O último alerta refere-se a uma forma atípica da doença de Kawasaki: pediatras questionam-se sobre vários casos de crianças, algumas com testes positivos para o vírus SARS-CoV-2, que apresentam estados inflamatórios "multissistémicos".

A doença de Kawasaki, descrita pela primeira vez em 1967 no Japão, afeta principalmente crianças pequenas. A sua origem não é conhecida com precisão e pode misturar fatores infecciosos, genéticos e imunológicos. No entanto, o vínculo com o novo coronavírus ainda não está estabelecido.

Antes destas novas interrogações, a doença COVID-19 era reputada, nos casos graves, por causar síndromes respiratórias agudas graves e atacar principalmente idosos e adultos com fatores de risco como diabetes, hipertensão, excesso de peso, insuficiência cardíaca ou respiratória.

Pode atacar quase tudo no corpo com consequências desastrosas

Semana após semana, os profissionais da saúde descobrem novas peculiaridades e complicações associadas a esta nova doença.

A COVID-19 "pode atacar quase tudo no corpo com consequências desastrosas", disse Harlan Krumholz, da Universidade de Yale, à revista científica americana Science.

Este cardiologista encarregado de recolher dados clínicos sobre a doença nos Estados Unidos, acrescenta: "a sua ferocidade é impressionante e convida à humildade".

"Tempestades de citocinas"

Nas suas formas graves, os médicos perceberam que a doença pode levar a uma resposta imune descontrolada, provocando "tempestades de citocinas" que podem levar à morte. Descrito há apenas vinte anos, esse fenómeno foi observado para outros coronavírus (SARS em 2003, MERS em 2012) e é suspeito de explicar a carnificina da "gripe espanhola" em 1918-19 com quase 50 milhões de mortos.

Parte da pesquisa terapêutica aplica-se precisamente à tentativa de travar essa reação exagerada do sistema imunitário, como é o caso de um medicamento imunomodulador, o tocilizumabe, realizado em França.

Danos neurológicos

A perda do olfato e, em menor grau, do paladar tornou-se um dos marcadores mais confiáveis e distintos da doença. Ao mesmo tempo, observações clínicas apontam para possíveis danos neurológicos ligados ao coronavírus em certos casos graves.

Um estudo observacional realizado no hospital de Estrasburgo, publicado a 15 de abril no New England Journal of Medicine (NEJM), mostrou uma proporção significativa de pacientes que sofrem de agitação e confusão após serem tratados com terapia intensiva.

Mas "faltam dados para determinar" se esses distúrbios são devidos aos efeitos da gravidade da doença com as suas tempestades imunológicas, à própria infeção viral ou consequência dos cuidados intensivos, de acordo com o estudo.

No início de abril, no entanto, uma equipa japonesa relatou a presença de traços de coronavírus no líquido cefalorraquidiano de um paciente com COVID-19 que desenvolveu meningite e encefalite, sugerindo que o SARS-CoV-2 pode penetrar no sistema nervoso central.

Complicações cardiovasculares

Mais e mais estudos - principalmente observacionais, por enquanto, sem explicação precisa e irrefutável - indicam um alto nível de complicações cardiovasculares entre os casos graves de COVID-19.

No final de março, um estudo publicado na revista americana JAMA documentou danos cardíacos em 20% de um grupo de mais de 400 pacientes hospitalizados em Wuhan, China.

Ao mesmo tempo, foi observado a formação anormal de coágulos no sangue de uma parte dos pacientes: um estudo holandês em um grupo de quase 200 pacientes mostra que essa é uma característica de um terço deles.

A presença de coágulos na corrente sanguínea pode ter como consequência dramática um acidente vascular cerebral, embolia pulmonar ou ataque cardíaco. "Essa coagulação não se parece com a habitual", disse Shari Brosnahan, médica no hospital de Nova Iorque NYU Langone.

Mais e mais clínicos e investigadores acreditam que esses coágulos sanguíneos desempenham um papel importante na gravidade e mortalidade da COVID-19. Mas a ligação entre coágulos e o vírus SARS-CoV-2 permanece um mistério, porque pode estar ligada mais uma vez à tempestade inflamatória que atinge alguns pacientes.