Uma equipa multidisciplinar de investigadores da Universidade de Coimbra conseguiu quantificar a produção, em tempo real e in vivo, de óxido nítrico e o seu raio de difusão no cérebro.

Trata-se de uma medição decisiva para perceber a dualidade de ação desta molécula, já definida como molécula revolucionária, porque é um radical livre e atua simultaneamente como um neuromodelador e uma neurotoxina.

Tem uma ação positiva ao nível da memória e da aprendizagem e uma ação nefasta ao nível da morte celular associada a doenças neurodegenerativas. Com estes resultados, apresentados no último trimestre de 2011, cujos estudos se iniciaram há mais de uma década, a equipa multidisciplinar liderada por João Laranjinha, da Faculdade de Farmácia e do Centro de Neurociências e Biologia Celular, demonstrou que a molécula de óxido nítrico é, fazendo uma analogia, «a ligação wireless do cérebro».

«O óxido nítrico produzido nos neurónios é o mediador do acoplamento neurovascular, isto é, além de ter um papel central para a sobrevivência dos neurónios faz a ponte entre o sistema nervoso central e o sistema vascular», justifica o especialista. Ao conseguir medir e descrever a dinâmica da concentração de óxido nítrico no cérebro, os investigadores de Coimbra criam muito boas perspetivas para «determinar de que modo a molécula deixa de ser benéfica e passa a ser tóxica e, assim, desenvolver métodos que interfiram nos mecanismos por ela modulados para evitar a morte celular associada a doenças neurodegenerativas como Alzheimer ou Parkinson», explica João Laranjinha.

Até alcançar estes resultados, os investigadores João Laranjinha e Rui Barbosa percorreram um longo caminho. Sabendo que o óxido nítrico é um gás e mensageiro ubíquo com duas faces, ao mesmo tempo que regula os mecanismos envolvidos na memória e na aprendizagem também é responsável pelo envelhecimento e neurodegenerescência, os cientistas quiseram responder às seguintes questões.

Como é que uma molécula tão simples (constituída apenas por dois átomos) tem duas faces tão distintas? Porque é que umas vezes é uma neurotoxina e outras é um neuromodelador? Perante o problema, os cientistas começaram por construir, de raiz, microeléctrodos de fibra de carbono quimicamente modificados (com espessura 10 vezes mais fina do que um cabelo) e desenvolveram métodos únicos de medição da nuvem de óxido nítrico que se forma no cérebro, em tempo real e in vivo, em ratos e ratinhos de laboratório.

«Só assim é possível ultrapassar o conhecimento meramente fenomenológico em que os sistemas e processos constituem caixas negras e desvendar os mecanismos moleculares subjacentes às vias de sinalização dependentes de óxido nítrico», ilustra o líder do único grupo de investigação em Portugal centrado nesta linha de pesquisa», refere o investigador. O óxido nítrico é uma molécula surpreendente, conhecida de há longa data como poluente atmosférico, que nasceu para a biologia muito recentemente e veio revolucionar o nosso entendimento da transmissão de informação no cérebro.