A entreajuda e o esforço dos médicos e enfermeiros no apoio a estes doentes foram testemunhados por uma equipa de reportagem da agência Lusa que teve a oportunidade de entrar naquela unidade depois de passar por um rigoroso processo de fardamento e de desinfeção.
Nos cuidados intensivos do Serviço de Medicina Intensiva do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN) não podem entrar telemóveis. Todos os pedidos de medicamentos, equipamentos, de reforço de médicos ou enfermeiros são feitos por um serviço de rádio para garantir a máxima segurança.
Alguns doentes estão isolados num quarto, outros dividem uma sala com várias camas com o distanciamento necessário. Todos estão entubados, ventilados, e com o ritmo cardíaco monitorizado, através de um aparelho que apita à mínima alteração e alerta o enfermeiro, que assiste logo o doente.
Todos os doentes são homens, a maioria com idades mais avançadas. Entre eles está o primeiro paciente com covid-19 internado no Hospital Santa Maria há mais de 20 dias.
“Ainda está entubado, ventilado e tem um percurso clínico” prolongado, mas que “reproduz o que tem sido divulgado e partilhado pela comunidade médica e que, no fundo, é a experiência que temos tido em vários países relativamente a esta doença”, disse à Lusa o diretor do Serviço de Medicina Intensiva, João Miguel Ribeiro.
O doente está na casa dos 50/60 anos e não tinha doenças prévias significativas, o que ilustra a preocupação que existe na comunidade médica de que esta patologia, “embora claramente afete faixas etárias mais elevadas”, pode também “ganhar expressão” em doentes relativamente novos e sem comorbilidades, sublinhou.
O risco de contagiosidade e infecciosidade desta doença implicou uma “exigência acrescida” por parte dos serviços médicos, das estruturas hospitalares e da própria comunidade, disse o médico.
Foram criadas zonas de contenção nos hospitais e a necessidade de os profissionais usarem equipamentos de proteção especial que, no caso dos cuidados intensivos, obriga a um ritual rigoroso.
Antes de entrarem, os profissionais têm de despir a sua roupa, que fica guardada num balneário improvisado. De seguida, vestem um fato médico e colocam o equipamento de proteção: bata, óculos, viseira, touca, dois pares de luvas e coberturas para o calçado.
Já devidamente equipados e desinfetados, os elementos da equipa, maioritariamente enfermeiros, entram na unidade onde começa um árduo trabalho para salvar os doentes.
A Lusa pôde assistir à colocação de um doente em posição de “decúbito ventral” para melhorar a sua oxigenação que obrigou a um verdadeiro trabalho de equipa.
No final, uma enfermeira precisou de abrir por segundos uma janela para respirar o ar vindo da rua e quebrar a pressão que às vezes se sente naquele espaço, onde se luta pela vida, mas onde também impera a serenidade e a camaradagem entre a equipa.
À saída do turno, o ritual de retirar o equipamento ainda é mais exigente, porque por cada peça retirada é preciso desinfetar as mãos.
No dia da reportagem da Lusa, segunda-feira, estavam internados 20 doentes com necessidade de cuidados intensivos,
“Este número tem sido constante nos últimos dias, embora em absoluto não reflita a dinâmica dos internamentos”, disse João Miguel Ribeiro, acrescentando: “Temos tido oportunidade e a felicidade de poder transferir os doentes, porque melhoraram, para a enfermaria”.
Em média, são admitidos um ou dois doentes por dia no serviço, que continua a ter doentes sem covid-19, com doenças de diversos foros que também dependem destes cuidados.
Segundo João Miguel Ribeiro, o serviço ainda tem capacidade de resposta e o CHULN está a trabalhar “ativamente para crescer essa reserva”, contando ter esta semana mais dez camas, totalizando 56.
Ainda não há profissionais em sobrecarga porque o serviço antecipou essa realidade: fez “um trabalho de preparação e de formação” e neste momento “não há nenhuma evidência de saturação ou de sobrecarga física ou psicológica”.
“Agora sei que essa realidade, com a manutenção e até com a intensificação da expressão deste surto pandémico, vai ser inevitável e, portanto, em certa medida isso é uma realidade que também não vamos conseguir escapar”, concluiu o médico.
Em Portugal, segundo o balanço de quarta-feira da Direção-Geral da Saúde, registaram-se 380 mortes, mais 35 do que na véspera (+10,1%), e 13.141 casos de infeções confirmadas, o que representa um aumento de 699 em relação a terça-feira (+5,6%).
O país, onde os primeiros casos confirmados foram registados no dia 02 de março, encontra-se em estado de emergência desde as 00:00 de 19 de março e até ao final do dia 17 de abril, depois do prolongamento aprovado na quinta-feira na Assembleia da República.
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