Antes de nos tornarmos pais era muito fácil fazer julgamentos sobre as formas de educar de outras famílias e apontar aquilo que nós faríamos de forma diferente. Limitar a televisão, não dormir na cama dos pais e, claro, a alimentação que daríamos aos nossos filhos.

Contudo, depois de termos filhos, tomamos consciência de que aquilo que defendíamos na teoria não é assim tão fácil de por em prática.

Felizmente os meus filhos comem literalmente tudo o que lhes puser à frente. Todos os legumes e vegetais, crus ou cozinhados, todos os tipos carne ou peixe, ovos, sementes, frutas, etc. Não têm as “esquisitices” de sabores ou texturas. Bem, nem tudo eles comem…como em casa se habituaram a não comer pão, massas, bolachas e outros alimentos refinados, começam naturalmente a rejeitar estes alimentos quando estão entregues aos cuidados de terceiros, apesar de terem essa opção.

Acredito que em parte se deveu à atitude que tivemos com as crianças, promovendo uma relação saudável, informada e de respeito para com os alimentos, com uma dose de paciência à mistura.

Compreendo que possa ser uma luta diária de muitos pais e que os leva quase ao ponto de desistirem. Pelo o cansaço e desespero, sem o quererem, acabam por permitir que os seus filhos tenham uma alimentação muito pouco variada, monótona e talvez com carências nutricionais. Isto ir-se-á tornar no seu padrão alimentar e poderão estar na base das escolhas que eles irão fazer quando forem autónomos. E isto claro, com maior ou menor impacto sobre a sua saúde no médio e longo prazo.

Por esse motivo partilho com todos os pais e educadores 21 dicas que usei ou aprendi de outros pais. Espero que possam ajudar neste processo e contribuir para que os vossos filhos possam alargar o repertório de alimentos e talvez até descobrirem um novo tipo de relação com a comida, em especial com alimentos saudáveis.

Aqui ficam as 21 sugestões:

1 – Deixe-os fazer parte do processo – Envolva os seus filhos em tarefas simples como misturar ou medir os ingredientes. Isto dá-lhes uma sensação de auto realização sobre algo que acham apenas restrito ao mundo dos adultos. Eles aprendem que têm o poder de criar algo, ao mesmo tempo que tomam contacto com alimentos saudáveis. Deixe-os explorar os alimentos com a mãos. Não se zangue se partir um ovo na bancada ou entornar um frasco de sementes. Nós fazemos o mesmo às vezes.

2 – Leve os seu filhos aos mercados e quintas biológicas – Leve-os a conhecer os processos por que passam os alimentos até chegarem ao prato. Programe uma visita a uma quinta biológica ou a um mercado tradicional. As crianças são tão curiosas que vão adorar estas visitas. Explique-lhes o papel dos agricultores e das pessoas que trabalham para podermos ter acesso a alimentos saudáveis. Aproveite ainda para explicar que os alimentos produzidos em fábricas, afastados da natureza, não são os melhores para nós. Hoje em dia estamos tão afastados da fonte dos alimentos que as crianças não chegam a criar uma relação consciente com os alimentos saudáveis.

3 – Dê-lhes algumas opções de escolha – Ao dar-lhes a hipótese de escolher entre duas ou três ideias para uma refeição está-lhe a dar alguma sensação de independência e responsabilidade, aceitando melhor depois as suas escolhas. Não se esqueça de os convidar a colaborar na confecção ou preparação.

4 – Decida o que está na cozinha – Somos nós, os pais, que compramos os alimentos que vamos ter na dispensa ou no frigorífico. Se começar a haver em casa cada vez mais alimentos saudáveis, as crianças vão se apercebendo que a única comida que podem pedir é aquela que existe disponível.

5 – Explique os benefícios dos alimentos em termos que eles entendam – De acordo com o entendimento possível par cada idade, explique-lhes como o que cada alimento pode fazer por eles. Como as nozes ajudar o cérebro a crescer, como as cenouras tornam os olhos bonitos e os brócolos ajudam os ossos a ficar fortes. De igual forma explique-lhe que os maus alimentos podem fazer o inverso.

6 – Minimize os snacks entre as refeições – Na maioria dos casos as crianças pedem snacks mesmo sem fome e depois tem menos apetite ou vontade para comer a refeição que irá lhe oferecer. No mundo ocidental às vezes a vontade de comer snacks não é mais que uma afirmação: “estou aborrecido e a comida entretém-me”. Isto é válido para adultos e crianças. Evite os sumos e bolachas. A sua maioria estão carregados de açúcar e não saciam a fome. Por outro lado viciam o paladar e programam o cérebro para pedir mais alimentos doces, rejeitando os restantes. Se eles têm fome entre as refeições, provavelmente precisam de fazer refeições com maiores quantidades e com alimentos de maior densidade nutricional.

7 – Leve-os a experimentar ou a dar apenas uma dentada – Sempre que possível introduza novos alimentos saudáveis e não desista à primeira. É um dos maiores erros que se pode fazer. Mesmo que eles não apreciem muito um alimento, garanta que comem pelo menos uma garfada. Isto feito regularmente e de forma consistente poderá tornar uma garfada em dez, e reduzir a resistência a esse alimento. Faça jogos como por exemplo, de olhos fechados, tentar perceber qual os sabores e texturas diferentes.

8 – Seja criativo – Torne a comida divertida. Componha os pratos com bonecos e formas engraçadas feitas com vegetais, legumes, sementes, etc. Experimente com os seus filhos novas formas de decorar os pratos.

