O primeiro estudo sobre a prevalência da infecção por HPV (Papilomavírus humano) efectuado em Portugal foi anunciado recentemente no Congresso Eurogin 2010, realizado em Monte Carlo, no Mónaco.

«Mulheres contra o cancro do colo do útero» foi o mote para o fórum que reuniu especialistas de vários países para discutir a prevenção mais eficaz da doença. «Demonstrou- se, com o estudo Cleopatre, que uma em cada cinco mulheres, dos 18 aos 64 anos, de Norte a Sul do país, está infectada por HPV. A percentagem mais elevada registou-se no grupo dos 20 aos 25 anos, denotando-se também uma incidência significativa em mulheres entre os 45 e os 64 anos», explica Carlos de Oliveira, coordenador científico do estudo. Em Portugal a incidência é superior à média da União Europeia a 15, daí que a prevenção seja essencial.

Da infecção ao cancro

«Uma mulher, após o início da sua vida sexual e nos primeiros quatro anos, tem uma probabilidade de 50 por cento de ser infectada pelo HPV» refere José Maria Moutinho, especialista em ginecologia oncológica.

Segundo o médico, «80 por cento das infecções por HPV não provocam qualquer alteração celular e cerca de 20 por cento das infecções gera alterações, chamadas de baixo grau porque têm fraco potencial para evolução para malignidade e a maioria desaparece espontaneamente».

Cerca de um por cento provoca alterações celulares de alto grau que podem evoluir para um carcinoma invasivo. Nos casos em que progride para cancro, podem decorrer cerca de 20 anos desde a infecção inicial. Neste período, é possível fazer o rastreio secundário (citologia ou exame Papanicolau), detectar e tratar eventuais lesões.

A prevenção

Um dos problemas das infecções por HPV no aparelho genital feminino reside no facto de serem, na sua maioria, assintomáticas. O diagnóstico passa, sobretudo, pela observação ginecológica.

«As mulheres devem realizar uma citologia de três em três anos (ou a cada cinco anos, entre os 25 e os 65 anos), no Centro de Saúde», refere o ginecologista.

«As mulheres com citologias anormais (teste de rastreio positivo) devem ser avaliadas numa Unidade de Patologia Cervical, onde são observadas por um médico especialista através de um colposcópio (microscópio para ver o útero e a vagina)», acrescenta.

«O diagnóstico pode ser realizado via testes de biologia molecular que pesquisam a presença de ADN do vírus», adianta ainda o especialista. Nenhuma prática sexual é totalmente segura, já que «a transmissibilidade do HPV se efectua pelo contacto entre as mucosas ou superfícies da pele», sustenta José Maria Moutinho.

Assim, recomenda-se ter um estilo de vida saudável – não fumar, ter uma dieta equilibrada, praticar exercício físico – bem como «relações monogâmicas e o recurso a medidas que impeçam o desenvolvimento de doenças de transmissão sexual [como o preservativo]», frisa.

A vacina

Dados recentes mostram que a vacina contra o cancro do colo do útero é igualmente benéfica para mulheres mais velhas. «A vacina demonstrou uma eficácia de quase 100 por cento até aos 26 anos e de 90 por cento até aos 45 anos, o que é notável», diz Daniel Pereira da Silva, ginecologista.

Embora o Programa Nacional de Vacinação disponibilize a vacina entre os 13 e os 17 anos, recomenda-se a todas as mulheres, quer tenham ou não iniciado a vida sexual, que adiram à vacinação.

Assim, estão protegidas do HPV tipos 16 e 18, responsáveis por 70 por cento dos casos de cancro do colo do útero, e dos tipos 6 e 11, que originam 90 por cento dos condilomas genitais. «As mulheres vacinadas devem ser submetidas a programas de rastreio para a prevenção dos restantes 30 por cento de casos provocados por outros tipos de HPV de alto risco», diz José Maria Moutinho.

O rastreio

Desde há duas décadas, no centro do país, realiza-se um rastreio organizado contra o cancro do colo do útero. Este «surgiu inicialmente associado ao IPO de Coimbra e ao Núcleo Regional do Centro da Liga Portuguesa contra o Cancro. Recentemente, a Administração Regional de Saúde do Centro alargou-o a toda a zona.», diz Carlos de Oliveira.

O convite para o rastreio nacional é feito em vários Centros de Saúde e a participação é fundamental. «As mulheres que se recusam a participar no rastreio organizado têm maior risco de vir a desenvolver carcinoma invasor do colo», alerta José Maria Moutinho.


4 factos que deve saber…

1. O cancro do colo do útero é transmitido por contacto sexual, não sendo necessário haver penetração.

2. As infecções por HPV podem ser curadas e não significa que progridam para cancro.

3. O rastreio com a citologia permite detectar as lesões pré-cancerosas.

4. «A vacina é o meio mais seguro para prevenir a infecção», defende Daniel Pereira da Silva.

Texto: Cláudia Pinto com Carlos de Oliveira (professor da Faculdade de Medicina de Coimbra); Daniel Pereira da Silva (ginecologista); Harald Zur Hausen (virologista) e José Maria Moutinho (especialista em ginecologia oncológica).