Não me lembro bem onde é que vi um senhor com um cabelo tão perfeitamente penteado que tive de me perguntar se não seria um capachinho.
- Já reparaste que as coisas demasiado perfeitas soam a falso?- comentei com quem estava comigo.
Pouco vou à horta que o Ricardo plantou cá na Quinta mas, quando o faço, fico encantada com a cor dos tomates, o aroma das meloas e o sabor dos morangos.
- Anda! Quero que proves uma coisa.- disse ele enquanto me fazia segui-lo de um socalco para outro.
- Prova este morango!-
Olhei para o aspeto imperfeito e enfezado do fruto acabado de apanhar, limpei-o com as mãos e comi-o em duas pequenas dentadas.
Depois de alguns segundos a, literalmente, gemer de prazer, agradeci como uma criança: - Foi o melhor morango que comi em toda a minha vida!!
Quando me apercebi do antagonismo destes dois acontecimentos compreendi o valor da sua conjunta mensagem: não é a aparência perfeita que confere o sabor a nada! A perfeição em excesso faz tudo soar a falso. Procuramos rodear-nos de perfeição e beleza. No nosso corpo, nas nossas coisas, nas nossas relações e vivências. E no entanto é tão frequente esquecermos-lhes o sabor...
Não quero um casamento perfeito, quero-o tão saboroso como aquele morango. Não quero filhos perfeitos, quero-os com o seu sabor espontâneo e genuíno. Não preciso de carros topo de gama nem roupas de luxo, quero apenas bens que saibam a fiabilidade e caráter. E quanto à minha própria pessoa, fico feliz por já ter descoberto há muito que embora a perfeição não more aqui, o sabor de ser genuína todos os dias me nutre.
Ana Amorim Dias
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