Em 1923, quando o astrónomo americano Edwin Hubble riscou um N numa das suas chapas fotográficas astronómicas e o substituiu pelas letras “VAR”, revolucionou para sempre a nossa forma de olhar para o Universo: descobriu o segredo da estrela que recebeu o nome de V1 e, com ele, a verdadeira natureza do cosmos. A V1 é a estrela mais importante do Universo, pelo menos quando se trata de entender as verdadeiras dimensões do mesmo.

“Aqui está a carta que destruiu o meu Universo”, afirmou o astrónomo Harlow Shapley quando Hubble lhe relatou a sua descoberta. No início do século XX ainda não sabíamos bem como era o Universo em que vivíamos. Sabia‐se que era grande e que, além do Sol, existiam muitas outras estrelas, muito longínquas. Mas também era possível observar no firmamento estranhas nebulosas, objetos parecidos com nuvens que, sem dúvida, não pareciam estrelas e para os quais não se encontrava nenhuma explicação científica.

Shapley e os seus seguidores opinavam que essas nebulosas não estavam mais longe do que as estrelas e que não passavam de acumulações brumosas de gás que se encontravam entre elas. Que as estrelas que vemos no firmamento eram todas as que existiam e que, mais além, simplesmente não havia nada. O seu colega Heber D. Curtis, pelo contrário, defendia que o Universo estava cheio de universos ilha. As estrelas juntavam‐se formando grandes acumulações, as galáxias, e o nosso Sol, juntamente com cada uma das estrelas que podemos observar no firmamento, era apenas uma delas. Por sua vez, as nebulosas não eram, na verdade, nebulosas, mas sim galáxias muito longínquas que estavam separadas da Via Láctea por imensos espaços vazios.

Esta disputa, chamada o grande debate, manteve a astronomia do início do século XX ocupada e foi Edwin Hubble que lhe pôs um ponto final. Hubble utilizou o grande telescópio Hooker do Observatório Monte Wilson, na Califórnia, e desta forma conseguiu descobrir algumas das estrelas que faziam parte da nebulosa de Andrómeda, embora ainda não se soubesse exatamente a que distância se encontravam. Naquela altura, calcular uma distância exata com a técnica do momento só era possível no caso de estrelas que estavam relativamente perto.

Hubble procurava novas, estrelas que explodiam no fim dos seus dias. Supunha‐se que o faziam sempre da mesma forma e, além disso, a sua luminosidade variava mais ou menos da mesma maneira. Ao comparar a luminosidade observada na nova com a resultante do modelo teórico, foi possível calcular com certa precisão a distância até à nebulosa de Andrómeda: quanto mais fraca é a luz da nova, mais longe se deve encontrar a nebulosa.

Numa chapa fotográfica de 5 de outubro de 1923, Hubble descobriu três estrelas que podiam ser uma nova e assinalou‐as com um N, mas quando comparou a imagem com chapas anteriores concluiu que uma delas se comportava de uma maneira estranha. Umas vezes a sua luz era fraca e outras intensa, algo que uma nova não faz, mas que é típico de uma estrela variável. Assim, Hubble trocou o N pelo VAR e estudou a estrela mais a fundo. Ao fazê‐lo descobriu que se tratava de um tipo muito especial de estrela variável, uma cefeida. Estas estrelas variam a sua luminosidade com uma periodicidade muito concreta, que depende da intensidade da sua luz. Hubble conseguiu medir os períodos com facilidade e, através da luminosidade que calculou a partir deles, foi capaz de determinar o quão brilhante devia ser na verdade a estrela. Depois comparou‐os com a luminosidade apresentada pela estrela no firmamento e dessa forma deduziu a distância à qual se encontrava da Terra.

No decorrer do ano seguinte descobriu mais algumas cefeidas na nebulosa de Andrómeda e todas obtiveram o mesmo resultado: a nebulosa está muito mais longe do tamanho que a Via Láctea pode ter (o valor moderno para a distância situa‐se em 2,4 milhões de anos‐luz; anteriormente o Hubble calculou uma distância um pouco menor). Assim, a nebulosa de Andrómeda não podia ser uma nebulosa: tinha de se tratar de uma acumulação imensa de milhares de milhões de estrelas, que nos parece uma nuvem disforme apenas pela grande distância à qual se encontra. Atualmente sabemos que a nebulosa de Andrómeda é na verdade a galáxia de Andrómeda. E as restantes supostas nebulosas também são galáxias. Com a descoberta de Hubble, de repente a Via Láctea era apenas um sem‐fim de ilhas de estrelas num Universo que passou a ser muitíssimo maior do que imaginávamos.

A estrela V1 de Hubble permitiu‐nos dar uma primeira vista de olhos à vastidão do cosmos, e atualmente continuamos a tentar entender e investigar as fronteiras deste gigantesco Universo.