
De acordo com a legislação o que é um néctar de fruta?
De acordo com a legislação portuguesa, que vem alinhada com a legislação europeia, um néctar de fruta é definido como uma bebida obtida a partir de sumo de fruta, puré de fruta, concentrado de sumo ou concentrado de puré, ao qual se adiciona água e, eventualmente, açúcares ou edulcorantes.
Ou seja, ao contrário do sumo 100%, um sumo de fruta sem adição de açúcares, só obtido a partir da fruta, o néctar pode ter adição de água; adição limitada de açúcares ou mel e, eventualmente, a adição de ácido cítrico para corrigir a acidez. Contudo, não pode ter corantes nem conservantes.
Acresce que a legislação determina o teor mínimo de fruta no produto final, que vai variar conforme a fruta. Por exemplo, há que ter, um mínimo de 50% para frutas como laranja, maçã, ananás, pêssego e pera e 25%, no mínimo, para frutas como groselha, goiaba, manga, maracujá.
Junta-se que no caso dos refrescos ou bebidas de fruta, o teor desta é inferior a 25%, podendo chegar a valores ínfimos, às vezes, 5% ou menos.
Por que razão encontramos nos lineares dos supermercados néctares no frio e outros não?
Existem processos produtivos que excluem as pasteurizações [estabilidade microbiológica] e utilizam tecnologia de alta pressão [HPP - High Pressure Processing], preservando a frescura e o sabor, ao mesmo tempo que assegura a eliminação de microrganismos, sem a necessidade de altas temperaturas. Esta tecnologia apresenta ainda como vantagem a não destruição dos micronutrientes como as vitaminas e minerais. Estes produtos carecem de refrigeração e como tal o consumidor encontrá-los-á nos lineares refrigerados.
Uma questão que presentemente interessa ao consumidor é a interpretação dos rótulos. Neste caso, o que há a considerar?
A leitura crítica dos rótulos é o melhor aliado do consumidor. Entre os principais pontos a verificar refiro a ordem dos ingredientes, ou seja, estes estão listados por ordem decrescente de quantidade. Se os primeiros forem “água” e “açúcar”, a fruta está em menor proporção. Há, também, que estar atento ao teor de fruta (em percentagem), já que é obrigatória a sua menção no rótulo. Quanto mais alto este valor, melhor. Não deve também escapar à nossa análise a menção a aditivos ou edulcorantes. O consumidor deve procurar ingredientes como “acessulfame-K”, “sucralose”, “aspartame” ou “aroma natural”. Finalmente, leia-se a declaração nutricional com particular atenção ao valor de açúcares por 100 ml. Mesmo sem adição de açúcar, pode conter mais de 10 g de açúcares naturais por dose.
Podemos afirmar que escolher o consumo de um néctar é uma atitude saudável?
Apesar de parecerem mais saudáveis do que refrigerantes e refrescos, os néctares são, na maioria dos casos, caloricamente densos e nutricionalmente pobres. A fibra da fruta é eliminada durante o processamento, e o valor vitamínico pode ser reduzido, obrigando à adição de vitaminas sintéticas para compensar. Sublinho que beber um néctar não substitui comer uma peça de fruta. A saciedade é menor, e o índice glicémico pode ser mais elevado.
De que forma a legislação portuguesa sobre néctares de fruta estabelece limites e requisitos, e como as estratégias de marketing e tecnologia de produção podem influenciar a perceção do consumidor, mesmo quando cumprem tecnicamente a lei?
A legislação estabelece parâmetros, mas não impede que a publicidade utilize estratégias visuais e linguísticas que possam induzir em erro. Frases como ‘com fruta natural’ ou ‘com polpa de fruta’ são tecnicamente verdadeiras, mas omitem a proporção ou o grau de processamento da mesma.
Também a expressão “sem adição de açúcar” pode ser enganadora: a bebida pode continuar a ser rica em açúcares naturalmente presentes — e em alguns casos adoçada com edulcorantes artificiais, cuja presença é mencionada em letra pequena. Contudo neste caso, legalmente, não pode conter a menção “sem adição de açúcar”. Verificamos, sim, que atualmente existem muitos rótulos que estão em incumprimento.
Acresce que a palavra “natural” não tem definição legal uniforme para este tipo de produto, o que permite o seu uso mesmo em bebidas altamente processadas.
Alexandra Costa (Engenheira alimentar)
Imagem de abertura do artigo cedida por Freepik.
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