Rúben Pacheco Correia tornou-se num nome conhecido do público graças a Cristina Ferreira, contudo, o escritor já tinha um caminho traçado que começou ainda na escola.

O bullying que constantemente sofria na escola, em Rabo de Peixe, Açores, levou-o a refugiar-se na biblioteca, onde acabou por ler todos os livros disponíveis.

Lançou o seu primeiro livro aos 14 anos, embora já o tivesse escrito aos 10. A este mais uns quantos se seguiram.

Foi através da literatura que conheceu nomes como Cavaco Silva e Dom Duarte Pio, com quem ainda hoje mantém uma relação próxima. Também o amor pela gastronomia levou-o até Cristina Ferreira e, desde então, nunca mais se separaram.

Em primeiro lugar a pergunta inevitável: afinal, o que é que aconteceu com a quiche?

[Ri-se antes de começar a responder]. Caiu. Estava a colocar o queijo por cima dela e a forma já estava a ficar quente... deixei cair.

Deve ser daqueles momentos em que só nos apetece esconder, não é?

Já tive momentos igualmente caricatos. Há dois anos, aproximadamente, fui convidado para ir à 'Praça da Alegria', ainda nem estava na televisão, para fazer um bolo de Natal dos Açores. Em direto - embora não tenha aparecido porque não estavam a filmar a cozinha -, quando coloquei o forno a pré-aquecer explodiu. Era só vidros por todo o lado. Já tive aí um ou dois momentos que marcam um bocadinho o meu 'pesadelo na cozinha'.

Apesar destes pequenos percalços, os dias ao lado de Cristina Ferreira têm sido felizes?

Claro que sim. Aliás, só fui para a TVI porque sabia que ia para junto de alguém que me faz muito feliz. Foi a Cristina que apostou inicialmente em mim na SIC e já sabia qual era a sensação de se trabalhar com ela. Não me tem desiludido.

Para mim o que importa não são os contratos, nada disso me interessa, o que interessa é dar-me bem com as pessoas, sentir que há ali uma energia bonita

Até porque em televisão é difícil esconder o que realmente se está a sentir.

Completamente. A minha profissão não é televisão, é uma pequena passagem da minha vida, as pessoas conhecem-me de lá, mas não é a minha vida. Esta passagem para mim só faz sentido porque me traz felicidade e momentos de alegria e de realização pessoal. Um dia que não me sinta bem, saio. Para mim o que importa não são os contratos, nada disso me interessa, o que interessa é dar-me bem com as pessoas, sentir que há ali uma energia bonita. No meio do trabalho a gente diverte-se, ri-se, conta histórias, é fantástico.

Antes da chegada à televisão o Rúben já 'existia' em termos profissionais. O que é que fez?

Tenho 24 anos, publiquei o meu primeiro livro com 14 (já o tinha escrito aos 10), depois publiquei o segundo aos 15, o terceiro aos 16... neste momento tenho cinco obras publicadas e depois mais duas coautorias. Aos 18 anos abri o meu primeiro negócio, um restaurante que ainda está aberto em Rabo de Peixe, nos Açores, tenho estado muito envolvido no negócio da restauração. É um livro que me leva à televisão - 'Comer à Moda dos Açores', fui ao programa falar sobre esse livro em particular e fiquei. Mas havia um percurso que já tinha feito, não caí de paraquedas.

O não viver da televisão dá-me um despreendimento diferente enquanto lá estou, porque como não preciso daquilo, como não vivo daquilo, sou muito mais tranquilo nas minhas abordagens e na forma como eu estou

O não viver da televisão dá-me um despreendimento diferente enquanto lá estou, porque como não preciso daquilo, como não vivo daquilo, sou muito mais tranquilo nas minhas abordagens e na forma como eu estou. Não espero estar na televisão a vida toda, costumo dizer que se hoje saísse para mim já tinha sido uma vitória o que se passou até agora.

Porque é que aceitou entrar na 'caixinha mágica'?

Gosto sobretudo de me sentir desafiado, seja na literatura, nos negócios, agora na televisão, não gosto de monotonia. Tive momentos muito bonitos na SIC, mas a verdade é que já estava a precisar de me sentir desafiado novamente. Por melhor que tenha sido a minha experiência, a verdade é que já estava a ser repetitivo, todas as semanas a mesma coisa.

