O número de investigações com resultados positivos aumenta, especialmente em relação a outros métodos de tratamento que não funcionam.

"Temos uma necessidade urgente de novos tratamentos para a depressão grave e a quetamina é promissora", resume à AFP a investigadora australiana Julaine Allan, especializada em saúde mental.

A quetamina não é um antidepressivo clássico como os desenvolvidos desde a década de 1960. É, em princípio, um anestésico, mas, há cerca de 20 anos, os psiquiatras a consideram uma possível solução contra a depressão.

Ao contrário dos antidepressivos comuns, a quetamina atua de forma rápida, embora não se saiba de modo exato quais os mecanismos fisiológicos que desencadeia para aliviar os sintomas depressivos.

Portanto, parece promissora em dois casos principais: quando há necessidade de tratamento específico e urgente, principalmente face a crises suicidas, mas não apenas nesses espisódios. E, também, quando nenhum medicamento clássico funciona, isto é, nos casos da chamada depressão resistente.

Nos últimos meses, vários estudos publicados em revistas de prestígio confirmaram o interesse na quetamina para este tipo de situações.

Um estudo publicado em abril no British Medical Journal mostra como o risco de depressão pós-parto em mães jovens foi reduzido após receberem uma dose única de escetamina, um derivado da quetamina, no nascimento do bebé.

No segundo caso, um estudo publicado, esta segunda-feira, dia 24 de junho, na Nature Medicine mostra que o tratamento com quetamina evitou mais recaídas depressivas em comparação com pacientes que receberam tratamento com placebo.

A pequena testagem de amostras (pouco mais de 100 pessoas) e alguns aspectos metodológicos sugerem que é muito cedo para tirar conclusões firmes.

Mas estes estudos alimentam um corpus favorável ao uso da quetamina contra a depressão, benefício que já não gera muitas dúvidas entre os psiquiatras.

Nova crise de opioides?

"Deve ser considerado um intermediário entre os antidepressivos clássicos e os eletrochoques", sendo este último utilizado em pacientes cujos tratamentos clássicos não funcionam, explica à AFP o psiquiatra de Genebra Michel Hofmann.

Para o especialista, este é um verdadeiro "entusiasmo" na comunidade médica.

Ainda que a escetamina tenha sido aprovada há vários anos nos Estados Unidos e na Europa para certas depressões, alguns psiquiatras continuam relutantes.

Sem negar a eficácia da quetamina, estes especialistas temem o risco de dependência, especialmente porque a molécula é muitas vezes desviada como droga, uso infelizmente coberto pela media devido à morte por overdose de personalidades como o ator americano Matthew Perry, conhecido pelo seu papel na série Friends.

"Será que a quetamina será administrada em breve a pacientes com pensamentos suicidas? É difícil dizer, pois existe um risco real de que o uso extensivo de quetamina provoque uma nova crise de opioides", alertou o psiquiatra Riccardo De Giorgi em 2022 no BMJ, em referência à crise de saúde que causou centenas de milhares de mortes nos Estados Unidos devido ao uso indevido ou excessivo de certos medicamentos.

O desafio é, portanto, reduzir o risco de abuso, assim como os efeitos colaterais graves, como o aparecimento de perturbações dissociativas de personalidade.

Este é o grande interesse do estudo publicado pela Nature Medicine: testar uma nova forma de administração de quetamina, por meio de um comprimido que libera progressivamente o tratamento no organismo.

Potencialmente, este uso é mais prático e menos arriscado do que um tratamento intravenoso ou um spray nasal, as duas formas sob as quais a escetamina está atualmente aprovada.

O estudo oferece resultados promissores deste ponto de vista, embora, mais uma vez, precise de confirmações.

"Os pacientes relataram poucos efeitos colaterais: euforia, dissociação...", disse à AFP o autor principal Paul Glue.

"Portanto, não creio que esses comprimidos atraiam pessoas que queiram abusar da quetamina", concluiu.