Na busca, na descoberta e nos desencontros com o prazer, há coisas que a prática, a tentativa e o erro nos ensinam e outras que só os especialistas sabem. Contam os manuais de sexualidade que, por norma, é nesta sequência que se desenrola aquilo a que muitos chamam "o ciclo da resposta sexual humana". Mas, na prática, o sexo e o prazer, o seu ponto de partida e de chegada, o seu fio condutor, tão simples quanto intrincados, podem não cumpri-la à risca.

"Embora, durante muito tempo, o desejo tenha marcado presença neste modelo de três fases, a prática mostra algo diferente. Muitas pessoas envolvem-se sexualmente sem grande ou nenhuma vontade e, com a tomada de iniciativa pelo parceiro, essa vontade e a excitação acabam por aparecer", referiu Jorge Cardoso, psicólogo clínico, na sua intervenção na reflexão "Prazer feminino versus prazer masculino", no evento Inspire Saúde, em Lisboa, em 2015.

Tantas vezes tido como sinónimo de orgasmo e pode não o ser, o prazer continua a ser tão competente em aproximar homens e mulheres como em separá-los. Mas porquê? Em todo o mundo, muitos especialistas têm procurado responder à questão. "O sexo passa muito por um ser humano mostrar a sua sexualidade a outro para lhes permitir descobrirem a deles", considera o coach de relações Roberto Hogue. Descubra, de seguida, quatro formas de o fazer.

Conheça a sua anatomia

Há alguns anos, Ana Carvalheira, psicoterapeuta, perguntou a 4.000 portuguesas como se apercebiam que estavam excitadas. "As respostas foram incríveis", recorda. "Menos de 20% das inquiridas disseram que sentiam excitação por ter a vagina húmida ou por ter sensações genitais físicas", refere. "As mulheres estão desligadas do corpo. Somos cada vez mais cerebrais, analisamos tudo mas a análise espanta o desejo e a excitação", defende mesmo a especialista.

O que sabemos sobre "o ator principal na cena do orgasmo feminino", como o caracteriza, é, talvez, o melhor exemplo desta premissa, como ilustrou a oradora convidada do evento Inspire Saúde, que atraiu curiosos ao Centro Cultural de Belém, em Lisboa. "A genitália feminina é complicada, está tudo escondido mas, ainda que o clitóris seja uma estrutura interna, com entre 7 a 10 centímetros por norma, pode  ser estimulado por pressão", refere Ana Carvalheira.

"É, por isso, que algumas posturas [sexuais] são mais interessantes para a mulher do que outras [como a postura em que ela fica por cima]", afirma ainda a especialista. O corpo também muda e, na menopausa, "é preciso um toque direto", sublinha Maria do Céu Santo, médica ginecologista. "O clitóris tem uma espécie de prepúcio que, nesta fase, tende a colar e, por isso, é fundamental acioná-lo com um lubrificante vulvar", acrescenta esta conceituada especialista.

Priorize e inove sem receios

Não tenha medo de o fazer. "Para as mulheres, o prazer é algo que se conquista, descobre e persegue. Mas elas estão muito menos treinadas na perseguição do prazer sexual.  Têm de o querer, têm de o reclamar como algo importante na sua vida", defende Ana Carvalheira. Segundo esta especialista, "as mulheres têm de aprender a descontrolar-se, a entregar-se, em deixar-se ir". Jorge Cardoso acrescenta outras pistas, válidas para os dois géneros.

O psicólogo clínico e terapeuta sexual não tem dúvidas. "O sexo dá-se bem com duas coisas, novidade e transgressão, sendo que novidade não significa acasalar com um novo parceiro todos os dias e transgressão não é sinónimo de violência ou de crime sexual". Por vezes, basta contrariar a(s) rotina(s), apostando em novos cenários em casa ou fora e/ou experimentando novas posições sexuais, como as que pode (re)ver na galeria de imagens que se segue.