Se soubessem quanto é que ganho na televisão, acho que até me tentavam ajudar na verdade

Então, ao contrário do que diziam algumas das críticas que lhe foram feitas, não andava 'à procura de um tacho'...

Isso vem das pessoas que não me acompanham ou que não me conhecem. Se soubessem quanto é que ganho na televisão, acho que até me tentavam ajudar na verdade. O que eu ganho é praticamente para a roupa que tenho de usar em televisão, não posso ir sempre com a mesma e tenho de estar sempre a comprar. Portanto, aquilo que ganho ali é praticamente para isso, não para muito mais. Não tenho um contrato como outras pessoas.

Não estou à procura de tacho nenhum. As pessoas é que me têm desafiado, não ando atrás de ninguém. Faço acontecer as coisas na minha vida. Tenho os meus negócios e claro que quero ganhar dinheiro com eles. Não tenho de entregar currículos a ninguém, as coisas têm acontecido naturalmente, acho que para qualquer pessoa com dois dedos de testa as oportunidades quando aparecem são para aceitar.

Eu fui apenas mais uma forma de tentar atingir a Cristina Ferreira. Neste momento há uma campanha contra a Cristina muito grande, uma campanha montada para destruição de imagem e de caráter

Mas estes comentários não têm a ver com o fascínio que a televisão ainda suscita a algumas pessoas?

Sim, mas acho que sobretudo nesta fase que estamos a viver... na opinião pública sou insignificante. Todos estes comentários e circo mediático à volta da minha saída da SIC para TVI existiram não por mim, mas por eu ter ido ter com a Cristina Ferreira.

Se tivesse ido para a RTP1 ou RTP Açores ninguém tinha falado, até tinham congratulado, possivelmente. Eu fui apenas mais uma forma de tentar atingir a Cristina Ferreira. Neste momento há uma campanha contra a Cristina muito grande, uma campanha montada para destruição de imagem e de caráter.

Já venho de um sítio onde falar-se da vida de todos é normal, portanto já ia um pouco treinado neste sentido. As coisas só me afetam se há veracidade

Como é que se protege disso?

Venho de um meio muito pequeno dos Açores, da vila de Rabo de Peixe. Os meios muito pequenos são redes sociais a céu aberto. Já venho de um sítio onde falar-se da vida de todos é normal, portanto já ia um pouco treinado neste sentido. As coisas só me afetam se há veracidade. Lido muito bem com as críticas. Só não lido se essa crítica de certa forma afetar a minha família. As minhas avós têm Facebook, o meu irmão com oito anos já tem Facebook, os meus pais também, e eles é que não lidam muito bem com esses comentários. Isso afeta-os de alguma forma e quando isso acontece também me afeta a mim.

Do lado positivo, como é que a família reagiu à chegada do Rúben à televisão?

Os meus pais já veem as coisas de uma forma muito natural. Acreditam muito em mim, sem eles não seria possível nada daquilo que eu fiz, tenho o apoio incondicional da minha família, é o meu pilar mais importante. Têm imensas expectativas em relação ao filho e tento todos os dias concretizar algumas coisas. Vivem com muita alegria estes momentos e partilham as minhas conquistas como se fossem deles também. Sou muito grato à família que tenho.

Então, gostam de o ver na televisão?

Adoram. A minha avó Lúcia, que é a mãe da minha mãe, repete o mesmo programa durante uma semana todos os dias, põe para trás e para a frente.

Para não sofrer violência física - cheguei muitas vezes a casa com as calças rasgadas - comecei a refugiar-me na biblioteca

Era bom aluno na escola?

Sim, sempre fui um bom aluno, sobretudo aquele que lia muito. Comecei a ler e a escrever porque até ao 9.º ano de escolaridade estudava na escola de Rabo de Peixe. Era uma escola com alguns problemas, sofria imenso de bullying, porque na altura não gostava de brincar à apanhada, etc. Para não sofrer violência física - cheguei muitas vezes a casa com as calças rasgadas - comecei a refugiar-me na biblioteca. Chegou a uma certa altura em que já tinha lido praticamente todos os livros da biblioteca, que também era pequena e foi aí que comecei a criar as minhas próprias histórias.

Aquilo que poderia ser uma adversidade, tornou-se num caminho muito interessante para mim, porque a literatura é que me abriu as portas de tudo aquilo que eu tenho feito. Se me perguntasse se um dia preferia ficar conhecido enquanto apresentador ou empresário eu diria antes escritor.

