O ato de falar implica coordenar uma sequência de movimentos, resultantes de contrações musculares, que envolvem estruturas envolvidas na respiração, fonação (voz) e articulação (modelar os diferentes sons para constituírem palavras), tudo isto conjugado com um processo cognitivo fabuloso de planeamento linguístico (escolha de palavras, construção sintática da frase), culmina num perfeito e sincronizado discurso.
Falar é o ato motor mais rápido que o ser humano realiza. Uma ruptura neste sistema poderá conduzir a sons repetidos, prolongados e/ou incapacidade de os produzir no “timing” certo (bloqueios).
O que define gaguez, ao contrário do que muitos pensam, é que a pessoa sabe exatamente o que quer dizer, contudo a palavra/som “simplesmente não saí”.
Naturalmente, poderão surgir sentimentos associados desde tenra idade (a Gaguez poderá surgir a partir dos 18 meses), irritação, frustração, culpa , vergonha (entre outros), que poderão conduzir a um evitamento de determinadas situações de comunicação (evitar falar em público, substituir palavras, evitar situações…). Esta é a principal consequência da gaguez.
A gaguez é uma perturbação da comunicação, que está incluída nas perturbações do Neurodesenvolvimento no DSM-V (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders). Atinge aproximadamente 5% das crianças e 1% da população adulta. Grande parte das pessoas que gaguejam têm familiares com a mesma condição, o que demonstra o forte carácter genético deste handicap, que não tem base emocional, mas, segundo os estudos, com as possíveis alterações neurológicas que nascem com as pessoas que gaguejam.
Tratamento
Investigações realizadas nos últimos anos têm demonstrado os benefícios do tratamento da Gaguez. Uma terapia para a Gaguez, em fase precoce, pode inclusive conduzir à remissão em crianças. Noutros casos, a terapia pode minimizar os sintomas da gaguez, ajudar a comunicação no geral e melhorar a qualidade de vida de quem gagueja.
Existem várias metodologias de intervenção, que para além de promoverem uma maior fluência do discurso, ajudam também a lidar com os sentimentos negativos (vergonha, frustração, medo, entre outros) que poderão surgir associados aos momentos de gaguez. Um objectivo importante, é a criação de uma atitude positiva perante situações da comunicação, em que a gaguez não defina as escolhas e decisões da pessoa que gagueja.
Nas abordagens na infância , os pais têm um papel fulcral. São aliados terapêuticos únicos e preponderantes no sucesso do tratamento.
Para adolescentes e adultos, as abordagens mais utilizadas têm origem em duas vertentes, que poderão ser utilizadas de forma conjunta. A modelagem da fluência e/ou a modificação do momento de gaguez. Na primeira, existe uma aprendizagem de estratégias facilitadoras para momentos em que se pretende gaguejar o mínimo possível (leitura em voz alta e participação nas aulas; apresentações e reuniões de Universidade e Trabalho, entrevistas de emprego, etc) e aborda o discurso no seu “todo”. O tratamento é baseado sobretudo na aprendizagem de técnicas, para a produção de um discurso mais suave e relaxado, onde a probabilidade de gaguejar é menor.
A modificação do momento de gaguez, tal como o nome indica, aborda exclusivamente o “acto” de gaguejar, tornando-o mais fácil, assim como, o desenvolvimento de estratégias para lidar com os sentimentos associados à comunicação e à gaguez.
Em ambas as abordagens, é muito importante a promoção de estratégias que ajudem as pessoas a lidar com os seus medos e ansiedades (resultantes da convivência com a gaguez) relacionados com a comunicação.
Não existem “receitas mágicas” e o sucesso terapêutico é construído com base na relação Terapeuta da Fala- Paciente
Nunca é tarde para procurar tratamento para a Gaguez e a Terapia da Fala em Portugal tem vindo a ser cada vez mais reconhecida pela sua capacidade de resposta a esta condição que poderá ter um impacto muito significativo na Qualidade de Vida.
Por Gonçalo Leal e Rita Carneiro, Terapeutas da Fala
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