 Jorge Cardoso não tem dúvidas. "Tudo o que tenha um sabor novo é sempre bem-vindo no sexo", sublinha o especialista. "Há quem tenha como fantasia concretizável, por exemplo, ter sexo em locais públicos ou semi-públicos, como é o caso de um elevador, o que mistura uma dimensão de privacidade com um risco calculado", refere o psicólogo clínico e terapeuta sexual. "E é esse risco que também potencia o desejo e o nível de prazer associado", realça ainda.

Ao poder da novidade, o terapeuta sexual acrescenta o da repetição. "É algo óbvio e que aprendemos desde sempre, mas tudo o que é gratificante é para repetir", recomenda mesmo Jorge Cardoso. O problema é que, nos dias que correm, absorvidos pelas muitas tarefas quotidianas dos dias que correm, muitos casais acabam por se esquecer de quão prazeroso pode ser o sexo, como têm apurado vários estudos internacionais desenvolvidos nos últimos anos.

Diga o que quer e como quer

Fale. Não tenha medo de se expressar. "Muitos dos problemas que as mulheres referem em consulta refletem falta de comunicação", conta Jorge Cardoso. Na realidade, revela o especialista, "muitos homens querem saber o que a elas lhes dá mais prazer e, muitas vezes, eles e elas fantasiam a mesma coisa, até estão em sintonia, mas quer um quer outro acha que não vai ter recetividade e não avança", acrescenta ainda o psicólogo clínico e terapeuta sexual.

É comum as mulheres estarem demasiado centradas no seu problema, reforça também Maria do Céu Santo. "Nas minhas consultas, algumas dizem-me que a relação não está bem naquele momento e que não sentem desejo [sexual] e eu pergunto-lhes se o seu marido está feliz mas muitas não sabem, não fazem ideia nenhuma do que ele gosta ou pensa", desabafa a coordenadora do Núcleo de Medicina Sexual da Sociedade Portuguesa de Ginecologia.

"Em vez de ficarem à espera que o outro adivinhe o que se quer, é urgente que ambos falem sobre erotismo, até porque os estímulos, os cliques são diferentes", acrescenta Ana Carvalheira. O tema deve ser abordado "como outro assunto qualquer", diz a investigadora. E, quando se passa à prática, há que perder a vergonha de dizer como se quer, aconselha Maria do Céu Santo. "Devemos ir orientando. Mais para a esquerda, mais para a direita... É fundamental", sugere.

Aproxime-se e afaste-se

Numa relação a dois, geralmente, um gosta mais do que o outro. "Um ama e outro deixa-se amar, o que não quer dizer que isso não mude ao longo da vida", descreve Maria do Céu Santo. À medida que a relação avança no tempo, o sexo, ao contrário do que se pensa, até pode melhorar. "Quanto temos um companheiro novo os níveis de excitação estão em alta, mas o orgasmo é menos intenso, devido à insegurança e ao desconhecimento do outro", diz.

"A intensidade do orgasmo é muito melhor numa relação de longa duração", acrescenta a especialista. Há estudos que o atestam. Um casal feliz neste campo é aquele que tem a capacidade de encontrar pontos de convergência mas também de criar espaços individuais, considera Maria do Céu Santo. "Não devem andar sempre colados, senão o desejo não respira", adverte. "Tem de haver oxigénio para a labareda", ilustra a médica ginecologista portuguesa.

Jorge Cardoso concorda. "O mais importante é aprender a viver em liberdade na relação e isso é fundamental, pois traz amor e traz desejo, embora seja muito difícil porque há questões ao nível do controlo", realça, todavia, o psicólogo clínico e terapeuta sexual. Esse é, de resto, um dos maiores desafios para as relações de hoje, sublinha Ana Carvalheira. "Há que dividir o poder, saber estar numa relação de igual para igual", defende a psicóloga clínica e psicoterapeuta.

Texto: Nazaré Tocha e Carlos Eugénio Augusto com Ana Carvalheira (psicóloga clínica e psicoterapeuta), Jorge Cardoso (psicólogo clínico e terapeuta sexual) e Maria do Céu Santo (médica ginecologista e coordenadora do Núcleo de Medicina Sexual da Sociedade Portuguesa de Ginecologia)