probabilidades de virem a sofrer do problema.
No entanto, se um
progenitor sofre de enxaquecas, o risco sobe para 40 por cento e, se
ambos tiverem enxaquecas, a probabilidade passa a ser de 80 por cento. Embora
não esteja ao seu alcance fugir da hereditariedade, pode atenuar a
frequência e intensidade das enxaquecas através de mudanças simples no
seu estilo de vida. Aprenda a identificar as situações-padrão em que as
enxaquecas se manifestam.
São provocadas pelo ruído em excesso? Por
luzes fortes, cansaço ou stress? Evite o cenário que atua como gatilho. Alguns estudos
verificaram que uma dieta rica em cálcio (existente nos lacticínios) e
vitamina B2 (presente no abacate, nozes, castanha, brócolos, espinafres,
ervilhas e ovos, entre outros) pode ser uma aliada contra as crises de
enxaqueca. Não recorra à toma de suplementos sem se aconselhar
previamente com o seu médico assistente.
Texto: Teresa d'Ornellas com Christopher Deighton (reumatologista), Ian Simpson (cardiologista),
Margareth Samson-Smith (ginecologista), Nicholas Harvey (reumatologista) e Rose Salisbury (neurologista)
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