HealthNews (HN)- O mês de julho foi o mês mais quente do planeta e os mosquitos com Dengue e Zika já circulam pela Europa. Quais os riscos que o aparecimento desta doenças infectocontagiosas acarreta para a saúde das populações?
Miguel Castanho (MC)- Estas doenças e vírus são bem conhecidos. Apesar de Dengue não ser uma doença que causa uma mortalidade muito elevada em relação ao número de pessoas infetadas, o problema é que às vezes são muitas pessoas a necessitar de cuidados de saúde ao mesmo tempo. Havendo muita gente infetada podemos assistir a casos de invasão do Sistema Nervoso Central, acompanhados do síndrome de Guillain-Barré (com danos neurológicos) e casos de febre hemorrágica.
No caso do vírus Zika, este não acontece de forma tão generalizada. No entanto, pode chegar a provocar os mesmos danos que o Dengue. Por outro lado, este vírus tem o problema de conseguir atravessar a barreira placentária das mulheres grávidas, causando problemas de desenvolvimento neurológicos nos fetos. Portanto, muitas crianças nascem com microcefalias.
HN- As consequências podem ser nefastas, agravadas ainda pela falta de soluções terapêuticas eficazes.
MC- Nenhum destes dois vírus tem soluções terapêuticas muito eficazes. No caso do Dengue, existe uma vacina, mas que tem algumas limitações. No caso do Zika não existe qualquer opção terapêutica.
Não havendo antivirais ou vacinas, a solução passa por combater os mosquitos que transportam os vírus.
HN- Este ano a Organização Mundial da Saúde alertou que a Europa, nomeadamente Portugal, enfrentaria o risco de surtos de Dengue, Zika e febre chikungunya no verão. A que se deve este fenómeno?
MC- Existe alguma discussão sobre o assunto… Aquilo que se sabe, de facto, é que as populações de mosquitos estão a alastrar. Se no passado estavam confinadas nas regiões mais tropicais, hoje em dia estas populações têm vindo a expandir-se. A espécie Aedes albopictus está a demonstrar uma grande capacidade de adaptação a outros ambientes.
Mas respondendo à pergunta, porque é que as espécies estão em expansão? Esta discussão está em curso na comunidade científica, mas há quem defenda que tem a ver com o aquecimento global e há quem acredite que tem a ver com a grande mobilidade de pessoas e mercadorias. A fiscalização menos rigorosa das mercadorias poderá favorecer à entrada de mosquitos numa determinada zona. Apesar de não se saber qual é o peso de cada um dos fatores, a verdade é que estão a funcionar todos em conjunto. É um facto que os mosquitos da espécie Aedes albopictus já estão a circular por toda a Europa.
HN- A nível da prevenção. Qual a importância da consulta do viajante?
MC- Está é indicada, sobretudo, para as pessoas que viajam para zonas endémicas. Portanto, a consulta serve para a proteção da própria pessoa. O médico aconselha a adoção de medidas para evitar ser picado por estes mosquitos.
HN- Voltando à circulação destas espécies na Europa. As autoridades sanitárias têm afirmado estar atentas, mas o que está a ser feito para prevenir a propagação destas doenças?
MC- Os mosquitos já se instalaram na Europa, já há populações que vivem no nosso continente. A questão que se coloca é o que é que pode ser feito a nível das populações. Os especialistas aconselham a não ter reservatórios de água parada, de forma a evitar a multiplicação de mosquitos. Por outro lado, é aconselhado o uso de repelentes e cobrir o corpo. Nós, em 2012, tivemos um surto de Dengue na Madeira e portanto já vimos estes pré-avisos.
HN- Atualmente, Portugal está preparado em caso de surto?
MC- A Direção-Geral da Saúde é que está melhor preparada para responder, mas o que posso dizer é que nós somos maus a planear a longo prazo… Tipicamente tendemos a remedir do que a antecipar. Pelo menos, em Portugal temos disponível a vacina contra o Dengue, o que significa que estamos mais prevenidos nesse sentido. Agora, se temos ou não um plano para enfrentar um surto tenho algumas dúvidas.
Contudo, em termos de instalação dos mosquitos, Portugal não é dos piores países da Europa provavelmente por estar muito próximo do oceano Atlântico. Portanto, o nosso país não é o local provável para o início de um grande surto europeu.
HN- O Dia Mundial do Mosquito assinala-se este domingo, qual a mensagem que gostaria de deixar?
MC- É muito importante conhecer os riscos. O conhecimento é sempre a melhor arma. Portanto, uma população informada e consciente é essencial. Não podemos deixar de estar atentos ao que se passa no domínio científico e devemos contribuir para a investigação.
Por outro lado, é muito importante promover o conhecimento sobre a interação entre vírus, mosquitos e humanos. Se não compreendermos aquilo que é básico também não conseguimos desenvolver soluções terapêuticas. Continuamos a usar soluções mais básicas e que provavelmente já eram aquelas dos nossos avós… Não conseguimos evoluir nada nas últimas décadas.
Entrevista de Vaishaly Camões
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