“Na região não há consulta descentralizada e estas pessoas têm de esperar entre os seis meses e um ano por uma consulta e pelo tratamento num hospital em Lisboa e acabam por desistir, porque são, na sua maioria, pessoas pertencentes a grupos de risco e não têm essa preocupação”, apontou Madalena Malheiros, presidente e diretora técnica da Acompanha, à agência Lusa.
“Os trabalhadores do sexo deslocam-se por Portugal e não estão sempre na mesma região. O mesmo acontece com os homens que têm sexo com homens. Para a população sem-abrigo, a preocupação não é ter uma hepatite, mas sim comer e ter um abrigo e, portanto, rastreamos, detetamos a infeção, mas depois não há sequência”, explicou a responsável.
Esta instituição de Peniche, que tem outros projetos de acompanhamento de grupos de risco, está, desde março e até ao final do ano, a avançar naquele concelho, rastreando esses grupos, desde pessoas que utilizam drogas não injetáveis e injetáveis, dadores de sangue, dadores de órgãos, hemodialisados, população em situação de reclusão, homens que fazem sexo com homens, trabalhadores do sexo e seus clientes, população sem-abrigo e migrantes.
A responsável alertou que existe uma maior prevalência das hepatites B e C em portadores de HIV, porque “os comportamentos de risco destas pessoas são muitos”.
Entre agosto de 2015 e junho deste ano, a Acompanha realizou 5052 testes ao HIV, 4184 à sífilis, 3010 à hepatite C e 2765 à hepatite B e rastreou 60 pessoas com hepatite C, 50 com HIV, cinco com a hepatite B e quatro com sífilis.
O problema detetado na falta de rastreio e de acompanhamento das hepatites virais no Serviço Nacional de Saúde (SNS) serviu de tema para o trabalho de internato da médica de saúde pública Patrícia Pita Ferreira e para o desenvolvimento do projeto “Hep-ØN – Micro-eliminação das Hepatites Virais” no Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) Oeste Norte, que abrange os centros de saúde de Caldas da Rainha, Alcobaça, Bombarral, Óbidos, Nazaré e Peniche, no distrito de Leiria.
O projeto é apresentado hoje, Dia Mundial contra as Hepatites.
A equipa técnica pretende sensibilizar os médicos de família e os cidadãos para a doença e melhorar a resposta a dar pelo SNS.
“As doenças do fígado são doenças que passam um bocadinho ao lado, mas a verdade é que são uma causa importante de mortalidade e, portanto, queremos alertar que são doenças que têm teste, têm tratamento e, no caso da hepatite C, têm cura”, disse a médica.
A prioridade passa por prescrever o teste para a deteção da hepatite B e C “pelo menos uma vez na vida a todos os utentes do ACES Oeste Norte quando forem a uma consulta do médico de família, por outro motivo qualquer, e aproveitar uma análise sanguínea para também fazer o teste”.
Depois, quer acompanhar o tratamento destes doentes, através da criação da consulta descentralizada de hepatites virais nos centros de saúde da região.
A equipa técnica pretende aumentar em 33% o rastreio até 2024, encaminhar e acompanhar 50% dos utentes com rastreio positivo e iniciar o tratamento a 75% dos doentes.
O projeto tem em conta as metas da Organização Mundial da Saúde até 2030: reduzir as novas infeções por hepatites virais em 90% e reduzir as mortes atribuídas a estas hepatites virais crónicas em 65%, o que permitiria reduzir por ano de um milhão para 500 mil as pessoas que morrem por ano com estas doenças e das 800.000 para as 100.000 novas pessoas infetadas.
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