Decido fazê-lo eu mesma. Espero que toda a gente saia da quinta e dirijo-me ao carro. Procuro a patilha para abrir o capot, no local onde costuma estar sempre. Nada. Tateio melhor. Nada. Enfio lá a cabeça e, ao fim de uns dez segundos naquela posição estranha, encontro a fugidia alavanca.

Tento levantar o capot. Não me obedece. Lembro-me que há outra patilha que o liberta, mas o carro está de tal forma encostado à parede que tenho de me esticar de novo para lograr os meus intentos. Ainda por cima de calças brancas!

Coloco o suporte de segurança no sítio certo e verifico se está firme. Levar com o capot na cabeça deve dar um certo abalo.

E agora? Onde está a bateria? Depois de alguns segundos a olhar, invisto sobre uma tampa de plástico que sai com facilidade. Eureca! Mais uma vitória. Observo atempadamente a magana, tentando perceber como é que a vou fazer sair e fazendo uma lista mental das ferramentas necessárias.

Com passo decidido dirijo-me à casinha das ferramentas. Spray oleante, chave de bocas, alicate, luvas e uma tesoura, porque nunca se sabe...

  Percorro de novo todo o caminho até ao carro, sentindo-me como aquelas mecânicas super sexys dos filmes. Sinto-me confiante.

Tiro os óculos. Ato o cabelo. Calço as luvas. Pelo sim pelo não, tiro a chave da ignição, não me vá atacar algum choque sem haver quem me socorra.

Desenrosco as porcas da barra de proteção. Com todo o cuidado para não caírem para onde eu não as consiga apanhar. Percebo de imediato que, para um bom mecânico, as mãos pequeninas são uma enorme vantagem. As minhas são demasiado grandes e com as luvas, pior!

Continuo a minha odisseia, de rabo espetado e costas arqueadas, como se estivesse num filme mas, no fundo, é só para não sujar as calças.

Chego ao borne positivo. Uma spreizada de óleo, uma puxadela e sai logo. No negativo é que levo mais minutos. Como é que aquela porcaria sai? Ponho óleo. Observo melhor, aquilo tem que ter uma lógica. Mais óleo e lá descubro a porca que tenho que desenroscar para libertar a coisa. Ando outra vez todo o caminho até à casinha das ferramentas em busca de uma chave de bocas mais pequena.

Regresso. Luto com a filha da mãe da porca. O colar atrapalha-me mas não o tiro. Começo a vencer a porca e acabo por tirar a bateria. Sinto-me genial e feliz.  Se não estivesse sozinha roubar-me-iam o prazer desta vitória.

Enfio-me no outro carro e vou comprar uma substituta enquanto penso que, para a montar, é tudo igual mas ao contrário.

Regresso depressa com um entusiasmo incontido. Monto tudo em cinco minutos e dou à chave. Funciona!! Caramba, como me adoro!

Isto aconteceu ontem de manhã. Hoje, ao entrar com os miúdos para o carro que EU ARRANJEI, abro de novo o capot com uma desenvoltura quase profissional e, sob o seu olhar impressionado, coloco a tampa de plástico sobre a bateria. É que me lembrei ontem, já na cama, que me faltou montar essa peça.

Ana Amorim Dias

Biografia