Num mundo cada vez mais moderno e numa sociedade progressivamente mais assoberbada de tecnologia e exigências, os estímulos a que estamos sujeitos são cada vez mais. Não é raro haver pessoas com dificuldade em concentrar-se, terem dificuldade em organizar o dia, serem impulsivas e dispersarem-se facilmente. Mediante um enquadramento clínico, estas características podem ser atribuídas à Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA), uma condição que afeta pessoas de qualquer idade (ainda que se inicie ainda em criança!).
O que é PHDA?
A PHDA é uma condição neuropsiquiátrica tipicamente caracterizada por inquietação e dificuldade em manter a atenção, embora possa apresentar outros sintomas de natureza mais subtil. Por razões tanto genéticas como ambientais, resulta de alterações do neurodesenvolvimento. É por esse motivo que é uma condição frequentemente associada às crianças. No entanto, a PHDA pode persistir até à idade adulta, afetando significativamente a vida pessoal, académica e profissional das pessoas que a vivenciam.
Enfrentar estereótipos
Uma vez que a PHDA é frequentemente associada a comportamentos hiperativos e impulsivos, muitas pessoas têm uma visão estereotipada da condição. Acontece que, além destes sintomas, há outras características como a nossa personalidade e a nossa inteligência que influenciam a forma como cada pessoa com PHDA vai aprendendo a lidar com os seus sintomas ao longo da vida. Esquecimentos frequentes, perda de objetos, dificuldade em esperar, instabilidade emocional, dificuldade em relaxar, precipitar respostas nas conversas, dificuldade em gerir o tempo e precisar de listas ou rotinas para garantir a funcionalidade, podem ser sintomas que, consoante uma avaliação clínica completa, podem configurar uma PHDA. No entanto, traços de personalidade de perfecionismo e estratégias adaptativas eficazes podem ser “bengalas” que fazem alguns sintomas da PHDA passar despercebida durante anos. Uma avaliação e uma abordagem clínicas adequadas podem ser fundamentais na prevenção de uma espiral de outras condições de saúde mental associadas, dos mais variados tipos, como sintomas depressivos, de ansiedade, alterações do sono ou até adição a jogos, álcool e drogas. Infelizmente, não é raro que cheguem à consulta pessoas que apresentam perturbações de ansiedade ou perturbações depressivas e que, de base, têm também uma PHDA. Por estes motivos, pode acontecer que só em idade adulta é que a PHDA é diagnosticada.
Derrubar mitos
Embora não haja uma cura para a PHDA, existem formas eficazes de lidar com os seus sintomas, quer psicoterapêuticas quer farmacológicas. No entanto, infelizmente, a PHDA é ainda mal compreendida, muitas vezes subdiagnosticada e rodeada de estigma. Algumas pessoas acreditam erradamente que é apenas uma desculpa para comportamentos indisciplinados, desviantes, para a desarrumação, preguiça ou que não existe na idade adulta. Já outras pessoas acreditam que é uma forma de “medicalizar” comportamentos. No entanto, sabemos que esta doença tem bases biológicas claras, em relação a neurotransmissores, áreas cerebrais e genes envolvidos, sendo inclusive uma doença com uma predisposição hereditária. É fundamental desmistificar esses preconceitos e promover a empatia e a inclusão daqueles que têm PHDA. Além disso, o apoio emocional e a compreensão por parte da família e dos amigos, assim como a promoção da literacia sobre esta condição são essenciais.
A importância da sensibilização
Para criar uma sociedade mais acolhedora e compreensiva, a sensibilização e a informação desempenham um papel crucial. Felizmente, cada vez mais têm sido criadas iniciativas de sensibilização para a PHDA, incluindo associações e páginas de comunidades nas redes sociais. Também algumas celebridades têm admitido condições de saúde mental. No caso da PHDA, muito recentemente a artista luso-canadiana Nelly Furtado terá admitido o seu diagnóstico já em idade adulta. Iniciativas como estas podem aumentar a literacia da população em saúde e podem ser nucleares na forma como encaramos estas doenças, como compreendemos as pessoas e a estarmos mais atentos a elas.
Um artigo do médico Hugo Canas Simião, especialista em Psiquiatria.
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