9 – Tenha uma atitude positiva perante alimentos que não apreciam – Se a criança não gostar de um alimento que experimentou não faça disso um drama e jogue a seu favor. Diga que não faz mal e que tentarão de novo noutra altura, pois faz parte do “crescer”, aprender a gostar de novos sabores.

10 – Foque-se mais no que eles podem comer e menos no que não podem – Manter um discurso muito focado nas restrições e coisas que não podem comer poderá ter um efeito contrário ao que se pretende. Todos querem o fruto proibido. Fale antes das opções disponíveis e de tudo aquilo que pode comer.

11 – Não os suborne com sobremesas – Uma sobremesa saudável pode ser uma boa opção, mas tornar a refeição como um meio para atingir um fim ou recompensa irá criar maus hábitos. Quando a refeição corre melhor porque no fim há uma fatia de bolo ou um chocolate, cria-se um problema estrutural.

12 – Não seja tão restritivo – Tenha padrões elevados para a qualidade dos alimentos dos seus filhos, mas não seja demasiado rígido. Permita-lhes em eventos ocasionais como aniversários, festas ou de vez em quando comerem uma sobremesa ou outro tipo de comida menos saudável. As crianças que têm demasiadas restrições tem tendência para fazer más escolhas quando tiverem oportunidade.

13 – Use alternativas mais saudáveis aos grãos – Experimente usar farinhas nutritivas como as de amêndoa, coco ou aveia para fazer panquecas, bolos ou bolachas. Se possível deixe-os observar e ajudar.

14 – Esconda alimentos nutritivos em receitas – Numa fase inicial “esconda” alimentos saudáveis noutros que estão habituados a comer. Fazer por exemplo um puré de couve-flor em vez de batata (ou mistura de ambos). Na canja ou sopas, em vez de massas, utilize trigo sarraceno, sementes de girassol ou abóbora. Se comer carne, misture um pouco de fígado numa bolonhesa ou hambúrguer caseiro.

15 – Seja consistente e paciente – Estas dicas não são curas milagrosas para os nossos pequenos “esquisitos”. Tal como qualquer coisa no processo de educar, é necessário consistência e coerência.

16 – Relembre-os do tão valiosos que são – Ensine os seus filhos a amarem-se a eles próprios e por isso a incluírem alimentos saudáveis para o seu corpo. Se respeitamos o valor que o nosso corpo tem, sendo o único que temos, será que vamos querer enche-lo com maus alimentos ?

17 – Dê o exemplo. Não passe maus hábitos aos seus filhos – As crianças são como esponjas que absorvem os exemplos e atitudes dos adultos. Aprendem pais por observação do que por palavras. Não espere que o seu filho coma os vegetais enquanto você come batatas fritas, ou diz que o açúcar faz mal, quando ele o vê a comer bolachas ou doces. Se vocês não gosta de alguns alimentos é desnecessários vilificá-los em frente dos seus filhos. Só os vai autorizar a fazerem o mesmo com esses e com outros.

18 – Seja consciente da sua relação com a comida. – Como pais é nossa responsabilidade lidar com o nosso passado e herança em termos de relação com os alimentos. Temos que ser nós a quebrar os eventuais padrões de alimentação errados que possamos ter absorvido dos nossos pais e avós, para que os seus filhos sejam livres nas suas escolhas.

19 – Façam as refeições em conjunto – Vários estudos demonstram que as crianças que comem juntos com os pais e em família tem tendência para comer mais alimentos saudáveis do que as comem sozinhas. Aproveite o tempo da refeição para desligar os telefones e televisões para se conectar com a sua família, sempre que possível, e dar os melhores exemplos. A refeição é um momento social e familiar muito importante em todos os povos e culturas. Nós, os ocidentais, somos os que estamos mais afastados deste conceito.

20 – Como pai e educador informe-se sobre o que são alimentos saudáveis. – Todos os pais são bem intencionados mas às vezes não sabem o que fazer nem por onde começar. Procure educar-se o máximo possível sobre o assunto de alimentação saudável, para si e sua família. Comece por reduzir o açúcar e alimentos processados, enquanto aumenta os legumes e vegetais. Sugiro como ponto de partida o livro “Em defesa da comida” de Michael Pollan e “Alimentação Ideal Para Crianças Inteligentes” de Patrick Holford.

21 – Não se penalize quando as coisas não correrem como espera – Como tudo na vida, a alimentação dos nossos filhos não está, totalmente, nas mãos dos pais. Porque frequentam a escola e têm a possibilidade de partilhar outros alimentos com os colegas; porque os pais estão separados e o outro progenitor não partilha da sua consciência alimentar; porque a informação é difícil de transmitir e instalar com os restantes membros da família. Tente sempre fazer o melhor que pode, com o que tem, e não desanime perante as “adversidades”. Na alimentação, como em tudo o resto, mantenha a sua postura e o resto virá de forma natural.

Para os que acham que as crianças rejeitam mesmos os alimentos (porque é genético) lembrem-se que, existem questões pontuais e que devem ser levadas em consideração, mas tudo é uma questão de hábito. Basta analisar a alimentação de vários povos e culturas para observar como alimentos que para nós seriam impensáveis, são para aquelas crianças “um petisco”, sem adição de sal, açúcares ou outros condimentos.

Lembre-se que nem sempre o caminho mais fácil é o mais correto. Não desista. Ao educar os nossos filhos, um pouco mais de trabalho, de esforço e paciência extra, será sempre compensado.

Miguel Figueiredo
Medicina Integrada Funcional/Coaching Alimentar

Brahmi