Começa a revelar-se na infância e torna-se dramático na adolescência. A forma mais eficaz de corrigir o prognatismo é através de cirurgia. É difícil solucionar este problema através de outro tipo de tratamentos, garantem muitos especialistas. O momento ideal para a fazer é a partir dos 17 anos. Algumas pessoas demoram a decidir-se pela cirurgia mas os benefícios são significativos e proporcionam uma face mais harmoniosa.
Neste artigo, falamos-lhe do prognatismo, uma alteração na mandíbula que, além de incómoda, é inestética. "Caracteriza-se por um aumento da projeção anterior da mandíbula. A pessoa tem o maxilar inferior muito projetado para fora e para a frente", descreve Biscaia Fraga, diretor da Clínica Biscaia Fraga, em Lisboa. Em tempos que já lá vão, esta era uma característica comum entre alguns nobres.
Há quem lhe chame até mandíbula de Habsburgo, devido à prevalência desta manifestação nessa família real europeia, uma espécie de malformação causada pelo grande número de casamentos consanguíneos. O prognatismo, que afeta milhares de pessoas em todo o mundo, interfere funcionalmente com a mastigação e com a articulação dentária, porque os dentes de cima não encaixam nos de baixo.
"Este problema causa constrangimentos importantes na vida da pessoa", realça Biscaia Fraga. Quer funcionais quer, sobretudo, estéticos, como realça o especialista português. Não só pela "alteração do próprio articulado dentário [oclusão em mordida aberta inferior] mas também do perfil da face [face côncava] e ainda pelo aumento da dimensão vertical da face", como descreve o cirurgião plástico.
Qual é a causa?
Trata-se de uma doença do desenvolvimento da face que pode ter natureza familiar mas que, noutros casos, evidencia fatores diversos "como hormonais, traumatismos, malformações congénitas, parafunções e hábitos adquiridos, entre outros". A dada altura, dois casos tratados cirurgicamente por Biscaia Fraga, um com 20 anos de idade e outro com 22 anos, tinham sido submetidos a tratamento em crianças com hormona do crescimento.
Outros casos também tratados pelo especialista diziam respeito a um crescimento anormal da mandíbula por tumor de vasos sanguíneos (hemangioma da face) que conduzem a um maior aporte de elementos nutritivos e oxigénio para o osso, induzindo maior crescimento.
Outros casos resultaram de queimaduras graves da face e pescoço que provocaram tracção esquelética. São ainda de referir situações em que se destacam alterações esqueléticas da face por traumatismos na infância e outras que se devem a anormais desenvolvimentos da estrutura óssea.
O papel dos dentistas
Muitas vezes, este problema é detetado, em primeiro lugar, pelos médicos dentistas ou estomatologistas. "São eles que começam por diagnosticar a situação que, em muitos casos, não conseguem resolver com a ortodontia e métodos ortopédicos" e, diz-nos o cirurgião plástico, encaminham os doentes para a cirurgia plástica e para a cirurgia maxilo-facial. Além do diagnóstico, o dentista faz a preparação dentária e o estudo da articulação.
"São realizados tratamentos dentários das cáries existentes ou eventuais extracções que sejam necessárias, bem como melhor orientação do desenvolvimento dentário", explica Biscaia Fraga. "Realizam ainda um estudo cefalométrico à escala real para planear [com um programa informático e recurso a película radiológica] a futura face», refere ainda o especialista. Neste estudo, o cirurgião obtém informação crucial.
Fica a saber quantos milímetros deve recuar a mandíbula e/ou o número de milímetros que se pode avançar no maxilar superior. Solucionar o problema implica uma equipa multidisciplinar. "Quando o doente chega à minha consulta, já é enviado pelo estomatologista com todos os exames realizados e o estudo cefalométrico efetuado. É também este especialista que faz os moldes dentários, muito importantes para o planeamento da cirurgia", sugere.
Os cuidados pré-operatórios que o procedimento exige
O primeiro passo assenta na preparação da boca e dentes e na educação para uma higiene oral adequada antes e após a cirurgia. Depois, então, é realizado um planeamento adequado e rigoroso da cirurgia. "O estomatologista que estudou o doente previamente vai necessitar de acompanhar este paciente durante um a três anos", diz Biscaia Fraga. "Se o doente é um adolescente, a sua dentição está em fase evolutiva", diz.
"Aos 17 anos, já deve estar preparado para realizar a cirurgia porque a face nesta idade tem o desenvolvimento aproximado ao do adulto", acrescenta. "Este doente precisa de ser posteriormente acompanhado, pois há dentes que necessitam de ser esculpidos para um melhor articulado", explica ainda o cirurgião plástico. No que diz respeito aos cuidados pré-operatórios propriamente ditos, há cuidados a ter.
O doente não pode tomar anticoagulantes, ácido acetilsalicílico ou antiagregantes plaquetários antes e durante a cirurgia. Para além disso, se o doente tiver alguma doença do foro alérgico, o cirurgião deve ser devidamente informado. "Se se tratar de um asmático grave, por exemplo, a cirurgia implica cuidados especiais porque é necessário que as vias áreas estejam completamente desobstruídas para o sucesso da mesma", conclui Biscaia Fraga.
Os possíveis incómodos que podem surgir
Após a cirurgia, não há propriamente dor mas sim incómodo provocado pelo inchaço e na mastigação. "Durante uma semana, os lábios e a face ficam inchados", refere. Pode haver, durante algumas semanas, diminuição da sensibilidade no lábio inferior e parte da boca e "também pode haver uma ou outra nódoa negra nas pálpebras inferiores e existir dificuldade em respirar pelo nariz", explica Biscaia Fraga.
Para além disso, como a face é muito irrigada durante a cirurgia, podem surgir posteriormente algumas hemorragias. A obstrução parcial das vias aéreas superiores também costuma ser incómoda para os pacientes. Para resolver a questão da dificuldade respiratória, o médico prescreve anti-histamínicos e sugere ainda que se coloque gelo na face para desinchar mais rapidamente e a cabeça deve manter-se elevada.
"Uma verdadeira terapêutica é comer dois a três gelados por dia, porque alivia imenso a garganta", sugere Biscaia Fraga. Os pacientes devem tomar antibiótico durante uma semana. "Posso afirmar que esta correção cirúrgica, pela experiência clínica que tenho, pode transformar uma face deformada, com dramática repercussão psicológica e social, numa realidade harmoniosa, atrativa e com grande alegria de viver", reforça Biscaia Fraga.
Texto: Cláudia Pinto com Biscaia Fraga (cirurgião plástico)
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