Não sofri mais do que outros. Não faziam aquilo por maldade, mas porque era o instinto

Se o Rúben hoje pudesse voltar atrás no tempo e deixar uma mensagem ao menino que passava os dias na biblioteca, o que é que lhe diria?

Possivelmente, para fazer tudo igual ao que fez. Foi a melhor coisa que me aconteceu refugiar-me na biblioteca. Não sofri mais do que outros. Não faziam aquilo por maldade, mas porque era o instinto - 'Ou estás comigo ou estás contra mim'. Fez de mim a pessoa que hoje sou. Se voltasse incentivava a ler e a estudar cada vez mais.

E não tem aquele gostinho especial por ter conseguido alcançar o que alcançou do género 'toma lá'?

Não [ri-se, enquanto começa a responder]. Muitos daqueles que me batiam são hoje em dia meus amigos. Que [a minha história] não sirva de repreensão para quem agride, mas de inspiração para quem é agredido. Que não tenham medo e que encontrem o seu caminho como eu encontrei o meu.

Tenho a consciência de que nunca serei um corpo/imagem para vender, mas também sei, e permita-me que não seja arrogante, que não sou um corpo mas sou uma cabeça

Relativamente à imagem, sentiu uma pressão diferente ao entrar no mundo da televisão?

Eu mantive-me a mesma pessoa. Claro que há gente que vive da aparência e muito preocupada com a imagem, acho que é importante porque a televisão também é isso, mas eu tenho as minhas coisas muito bem resolvidas. Tenho a consciência de que nunca serei um corpo/imagem para vender, mas também sei, e permita-me que não seja arrogante, que não sou um corpo mas sou uma cabeça. Sei que aquilo que tenho para oferecer não é a parte estética, mas tenho outras coisas. Quem quer apostar na parte estética, ok, isso são os sonhos de cada um, mas o meu sonho não é ser capa de revista da Men's Health mas sim da Forbes.

Claro que sou muito agredido também: 'gordo, vê lá se perdes uns quilos e tal'. Este ano, depois de receber imensas críticas construtivas neste sentido do género - 'oh gordo, perde peso que isso faz mal à saúde', [pensei que] talvez até faça mal e por isso fui fazer uns exames ao Dr. Almeida Nunes para perceber como é que estava em termos de saúde. Os exames vieram belíssimos, estava tudo incrível, quando acabei a consulta fui comer um cozido à portuguesa.

E quanto ao seu coração, está ocupado?

Neste momento está ocupado. Digo sempre que não, mas neste momento está ocupado nos Açores. Estou muito feliz.

É engraçado que construí uma relação com o Cavaco Silva muito interessante. Fora daquela imagem política que tem, muito dura, conservadora, é uma pessoa amável

Como é que conheceu Dr. Cavaco Silva e o Dom Duarte?

É engraçado que construí uma relação com o Cavaco Silva muito interessante. Fora daquela imagem política que tem, muito dura, conservadora, é uma pessoa amável. Um dia destes ligou-me a dizer: 'Rúben, descobri um queijo da ilha do Pico maravilhoso!' [afirma enquanto imita o antigo Presidente da República]. Um dia destes enviou-me uns biscoitos, é muito simpático. Conheci o Cavaco Silva quando tinha 15 anos e estava a publicar o meu terceiro livro. Fui a Lisboa fazer a apresentação e ele na altura era Presidente da República. Como era o mais jovem escritor português fui desafiado pela Presidência da República a ir ter uma audiência com o Presidente.

O mesmo aconteceu com o Dom Duarte, que também me convidou, assim como o Mário Soares, Passos Coelho, etc. Houve pessoas com quem mantive contacto, outras nem tanto.

O Rúben é a prova vida em como a comida consegue unir as pessoas.

Completamente! Passo o dia a falar de comida. Quando terminamos aqui em casa uma refeição incrível, já estamos a falar do que vamos comer hoje à tarde. Faço viagens à procura de gastronomia, é uma paixão muito grande que tenho. Acredito que a gastronomia é a identidade de um povo.

É fácil ser amigo do Rúben?

Acho que é muito fácil, sobretudo se gostarem de comer e beber. É difícil saírem da mesa do Rúben.

Onde é que se imagina daqui a cinco anos?

O meu sonho é abrir um restaurante açoriano em Lisboa e espero que isso aconteça muito em breve. Terminar o meu curso de Direito e, possivelmente, publicar mais dois ou três livros, pode ser de gastronomia ou não.

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